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Nos EUA, controle de exportação de chips tem reveses em série

Secretária de Comércio ameaça empresas, inclusive Nvidia, enquanto Câmara cobra falhas na aplicação de restrições

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Taipé

Embora esteja tomando mercado do iPhone na China, o novo smartphone da Huawei, Mate 60 Pro, segue atrás em design e qualidade. É o que avalia um executivo chinês, de Xangai, que usa os dois, em parte por viajar constantemente ao exterior.

"Na China, para trabalho, Huawei é mais conveniente", diz ele, citando a câmera e a potência do sinal como vantagens. No resto, "o iPhone se destaca em todos os aspectos".

Ou seja, o que surpreende desde seu lançamento, mais do que o celular, é o que ele trouxe embutido: o chip de 7nm fabricado pela SMIC e projetado pela Huawei, que conseguiu assim voltar ao mercado de 5G.

A secretária de Comércio dos EUA, Gina Raimondo, na sessão de abertura da cúpula da Apec (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico), em San Francisco, nos EUA, em 15 de novembro de 2023 - AFP

Ninguém foi mais surpreendido do que a secretária de Comércio dos EUA, Gina Raimondo, que estava num trem-bala de Pequim para Xangai quando o aparelho apareceu online, no final de agosto.

Ela não esconde o rancor. No fim de semana passada, falando na Fundação Reagan, nos EUA, ao ouvir uma pergunta sobre o lançamento do Mate 60 Pro, foi irônica: "Eu estava lá. Muito obrigado".

Na época, ela virou meme nas redes chinesas, com suposto endosso publicitário ao celular. Nos meses seguintes, por mais que o departamento buscasse caminhos para ampliar as sanções às duas empresas, nada aconteceu.

Raimondo se voltou para outra frente contra a China, ampliando a barreira para a venda dos chips para inteligência artificial da Nvidia.

Como já havia feito antes, a empresa anunciou que produziria um chip no limite da barreira, para o mercado chinês. Mas na semana passada, sob pressão de Raimondo, adiou —e as big techs chinesas voltadas para IA, como Baidu, agora compram os chips da categoria, projetados pela Huawei.

Talvez pela sequência de reveses, o desabafo de Raimondo na Fundação Reagan acabou tendo por alvo a própria Nvidia, uma empresa americana que vem de saltar do quarto para o primeiro lugar entre as gigantes de chips no mundo, em receita do trimestre mais recente, deixando para trás TSMC e Samsung.

"Tem CEO que ficou irritado comigo, porque está perdendo receita", falou ela, aconselhando parar de reclamar porque "assim é a vida". Questionou a Nvidia por produzir "todos os seus chips em Taiwan e não em nossas fronteiras". Descreveu os esforços para criar chips no limite dos controles de exportação como jogo de "Whack-A-Mole", porque "eles estão no negócio de ganhar dinheiro e, toda vez que faço algo, tiro receita deles".

Para evitar esse jogo, diz estar implementando uma nova forma de "dialogar com a indústria, em que nossos engenheiros possam estar passo a passo com os engenheiros deles".

Em suma, "dizemos a eles, 'nossa intenção é negar para a China tecnologia que faça X, Y ou Z', quase como o objetivo do comandante", em estratégia de guerra, "e eles têm que obedecer".

Falando depois à CNBC, Raimondo ampliou a confusão, dizendo que Nvidia e outras devem seguir o "espírito" da lei.

"Não está claro qual é o caminho legal para impedir as novas vendas da Nvidia, já que estão em conformidade com as regras", comenta Paul Triolo, da consultoria ASG. "Empresas respeitam a letra da lei e não algum 'espírito', sobretudo algo tão amplo como 'desacelerar o desenvolvimento tecnológico da China'."

De passagem por Singapura, o CEO da Nvidia, Jensen Huang, falou que a China responde por 20% da receita da empresa e que pretende seguir desenvolvendo chips para o país, evitando citar Raimondo.

"O governo americano sabe o que estamos fazendo e, quando criarmos produtos que alcancem a visão [do governo], poderemos levá-los ao mercado chinês. Esperamos, como sempre, que isso tenha êxito, mas não há garantia."

Acrescentou que a Nvidia tem diversos clientes chineses de porte para os chips de IA (inteligência artificial) em Singapura, listando ByteDance (TikTok), Tencent e Alibaba, e reconheceu que a Huawei, como outras empresas produzindo nessa faixa de chips, é uma concorrente "muito formidável".

As palavras duras de Raimondo, na fundação do ex-presidente Ronald Reagan, foram também aos aliados, como o Japão, que estão sendo monitorados para não exportar à China.

"Temos uma abordagem semelhante à do CoCom da Guerra Fria, para enfrentar a ameaça que a China representa", afirmou, referindo-se ao comitê liderado pelos EUA no pós-guerra, para o embargo tecnológico da Europa Oriental e da União Soviética.

A secretária estava também atenta ao Congresso. Disse que vinha sendo procurada por parlamentares, cobrando resultados contra Pequim, e sublinhou que seu orçamento é limitado —e que eles, congressistas, poderiam aumentar. Logo depois, saiu um esperado relatório da Câmara, apontando o fracasso de Raimondo em conter a "hemorragia de tecnologia" para a China.

Para Triolo, todos os comentários feitos pela secretária ao longo da última semana "parecem destinados a afastar as críticas à aplicação dos controles de exportação", que seriam apresentados pela Câmara. Com reveses em série, está acuada em Washington e no Vale do Silício.

Para o analista Kevin Xu, ex-integrante do próprio Departamento de Comércio no governo Barack Obama, "a beneficiária de tudo isso, claro, é a Huawei". Não que seus chips de IA "estejam perto de onde os da Nvidia estão agora, mas simplesmente porque ela se tornou a única disponível".

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