Descrição de chapéu Todas desigualdade de gênero

Reino Unido amplia políticas de menopausa no ambiente de trabalho e debate chega ao Parlamento

Iniciativas mudam práticas, tentam aumentar o diálogo com empregadores e combater a desinformação

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Londres

Quando tinha 40 anos, a inglesa Claire Boomer se surpreendeu ao ter diversos sintomas depois de uma histerectomia, cirurgia para remoção do útero.

"Tive confusão mental, dificuldade de reter informação. Ficava muita cansada, com dores. Perdi o desejo sexual. Quando não sabemos das coisas, pensamos: o que está acontecendo comigo? Por que estou perdendo a autoconfiança, tendo ansiedade?," disse à Folha.

Na época, era prefeita de Cirencester, na Inglaterra, e sentiu impacto no trabalho.

"Tinha medo de falar em público e perder a linha de pensamento, passar vergonha," disse.

A causa era menopausa precoce, mas ela só descobriu ao assistir a um programa de televisão sobre o tema. Procurou ajuda, começou a fazer terapia de reposição hormonal (TRH) e melhorou. Decidiu usar a posição que ocupava para auxiliar outras mulheres. Criou uma política de menopausa na prefeitura e hoje dá consultoria a empresas e organizações que querem fazer o mesmo.

Fotografia colorida mostra uma mulher asiática de costas, sentada em uma poltrona, olhando pela janela
Um relatório publicado ano passado por deputadas do Comitê de Mulheres e Igualdade no Reino Unido revelou que três em cada cinco mulheres na menopausa entre 45 e 55 anos são afetadas negativamente no trabalho - Adobe Stock

"Podem ser horários flexíveis de trabalho —não muito, porque não seria positivo; melhor ventilação nas salas, abertura para conversar. Mulheres têm que poder falar abertamente se estão sofrendo, tiveram insônia, precisam ir a uma consulta médica."

Com a ajuda de Claire, a Royal Agricultural University, com 60% dos 250 funcionários do sexo feminino, criou política similar. Algumas mulheres já procuraram apoio.

"Está à disposição de todas, da equipe de limpeza, passando por professoras e pesquisadoras," disse à Folha Sarah Lower, diretora de RH da universidade cujo patrono é o rei Charles 3º.

"Queremos que saibam que podem falar, que vamos levar a sério e apoiá-las; sermos inclusivos e termos a certeza de que serão tratadas de forma justa," disse.

"Pode ser algo como colocar a mesa perto da janela, controlar a temperatura de sua sala, ajustar horário e local de trabalho."

Para a diretora, é fundamental incluir homens e jovens no debate.

"A educação é importante para que as pessoas saibam o impacto da menopausa. Conversar com nossos funcionários homens têm sido ótimo. Eles têm apoiado bastante."

A discussão chegou ao Parlamento britânico. Um relatório publicado ano passado por deputadas do Comitê de Mulheres e Igualdade revelou que três em cada cinco mulheres na menopausa entre 45 e 55 anos são afetadas negativamente no trabalho, e quase novecentas mil no Reino Unido largaram o emprego por causa dos sintomas. Também afirma que a lei não protege as que sofrem discriminação, falta conscientização entre empregadores, e aponta falhas no sistema público de saúde (NHS), como escassez de especialistas e medicação. O governo promete seguir parte das recomendações.

Diretrizes do NHS listam sintomas possíveis na menopausa, quando há a parada definitiva da menstruação: ondas de calor, secura vaginal, insônia, mudança de humor, problemas de memória e concentração, dores, entre outros, e aponta a reposição hormonal como principal tratamento.

Mas Louise Newson, médica há 30 anos, 25 deles no NHS, e criadora de um centro de ajuda a mulheres, lembra que só 14% das britânicas nessa etapa da vida recebem TRH através da saúde pública. Para ela, há muita desinformação.

"Toda mulher que quer receber reposição hormonal deveria ter esse direito. Sabemos que há mais benefícios do que riscos, e deveríamos olhar os riscos de não tomar e de outras medicações prescritas para sintomas de menopausa como antidepressivos, analgésicos, pílulas para dormir, estatinas para baixar o colesterol ligado a mudanças hormonais," disse à Folha.

Este mês, o Instituto Nacional de Saúde e Excelência em Cuidado (NICE) —responsável por recomendações na área— divulgou o rascunho de uma nova diretriz sobre menopausa sugerindo que terapia cognitivo-comportamental seja oferecida como "complemento ou alternativa à reposição hormonal." A médica criticou o documento.

"É muito parcial contra a reposição hormonal, é frustrante. A palavra ‘riscos’ é mencionada 293 vezes, ‘câncer de mama’ 150 vezes e, ‘benefício,’ 39 vezes," disse.

"Já é difícil para as mulheres serem ouvidas, receberem tratamento correto. Ter uma organização nacional sugerindo isso é duro."

Em um artigo para o jornal britânico The Times, ela definiu o apoio global para mulheres na menopausa como "completamente inadequado," e as recomendações do NICE como "um retrocesso."

"Sabemos que o risco de câncer de mama (pela reposição hormonal) não é significativo estatisticamente. Mesmo assim, falam sobre isso."

"A ciência é clara sobre o papel dos hormônios no corpo. Não entendo as vantagens de uma agenda que defende que hormônios são perigosos, quando são substâncias naturais do nosso corpo. Tentam criar controvérsia quando a resposta é simples e está na medicina."

Quando Claire conseguiu fazer reposição hormonal no NHS em consequência da histerectomia, considerou sorte.

"Depende do médico. O NHS é maravilhoso, no entanto alguns não aprenderam muito sobre menopausa. Se uma mulher vai ao médico aos 35 anos achando que está na perimenopausa (fase de transição para a menopausa), há chance de ser mandada embora e dirão para ela voltar depois dos 40."

Como consultora, discorda de quem acha que expor o assunto desencoraja a contratação de mulheres.

"Já ouvi mulheres me dizendo que eu não deveria falar que estava na menopausa, e isso é horrível. O mundo mudou tanto nos últimos anos e mulheres estão em cargos de liderança. Devemos abraçar políticas de menopausa. Uma empresa pode ter um homem em um cargo, mas também uma mulher que só precisa de um horário um pouco mais flexível, mas vai trabalhar o mesmo número de horas. Acho positivo mantermos o diálogo," disse.

"Quero que mulheres de gerações futuras continuem em cargos de liderança e tenham autoconfiança. Meu objetivo é auxiliar a implementar diretrizes que não sejam só um pedaço de papel, mas na prática ajudem de verdade, para que empresas mantenham funcionárias, mulheres se sintam valorizadas, sigam trabalhando e não desistam das carreiras."

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