Temos os votos para aprovar a Reforma Tributária, afirma relator Eduardo Braga

Senador diz que exceções foram necessárias para ampliar apoio ao texto, mas também houve 'contenção de danos'

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Brasília

A Reforma Tributária já tem os votos necessários para ser aprovada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e no plenário do Senado, afirma o relator da proposta na Casa, Eduardo Braga (MDB-AM).

O senador, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), avaliaram juntos esse cenário relatado por ele em entrevista à Folha.

"Nós acreditamos que temos votos para aprovar, tanto na comissão quanto no plenário", diz Braga, sem revelar a contabilidade dos votos. Uma PEC (proposta de emenda à Constituição) requer maioria simples na CCJ e o apoio de ao menos 49 dos 81 senadores para ser aprovada no plenário da Casa, onde passa por dois turnos de votação.

Eduardo Braga em seu gabinete no Senado durante entrevista à Folha sobre a Reforma Tributária - Pedro Ladeira/Folhapress

Segundo ele, seu parecer contemplando parte das demandas de senadores contribuiu para criar um clima favorável à reforma, que está empacada no Legislativo há cerca de 40 anos. O trabalho, porém, também teve um caráter de "contenção de danos" para evitar que demasiadas exceções acabassem desfigurando a proposta por completo.

O senador ainda defende a trava para o aumento da carga tributária como proporção do PIB (Produto Interno Bruto), uma das inovações incorporadas em seu relatório. "Se o [crescimento do] PIB for zero, amigo, vai ter que cortar gasto, porque não vai poder esticar a corda em cima do contribuinte."

Qual foi o retorno dos senadores sobre o parecer? Ainda há espaço ou demandas por novas flexibilizações?
O feedback é positivo, e a gente avalia isso pelo número de emendas complementares ao relatório, bem menor do que as apresentadas na fase inicial. Isso demonstra o grau de acolhimento do relatório.

Vamos trabalhar muito ainda até a reunião da CCJ, na terça-feira (7). A expectativa é de termos uma aprovação expressiva na CCJ. E a ideia é, no dia 8, deliberar no plenário em primeiro turno. No dia 9, em segundo turno.

Ainda há pressão grande de certos grupos?
A gente vai sentir isso pelo número de destaques [pedidos de votação em separado de mudanças ou emendas] apresentados na CCJ. Até lá é articulação.

Alguns especialistas perceberam o Senado mais sensível a lobbies setoriais. O sr. ficou incomodado com essas pressões?
É uma Reforma Tributária que estava represada por quatro décadas e que altera profundamente o sistema. É natural que haja, portanto, essa acomodação do sistema produtivo. Agora, nós procuramos ser bastante criteriosos e métricos nessa questão.

Vou dar um exemplo: saneamento. O texto, como veio da Câmara, podia causar um grande contencioso jurídico e, ao mesmo tempo, praticamente inviabilizar o Marco do Saneamento. Não nivelamos o saneamento ao conceito que muitos queriam, de saúde pública. Não demos os 60% de redução [da alíquota] porque, com o volume de créditos, eles poderiam ter carga tributária negativa. Nós equilibramos: desoneramos bens de capital e, ao mesmo tempo, colocamos o saneamento no regime diferenciado.

Outro exemplo foi no transporte. Mantivemos a alíquota diferenciada e a opção até de alíquota zero para o sistema de transporte coletivo urbano, semiurbano e metropolitano e levamos para o regime diferenciado todos os outros modais. Economizamos dinheiro. E, ao colocar o regime diferenciado no transporte aéreo, que não estava contemplado, nós não demos o exagero [da alíquota reduzida], que poderia dar um crédito excessivo às companhias aéreas, mas demos o equilíbrio econômico-financeiro para o setor.

Uma espécie de contenção de danos.
Contenção de danos. Nós fomos fazendo essa métrica. Terceiro exemplo. Mantivemos a alíquota zero na cesta básica do enfrentamento da fome e criamos uma cesta estendida com alíquota diferenciada [reduzida] e cashback.

A questão do setor elétrico. Ao invés de estabelecer uma alíquota diferenciada ou um regime diferenciado, beneficiamos diretamente o consumidor pessoa física [com cashback obrigatório]. A pessoa jurídica vai se creditar [do imposto pago], então não precisa de benefício.

Por que o sr. optou pela alíquota diferenciada para profissionais liberais? O fato de o presidente do Senado ter se envolvido e recebido a OAB influenciou?
Porque eu sou engenheiro, eu beneficiei os engenheiros? Não.

Quem fatura abaixo do teto do Simples Nacional [R$ 4,8 milhões ao ano] está protegido. Uma grande empresa de arquitetura, se fatura, sei lá, dezenas de milhões de reais por ano e tem 50 arquitetos, ela pagava, em ISS, 5%. Agora, nós queremos cobrar 25% [com os novos tributos]. Sabe o que vai acontecer? Ela vai fazer planejamento fiscal. Vai ter um monte de empresa individual embaixo, tudo dentro do Simples, e uma holding em cima. E [o governo] vai arrecadar menos imposto.

