Agenda de revisão de gastos pode ter mais protagonismo da Fazenda, diz Durigan

Número 2 da Fazenda afirma que não houve afrouxamento fiscal nem há mudança de expectativa para justificar fim do ciclo de corte da Selic

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Brasília

O Ministério da Fazenda pode ter mais protagonismo na agenda de revisão de despesas, afirma à Folha o secretário-executivo da pasta, Dario Durigan. Segundo ele, a equipe do ministro Fernando Haddad está disposta a encampar e fortalecer essa pauta para não ficar só nas medidas de arrecadação.

"É preciso fazer mais do que a gente tem feito a respeito de revisão das despesas", diz.

Apesar da intenção de perseguir esse novo flanco, o secretário afirma que será preciso enviar até 31 de agosto novas medidas de receita ao Congresso para conseguir cumprir a nova meta fiscal zero em 2025.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, durante entrevista à Folha na sede da pasta - Pedro Ladeira/Folhapress

"Não é de nenhuma forma um afrouxamento da agenda fiscal. É o contrário. É fazer a calibragem correta de qual é o objetivo final e persegui-lo com afinco", diz. Para ele, não houve mudança nas expectativas em relação ao ajuste fiscal que justifique antecipar o fim do ciclo de cortes na taxa básica de juros, a Selic.

Durigan reconhece que o ambiente político mudou, mas afirma que tem reforçado com lideranças e com os presidentes das duas Casas legislativas a necessidade de manter o acordo pela responsabilidade fiscal.

"O Congresso tem uma miríade de forças políticas. Num momento como esse em que se avizinha a eleição municipal e outros desafios políticos, para alguns pode-se perder de vista a importância da responsabilidade fiscal", diz.

O governo mudou a meta de 2025 e está tendo dificuldade de coordenar a expectativa. Por quê?
Nosso projeto econômico se mantém. Não há nenhuma alteração nas mudanças que a gente quer para o país e nos ajustes que precisam ser feitos.

A primeira projeção das metas foi feita no ano passado. Atualizando os cenários para este ano, mantém os mesmos desafios. Mas é preciso fazer com que esse desafio seja cumprido.

Os analistas não acreditam que o governo cumprirá nem mesmo a nova trajetória.
A parceria desse projeto no ano passado com o Congresso e com o Judiciário permitiu que a gente avançasse. Tem que dialogar, propor, repropor, insistir, ir aos outros Poderes quando necessário para perseguir um projeto.

Temos que corrigir uma década perdida para que a gente não tenha, de novo, mais uma década perdida. Estes primeiros anos do governo Lula valem a próxima década de desenvolvimento.

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, alertou para os riscos da mudança na meta para a política de juros. Isso chegou num momento de maior incerteza internacional. A economia brasileira está preparada?
O projeto econômico serve para isso também, proteger o Brasil em situações externas graves e negativas. A agenda fiscal do Brasil nunca esteve tão intensa como agora. Não é de nenhuma forma um afrouxamento da agenda fiscal. É o contrário. É fazer a calibragem correta de qual é o objetivo final e persegui-lo com afinco, como temos feito desde o começo. Vamos surpreender também em 2024.

Mas a agenda fiscal pode interromper o processo de queda de juros?
Não há motivo e não há mudança de expectativa.

O governo precisa de R$ 50 bilhões para alcançar a meta de 2025. Como vão arrumar esse dinheiro?
Vai ser preciso, de agora até o envio do projeto de Lei Orçamentária [em 31 de agosto], de mais medidas que sigam o mesmo projeto.

Não esgotou o espaço no Congresso?
Não. O Brasil é um país fértil em desigualdade e em medidas que não mostram eficiência. É preciso, com cuidado, avaliar quais são essas correções.

O sr. pode falar quais seriam?
Por enquanto, não. A gente vai anunciar.

Como vão enfrentar o debate no Congresso em ano de eleições municipais e com a sucessão do comando do Congresso?
A gente precisa seguir com a parceria. Precisamos aprofundar essa agenda que foi bem-sucedida no ano passado para repetir os bons resultados da economia. Acredito que o Congresso não vai nos faltar.

Nesta semana [passada] foi aprovada na comissão mista a medida provisória 1.202 com o limite das compensações judiciais. Tem avançado a discussão do Perse. A parte previdenciária [das desonerações para empresas e municípios], insistimos para que o Congresso se reengajasse. Pode estar havendo alguma dificuldade. Vai ser preciso acionar o Judiciário.

