Descrição de chapéu Folhainvest

Bolsa cai, dólar sobe e juros disparam após Lula dizer que meta fiscal não precisa ser zero

Presidente afirmou que governo 'dificilmente' cumprirá objetivo

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São Paulo

A Bolsa brasileira despencou e o dólar subiu nesta sexta-feira (27) após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmar a jornalistas que a meta fiscal de 2024 não precisa ser zero e que "dificilmente" o governo alcançará esse objetivo.

Após a divulgação dos comentários do presidente, as taxas de contratos de juros futuros aceleraram os ganhos, e o Ibovespa firmou queda e renovou as mínimas da sessão.

"Deixa eu dizer para vocês uma coisa. Tudo o que a gente puder fazer para cumprir a meta fiscal, a gente vai cumprir. O que eu posso dizer é que ela não precisa ser zero. A gente não precisa disso. Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo corte de bilhões nas obras que são prioritárias nesse país", disse o presidente.

Com isso, o Ibovespa terminou o dia em queda de 1,28%, aos 113.301 pontos, enquanto o dólar subiu 0,43%, fechando a sessão cotado a R$ 5,012.

Às 13h50, pouco antes da divulgação da fala do presidente, o índice operava em torno dos 114.400 pontos.

Nos mercados de juros futuros, os contratos com vencimento em janeiro de 2026 subiram de 10,57% para 10,81%, enquanto os para 2028 foram de 10,98% para 11,21%.

Para Alexsandro Nishimura, economista e sócio da Nomos, o presidente Lula colocou uma "pá de cal" sobre a meta de déficit zero em 2024.

"Não que o mercado acreditasse no cumprimento fiel dessa promessa, mas o presidente acabou com qualquer esperança de compromisso com o ajuste fiscal. Maior incerteza gera aversão ao risco, que leva à disparada dos juros futuros e pressiona os ativos de renda variável e alta do dólar", afirma o economista.

Apesar do ceticismo do mercado sobre o cumprimento da meta, o discurso do Ministério da Fazenda de perseguição do objetivo e suas medidas para aumentar a arrecadação vinham sendo vistos com bons olhos por analistas. Com a fala desta sexta, a avaliação é que o presidente piora o cenário fiscal do país.

"A fala do presidente foi desastrosa. O mercado já sabia que a meta não ia ser cumprida, mas essa reação vocal é despropositada, num momento em que o próprio Ministério da Fazenda trabalha dia e noite para reduzir o máximo possível esse déficit, ainda mais depois de aprovações importantes da agenda econômica nesta semana. Foi uma fala ruim num momento péssimo", afirma Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.

Painel eletrônico na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo - Nelson Almeida - 17.jun.2022/AFP

Spiess lembra, ainda, que a declaração ocorre a pouco dias da próxima reunião de política monetária do Banco Central, marcada para a próxima quarta (1°). A melhora do quadro fiscal brasileiro já foi citada pela autoridade monetária como uma das condições para o início do ciclo de cortes na Selic (taxa básica de juros do Brasil).

"O BC, que provavelmente já teria que emitir um comunicado mais duro por causa do ambiente internacional, vai ter que dar um tom ainda mais conservador por causa dessa fala", completa o analista.

Já Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena, afirma que a fala de Lula não altera o cenário projetado pela casa, apesar das turbulências causadas no mercado.

"A fala de hoje não é novidade para ninguém. Apenas reforça o discurso de preservação de investimentos públicos, em linha com as diretrizes do atual governo", diz Salto.

A Warren Rena já projetava que a meta fiscal não seria cumprida em 2024, mas lembra que o próprio arcabouço prevê gatilhos de contenção de gastos que podem ser acionados caso o objetivo não seja atingido.

O economista Felipe Salles, chefe do C6 Bank, também cita os gatilhos de contenção como mecanismos para atenuar uma possível falha na tentativa de zerar o déficit primário em 2024.

"O ideal é que a meta proposta seja perseguida, com aumento da arrecadação ou corte de gastos. Caso ela não seja cumprida, não haverá problemas se o valor do déficit for pequeno, pois o próprio arcabouço fiscal prevê ajustes para os anos subsequentes em caso de descumprimento", diz Salles.

Nesse cenário, a Bolsa brasileira sofreu pressão principalmente das "small caps", empresas menores e mais ligadas à economia doméstica e ao movimento dos juros futuros. O índice que reúne essas companhias recuou 2,34%, e as maiores quedas foram de Hypera (8,25%), Grupo Soma (6,89%) e Gol (5,59%).

Além dos temores sobre o cenário fiscal do país, o clima internacional também não ajudou, como aponta Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos.

"Os investidores buscaram proteção para o fim de semana, em meio a notícias de que Israel deve iniciar as operações terrestres na faixa de Gaza. O mercado local, porém, performou pior que os pares após as falas de Lula, que levaram à disparada nas taxas de juros locais, com os investidores projetando riscos de maiores déficits nos próximos anos", afirma o economista.

Nas poucas altas do dia, a Vale subiu 3,35% e foi o papel mais negociado da sessão após divulgar seu balanço corporativo do terceiro trimestre.

Dados de inflação dos EUA seguram dólar

No câmbio, o dólar registrou forte queda no início da sessão e chegou a ser negociado a R$ 4,93 na mínima do dia após a divulgação de novos dados sobre a inflação americana.

O índice PCE, acompanhado de perto pelo Fed (Federal Reserve, o banco central americano), permaneceu em 3,4% em setembro, em linha com o esperado pelo mercado. Além disso, o núcleo do índice de gastos de consumidores, que exclui itens mais voláteis, caiu para 3,7%, ante 3,8% no mês anterior, atingindo seu nível mais baixo em dois anos.

Os novos dados aliviaram temores sobre um novo aumento de juros na próxima reunião da autoridade monetária do país, pesando contra a moeda americana.

Com a fala de Lula, a divisa virou e terminou o dia em alta. Na semana, porém, o dólar acumula desvalorização de 0,37% ante o real.

No exterior, o dólar permaneceu estável ante outras moedas fortes.

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