Ao fazer uma alíquota de 70% do IVA padrão [para profissionais liberais], todos vão pagar mais imposto. E nós não atendemos ao pleito da OAB, que era ter 45% de redução. É a história do nem tanto, nem tão pouco.

O sr. está convencido da necessidade dessas exceções para obter apoio político?
O texto da Câmara já veio com uma série de exceções. Nós só tomamos conhecimento da alíquota projetada porque eu tomei a iniciativa de ir ao Ministério da Fazenda e dizer: ou vocês apresentam um estudo, ou nós não começamos o trabalho no Senado. Foi aí que apareceu a alíquota de 27%, porque até então era um tiro no escuro.

As mudanças são suficientes para aprovar no Senado e depois na Câmara?
Eu conversei com o Aguinaldo [Ribeiro, relator na Câmara] e tenho conversado com líderes no Senado. Estou convencido de que, se não é esse o texto, é muito próximo disso. Não sou dono da verdade e não posso assegurar que o texto está pronto e acabado porque não é assim que funciona a democracia.

O sr. falou em votação expressiva na CCJ.
Estou otimista. Eu almocei com Rodrigo Pacheco e Davi Alcolumbre [presidente da CCJ], fizemos uma avaliação. E todos os três estamos otimistas.

Qual o placar?
Nós temos um número nosso, mas a gente vai trabalhar até segunda-feira (6) à noite. Nós acreditamos que temos votos para aprovar, tanto na comissão quanto no plenário. Estamos otimistas.

Houve alguma atualização da alíquota estimada pelo Ministério da Fazenda?
Não. Essa atualização só pode ser feita quando o texto for aprovado no Senado. Qualquer avaliação agora é prematura.

Agora, o Senado introduziu algo importantíssimo, que foi a trava da carga tributária [como proporção do PIB]. O que está no texto? De 2012 a 2021 vai ter um valor referência. Nos primeiros anos da implementação do CBS e do IBS, vai ser feita uma média. Se for maior do que o valor referência, a alíquota vai ter que ser reduzida. Se a média for menor, aí é uma decisão política.

Isso significa dizer que, se o modelo é o que estão dizendo, vai aumentar a base, vai ter crescimento econômico, então vai ter um PIB maior, um divisor menor. Portanto, vai abrir espaço. Pode ser investimento, pode ser gasto público, pode ser o que for. Agora, se o [crescimento do] PIB for zero, amigo, vai ter que cortar gasto, porque não vai poder esticar a corda em cima do contribuinte.

Outra inovação foi a avaliação quinquenal dos regimes diferenciados. Como isso vai funcionar, dado que, na história do Brasil, uma vez concedido o subsídio, é muito difícil tirar?
Isso não é a história do Brasil, é a história do mundo. É sempre mais fácil conceder do que retirar.

Nós estamos estabelecendo esse período porque a cada cinco anos você reformula a Câmara e muda um terço ou dois terços do Senado no voto direto, que representa a opinião da sociedade brasileira. Esse é um amadurecimento democrático do país.

O critério de divisão do Fundo de Desenvolvimento Regional tem sido alvo de reclamações e críticas. Estados do Centro-Oeste se sentiram desprestigiados, e especialistas veem distorções no valor per capita.
Nós conseguimos, se não resolver, um apoio majoritário à questão do FDR. Não só porque conseguimos um valor mais robusto, [mas também] criamos um critério que é constitucional e muito equilibrado entre todas as regiões do país. Claro que pode haver uma reivindicação isolada aqui ou acolá, mas são critérios constitucionais bastante sólidos: o Fundo de Participação dos Estados e a população.

Eu falei isso o tempo todo: eu só não posso fabricar critério. Nós analisamos o critério inversamente proporcional ao PIB, inversamente proporcional à renda per capita familiar, inversamente proporcional à população pela raiz quadrada da renda familiar, pela razão direta da proporção da Bolsa Família versus o número de famílias de cada estado... Esse 70% [pelo FPE] a 30% [pela população] foi o ponto de equilíbrio.

O sr. ainda pretende subir o valor dos atuais R$ 60 bilhões?
Acho que o meu dever eu fiz. Não cabe a mim ir além do que eu pude fazer. Não sei o conjunto de senadores, mas depois que eu apresentei o relatório, a discussão sobre o tamanho do fundo fez assim [faz um movimento de baixa com as mãos]. De 2044 a 2048, vamos aumentar mais R$ 2 bilhões por ano para chegar em R$ 70 bilhões? [Até lá] Eu já virei pó…


RAIO-X

Eduardo Braga, 63

Engenheiro, é senador pelo estado do Amazonas e líder de seu partido, o MDB, no Senado. Em 2023, foi designado relator da Reforma Tributária na Casa. Foi prefeito de Manaus, governador do Amazonas entre 2003 e 2010 e ministro de Minas e Energia no segundo mandato de Dilma Rousseff (PT).

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