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Edmundo Lima

Falta de isonomia tributária coloca em risco um dos principais setores da economia brasileira

Segmento têxtil brasileiro gera 1,7 milhão de empregos e enfrenta qualquer tipo de concorrência , desde que seja leal

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Edmundo Lima

Diretor-executivo da ABVTEX (Associação Brasileira do Varejo Têxtil).

Quando entramos em uma loja (física ou online) de roupas no Brasil, talvez não imaginemos tudo o que há por trás dela. Com 200 anos de história, o segmento têxtil brasileiro é, incluindo indústria e varejo, o segundo maior empregador do país, gerando 1,7 milhão de empregos, o que o torna responsável por 16% das vagas ocupadas.

Mais: o Brasil é o quarto maior produtor de vestuário e o quinto em têxteis de todo o mundo. Como exportadores, enfrentamos a concorrência internacional e somos referência mundial em beachwear, jeanswear, além de cama, mesa e banho, entre outros segmentos.

Um trabalho feito por mais de 200 mil empresas, 97% delas micro, pequenas e médias. Pois bem, uma cadeia produtiva com todo este alcance está agora com sua sobrevivência ameaçada por uma medida governamental que beneficia a indústria asiática.

Pacotes da Shein, ecommerce que aderiu ao Remessa Conforme do governo federal
Pacotes da Shein, ecommerce que aderiu ao Remessa Conforme do governo federal - Jade Gao - 18.jul.2022/AFP

No primeiro semestre, o governo federal concebeu um programa muito positivo, o Remessa Conforme. Trata-se de medida essencial, destinada a: promover a modernização da fiscalização, implantar o compliance nas operações das plataformas internacionais, prover dados indispensáveis para controle do fisco e estabelecer a justiça tributária no despacho internacional de mercadorias para o Brasil.

O programa mira em uma prática intensificada durante a pandemia: sites de ecommerce internacionais passaram a enviar milhões de produtos para o Brasil sem pagar impostos, se aproveitando de uma exceção na legislação.

A manobra era feita para fugir da alíquota então vigente de imposto de importação, de 60%. Concebida para favorecer o envio de entregas de uma pessoa que mora no exterior para outra que mora no Brasil (muitas vezes, parentes), na prática esta exceção na lei se transformou em uma ação generalizada de fraude.

"Nós temos um cidadão que já remeteu mais de 16 milhões de remessas para o Brasil, deve ter bastante parente por aqui", ironizou recentemente o secretário da Receita Federal.

Assim, pelo Remessa Conforme, essas empresas internacionais de exportação devem adaptar suas plataformas para que o pagamento dos impostos devidos seja inserido e informado ao consumidor no ato da compra por residentes no Brasil, com as informações sendo compartilhadas com a Receita Federal.

No entanto, uma alteração à concepção inicial do Remessa Conforme acabou por desvirtuá-lo completamente. Em junho, o governo federal editou a Portaria MF 612/2023, pela qual simplesmente se concedeu isenção de imposto de importação (não mais apenas às encomendas entre pessoas físicas, mas também entre empresas internacionais e o consumidor brasileiro) para produtos estrangeiros com valor de até US$ 50.

A medida legalizou o que antes se consumava pela fraude: a falta de isonomia tributária em relação às empresas do setor têxtil que fabricam, distribuem e vendem por aqui. Torna-se, assim, perene esta injustiça --ainda que com uma insuficiente e ainda não implantada "compensação": a do pagamento de uma alíquota de 17% de ICMS. Para se ter uma ideia, o setor têxtil suporta uma carga tributária que é mais do que o dobro desta alíquota. E, se optar por importar produtos, o varejo têxtil brasileiro paga 109% de impostos sobre o custo da mercadoria.

Do lado dos cofres públicos e da sociedade brasileira como um todo, este benefício fiscal a produtos importados deve gerar uma perda de receita federal estimada em ao menos de R$ 30 bilhões em 2023, segundo estudo do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV). Valor que representa quase metade do orçamento anual do programa Bolsa Família.

Finalmente, o consumidor brasileiro que se beneficia de preços baixos dos importados fabricados a partir de uma dupla isenção tributária —nos países de origem destes sites de ecommerce, somado agora ao subsídio brasileiro— pode pensar que o setor têxtil nacional teme a concorrência estrangeira. Nada mais distante da verdade.

O setor têxtil brasileiro está preparado e já enfrenta qualquer tipo de concorrência --desde que seja leal. Se o objetivo é baratear o preço de mercadorias, que se cobre menos impostos, mas que eles sejam os mesmos, para todos, sejam sites estrangeiros, sejam indústria e varejo brasileiros! Vamos a este debate!

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