Confira o que acontece agora com a revisão do FGTS no Supremo

Ministro Cristiano Zanin pediu vista e o julgamento foi paralisado; entenda quando caso poderá voltar ao debate

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São Paulo

O ministro Cristiano Zanin, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista e interrompeu o julgamento da revisão do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) nesta quinta-feira (9). Com isso, o processo levará ainda mais tempo para chegar a uma decisão final.

O pedido de vista é uma solicitação que pode ser feita por qualquer ministro da Suprema Corte para analisar melhor um processo e, futuramente, dar seu voto e sua opinião sobre o tema.

Com pedido de vista, revisão do FGTS fica parada no Supremo, esperando devolução do processo - Gabriel Cabral/Folhapress

A devolução, que antes poderia levar o tempo que fosse necessário, agora tem prazo. A alteração foi feita no ano passado, mas passou a valer apenas em fevereiro de 2023, após o recesso Judiciário de janeiro.

Pelas regras atuais, aprovadas durante a gestão de Alexandre de Moraes, toda vez que há um pedido de vista em relação a algum processo, o ministro deverá devolver a ação em até 90 dias para que um novo julgamento seja marcado.

Caso não devolva no prazo, o presidente da corte —hoje Luís Roberto Barroso— pode colocar o tema na pauta. O prazo de devolução, no entanto, pode ser maior e chegar a 120 dias, pois é interrompido com o recesso do Judiciário. Entre dezembro e janeiro, as atividades na corte serão interrompidas.

O posicionamento de Zanin era esperado por quem acompanha a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5.090, que discute a rentabilidade do dinheiro no Fundo de Garantia. O fundo rende hoje 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial).

A ação, levada em 2014 ao Supremo pelo partido Solidariedade, pede que a TR seja declarada inconstitucional e, em seu lugar, definido um índice de inflação para repor as perdas dos trabalhadores, que chegam a 90% entre 1999 —quando houve alteração no FGTS— e 2013, data de um estudo encomendado pela Força Sindical.

O ministro Barroso havia proposto em abril, no início do julgamento, que as contas fossem remuneradas ao menos com o índice da caderneta de poupança, hoje em 6,17% ao ano mais TR, mas, nesta quinta, mudou seu voto. Ele não declarou a inconstitucionalidade da TR e barrou a correção das verbas passadas.

Agora, Barroso determina que a correção do FGTS seja feita pela poupança, mas somente a partir de 2025, e que, em 2024, seja distribuído 100% do lucro do fundo aos trabalhadores. A distribuição dos lucros deverá se manter assim.

Os resultados do fundo têm sido distribuídos pela Caixa Econômica Federal desde 2017. Neste ano, 217 milhões de contas receberam quase R$ 13 bilhões, aumentando a rentabilidade do dinheiro. A lei, no entanto, garante apenas a divisão de metade do lucro.

Gostamos de evitar o horror econômico sem produzir o horror jurídico

Luís Roberto Barroso

presidente do STF

O voto de Barroso foi acompanhado pelo ministro André Mendonça e por Kassio Nunes Marques, que já havia pedido vista da ação, e leu seu voto nesta quinta.

Em sua justificativa para mudar o posicionamento, o presidente do STF afirmou que há um milhão de processos na Justiça esperando a decisão do Supremo e que 367 mil novas ações foram propostas neste ano.

Ele ponderou sobre a importância do caso e a espera dos trabalhadores, que é de quase dez anos, mas também disse ter levado em conta os impactos aos cofres públicos com a mudança no indicador.

Cálculos da AGU (Advocacia-Geral da União) são de que, se a revisão for concedida da forma como foi solicitada, o impacto nas contas da União é de R$ 660 bilhões. Além disso, por ano, o Ministério da Fazenda calcula desembolsar R$ 8,6 bilhões a mais com o FGTS.

"Gostamos de evitar o horror econômico sem produzir o horror jurídico", disse Barroso.

O QUE PODE ACONTECER NA REVISÃO DO FGTS?

Depois que o processo for devolvido por Zanin, em fevereiro de 2024, novo julgamento deverá ser marcado. No entanto, não há prazo para Barroso colocá-lo na pauta de novo.

