Revisão de SP sobre locações estilo Airbnb terá pouco efeito e perde oportunidade, dizem especialistas

Atividade tem crescido a taxas de dois dígitos na capital, segundo dados do setor

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Patrícia Vilas Boas
Reuters

A proposta de revisão da Lei de Zoneamento urbano pela prefeitura de São Paulo desincentiva investimentos em aluguéis de curta temporada na maior cidade da América Latina, mas deve produzir pouco impacto sobre empresas que faturam com a modalidade, como Airbnb e Booking, afirmam especialistas.

Além disso, a proposta perde oportunidade de impor uma regulação mais efetiva sobre a atividade que na capital paulista tem crescido a taxas de dois dígitos, segundo dados do setor.

O Projeto de Lei 586/2023, que inclui outras propostas de revisão na Lei de Zoneamento, tramita na Câmara Municipal desde o início de outubro, com audiências públicas marcadas para até 6 de dezembro. A matéria está prevista para ser votada primeiro em 30 de novembro e, posteriormente, em 7 de dezembro.

Condomínio na Vila Madalena construído com a promessa de que seria de interesse social tem estúdios de 30 m² alugados por mais de R$ 800 a diária - Zanone Fraissat -29.ago.22/Folhapress

O texto propõe que empreendimentos da categoria "serviços de hospedagem ou moradia" deixem de serem considerados como "uso misto", segmento que recebe incentivos para sua construção e une habitações residenciais e não residenciais, como imóveis para aluguel de curta temporada.

Os incentivos atuais para os imóveis de uso misto incluem descontos na outorga onerosa, tipo de taxa que o proprietário paga à prefeitura para construir além do habitualmente permitido, além do aumento de 20% no potencial construtivo do empreendimento.

Com a proposta de revisão, serviços de hospedagem nesses imóveis mistos deixariam de receber esses incentivos.

"Ao tirar esse desconto, não quer dizer necessariamente que as empresas, as incorporadoras, junto com as plataformas [como Airbnb], vão deixar de operar em São Paulo", disse Marcelo Ignatios, especialista em desenvolvimento imobiliário e responsável pelos estudos econômicos da Lei de Zoneamento em vigor em São Paulo.

"Muito difícil. Simplesmente vai ficar menos incentivado. Não é algo proibitivo."

Segundo ele, porém, para incorporadores a regra atual faz muita diferença, porque pode permitir descontos da ordem de 50% na outorga onerosa, que por sua vez equivale a cerca de 5% do valor de um apartamento.

A receita anual média estimada com aluguéis de curta temporada em São Paulo é de R$ 56 mil por apartamento, segundo dados da plataforma AirDNA, que verifica as possibilidades de rendimentos de um imóvel alugado via plataformas digitais.

Em novembro, o número de anúncios de hospedagem ativos na cidade ultrapassava os 20 mil, crescimento anual de 26%, de acordo com o AirDNA.

Dada a importância do assunto, a coordenadora do LabCidade, laboratório da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Isadora Guerreiro, afirmou que a revisão está "perdendo a oportunidade de legislar" sobre questões atuais relacionadas ao chamado aluguel flexível.

"Por exemplo, esses prédios inteiros de unidade para aluguel, eles deveriam ser considerados hotelaria, mas não estão sendo... Não tem nenhuma lei que regule qualquer plataforma de aluguel no Brasil... Nem trabalhista, nem urbanística, nem fiscal", disse ela.

O relator do projeto de revisão da Lei de Zoneamento em São Paulo, vereador Rodrigo Goulart (PSD), não descartou uma futura legislação para a atividade, mas ressaltou que a atual proposta visa corrigir o "desvirtuamento" do incentivo.

"O que está sendo feito agora é o que cabe na lei de parcelamento, [uso] e ocupação do solo", disse. "A gente vai ver o reflexo disso... Se for necessário, após essa atualização da lei de uso e ocupação, nós faremos também uma legislação específica para essa atividade econômica."

VISÃO DO SETOR

Para Claudio Bernardes, vice-presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda e Administração de Imóveis de São Paulo (Secovi-SP), os serviços de hospedagem são importantes economicamente para a cidade e o incentivo aos imóveis flexíveis deveria ser mantido.

"[O serviço] atende uma demanda por hospedagem na cidade que os hotéis não conseguem cumprir adequadamente, como em outras cidades, do ponto de vista até de preço", disse Bernardes.

"Eu concordo com essa colocação da prefeitura, que, primariamente, esse incentivo era para tornar uma aproximação do emprego com o trabalho, agora, não dá para também desconhecer que essa é uma atividade importante que merece um incentivo."

Procurado, o Airbnb disse não divulgar seu número de reservas em destinos específicos, mas acrescentou que "a atividade exercida por meio da plataforma beneficia amplamente a capital paulista".

Um relatório da Oxford Economics, realizado a pedido do Airbnb, mostrou que o impacto direto de gastos de hóspedes que fizeram reservas por meio do Airbnb em São Paulo foi de US$ 662,3 milhões (excluindo gastos com acomodação) em 2022.

Sobre a legislação, a plataforma disse acreditar que "boas políticas devem criar oportunidades tanto para proprietários de imóveis obterem renda extra como para as comunidades locais que se beneficiam do impacto positivo que o fluxo de hóspedes gera na economia local".

À Reuters, a Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) disse que está fazendo a análise técnica da minuta do Projeto de Lei encaminhada à Câmara e poderá se manifestar na consulta pública.

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