A judicialização não pode gerar algum ruído nas conversas pelas novas medidas para 2025?
Temos cumprido com o itinerário institucional. Espero que não tenha ruído com o Congresso sobre isso, porque cabe ao Judiciário analisar os aspectos formais e de constitucionalidade.

Qual o grande receio, e por isso a necessidade de judicializar? Se a Previdência segue sendo deficitária, a gente vai acabar tendo que discutir reforma de novo, prejudicando os trabalhadores.

Como fica o Perse?
A ideia é criar mais mecanismos de controle dos beneficiários, para ter um programa mais enxuto do ponto de vista fiscal e que dê os resultados que os líderes do Congresso esperam para o setor.

É melhor fechar um desenho para que a gente não perca controle e limite a renúncia do programa dentro de uma quantia predeterminada. A Fazenda quer que seja o menor possível, com um desmame nos próximos dois anos para que o setor se adapte.

O sr. vê uma pauta-bomba no Congresso?
O Congresso tem uma miríade de forças políticas. Num momento como este, em que se avizinha a eleição municipal e outros desafios políticos, pode-se perder de vista, para alguns, a importância da responsabilidade fiscal. O que nós temos feito chegar aos líderes do Congresso, em especial aos dois presidentes das Casas, é a necessidade de manter o acordo pela responsabilidade fiscal.

Vão conseguir blindar a agenda econômica dessa miríade de forças?
A estratégia é a mesma do ano passado, colocando metas ousadas. Se o ambiente é outro, a gente tem que ir ajustando os nossos objetivos. Não a direção desses objetivos, mas a dose.

Não está sendo alterada a direção da relação com o Congresso. Segue havendo uma aliança importante sobre a agenda econômica com o Congresso.

O que se ouve é que a regulamentação da reforma tributária será usada politicamente. O sr. não teme?
Não é simples votar uma alteração de todo o regulamento estadual e municipal de tributação. O trabalho do Executivo é trazer um texto que esteja pactuado com estados e municípios. Preciso valorizar institucionalmente a Federação.

A Fazenda vai encampar e se engajar mais ativamente na agenda de revisão de gastos?
Não posso deixar de dizer que somos favoráveis a uma agenda de revisão de gastos. Essa agenda precisa também se aprofundar. O desejo da equipe econômica é que isso seja feito da maneira mais rápida possível. Agora, há um contexto e uma sensibilidade política a que estamos também muito atentos.

Vamos seguir dialogando com o mundo político para fazer esse ajuste. Se não for em um ano, que seja em dois. A agenda de gastos conta com o total apoio da Fazenda e pode ter, sim, mais protagonismo da Fazenda.

Revisão de gastos não necessariamente é corte de despesa. O governo vai enfrentar uma agenda de corte efetivo de despesas?
A revisão do gasto público brasileiro é necessária, mas digo aqui e admito: é preciso fazer mais do que a gente tem feito a respeito de revisão das despesas. O Ministério da Fazenda está disposto a encampar esse projeto e fortificar essa agenda com o Planejamento.

Quais os caminhos?
Não posso antecipar medidas concretas.

O Tribunal de Contas da União mandou regularizar o calendário do abono salarial, postergado em governos anteriores. Pode ser uma oportunidade para rediscutir o abono?
A União tem estudado como apresentar razões ao tribunal para mostrar que isso não cabe dentro do Orçamento, que a gente pague duas folhas em um ano. É preciso que ainda se aguarde qual vai ser a definição final do TCU. Mas pode ser uma alternativa para que a gente faça esse debate, sim.

Há uma pressão forte dos servidores para reajustar os salários ainda em 2024. Tem espaço?
Acho difícil que a gente tenha espaço para reajuste em 2024.

O sr. esteve com o presidente Lula para discutir os dividendos da Petrobras. Qual foi a decisão?
O prazo que o presidente havia dado para que a companhia complementasse as informações foi cumprido, e há segurança para que os dividendos sejam pagos. O presidente está confortável, e o governo está sinalizando voto favorável à distribuição de 50% dos dividendos [para a próxima reunião do conselho da empresa]. Os demais 50% ficam para avaliação nos próximos meses.


RAIO-X

Dario Durigan, 39

Formado em direito pela USP (Universidade de São Paulo), com mestrado na mesma área pela UnB (Universidade de Brasília). Foi servidor de carreira da AGU (Advocacia-Geral da União) entre 2010 e 2019. Atuou como assessor na Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil no governo Dilma Rousseff (PT) e assessorou Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo. Foi diretor de políticas públicas do WhatsApp entre 2020 e 2023. Desde junho de 2023, é secretário-executivo do Ministério da Fazenda.

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