O caso poderá ser julgado e chegar ao final, com vitória ou derrota para os trabalhadores. Até agora, há três votos pela mudança na correção, de Barroso, do ministro André Mendonça e de Kassio Nunes Marques, mas não houve declaração de que a TR é inconstitucional.

O julgamento começou em abril e havia parado após pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques, que devolveu o processo há cerca de dois meses. A decisão foi adiada em outubro e voltou à pauta nesta quinta.

Outros ministros ainda podem pedir vista, caso queiram.

Mario Avelino, presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador, não se surpreendeu com o pedido de vista de Zanin e viu na alteração do voto de Barroso uma vitória, já que houve a determinação de distribuir 100% dos lucros do FGTS aos trabalhadores. "Há uma melhoria do fundo, não há dúvida", diz ele.

Para Avelino, no entanto, a melhor solução para os trabalhadores seria a TR ser considerada inconstitucional. "Reafirmo que a melhor solução seria a TR ser inconstitucional e haver um índice que reponha a inflação como forma de atualização monetária. Agora, vamos aguardar."

O advogado Eduardo Pragmácio Filho, doutor em direito do trabalho, do escritório Furtado Pragmácio Advogados, defende uma solução intermediária para que não se cometa erros, fazendo com que algum setor da sociedade pague a conta final.

"Esse é um filme que, em alguma medida, já foi visto há umas duas décadas, quando o STF julgou a correção dos expurgos inflacionários, e acabou que o empresariado pagou a conta, quando foi criada a contribuição social a que se referia a lei complementar 110/2000", diz.

"Agora, de forma parecida, o que está em jogo é, por um lado, fazer a reposição mais justa da correção do fundo para o trabalhador, que acaba perdendo dinheiro para a inflação, e, por outro, tornar o fundo menos solidário e menos competitivo para emprestar dinheiro para políticas públicas relevantes, como é o caso de saneamento e casa própria."

O QUE É A REVISÃO DO FGTS?

É uma ação judicial na qual se questiona a constitucionalidade da correção do dinheiro depositado no Fundo de Garantia chegou ao Supremo em 2014, levada pelo partido Solidariedade e pela Força Sindical. Hoje, o retorno do FGTS é de 3% ao ano mais a TR (Taxa Referencial), que rende próxima de zero.

Com isso, a atualização do dinheiro fica abaixo da inflação, deixando de repor as perdas do trabalhador. O pedido é para que a TR seja considerada inconstitucional e um índice de inflação passe a ser utilizado no FGTS.

Desde 1999, quando houve modificação no cálculo da TR, os trabalhadores acumulam perdas. A revisão corrigiria essas perdas, que chegaram a 88,3% até 2013, segundo estudo encomendado pelo Força Sindical e pelo Solidariedade.

QUEM TEM DIREITO?

Todos os trabalhadores com dinheiro no fundo a partir de 1999 podem ter direito à correção se o Supremo entender que o índice utilizado estava errado e trouxe perdas. Segundo a Caixa, há 217 milhões de contas do Fundo de Garantia entre ativas e inativas.

Especialistas calculam que ao menos 70 milhões de trabalhadores podem ser beneficiados. É possível que um trabalhador tenha mais de uma conta, aberta a cada novo emprego com carteira assinada.

Se houver inconstitucionalidade e o índice de correção for alterado, a expectativa é que todos tenham seus depósitos corrigidos pela nova regra a partir de então. Para definir questões como o pagamento de valores de anos anteriores, por exemplo, o STF terá de modular o tema.

Entenda o Fundo de Garantia

O FGTS funciona como uma poupança para o trabalhador. O fundo foi criado em 1966, com o fim da estabilidade no emprego, e passou a valer a partir de 1967. Todo mês o empregador deposita 8% sobre o salário do funcionário em uma conta aberta para aquele emprego.

Há ainda a multa de 40% sobre o FGTS caso o trabalhador seja demitido sem justa causa. Desde a reforma trabalhista de 2017, há também a possibilidade de sacar 20% da multa após acordo com o empregador na demissão.

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