EUA apostam na transição energética para frear concentração de terra

USDA dedica bilhões de dólares para promover práticas agrícolas amigáveis ao clima e favorecer pequenas propriedades

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Kim Chipman Michael Hirtzer Tarso Veloso
Bloomberg

Os Estados Unidos estão apostando que a transição para energia limpa combinada com investimentos massivos em infraestrutura irá reverter um declínio persistente nas fazendas familiares, criando novas oportunidades de receita para os produtores enquanto aumenta sua capacidade de competir no exterior.

Mais de 500 mil fazendas em todo o campo americano desapareceram ao longo das últimas quatro décadas, após políticas favorecerem a consolidação delas.

Enquanto o peso industrial resultante fortaleceu o status dos EUA como um gigante agrícola, isso causou estragos em produtores de pequeno e médio porte e nas economias rurais que dependem deles.

Mas um renascimento está em curso, de acordo com o secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack. "Precisamos mudar a direção, caso contrário, em 40 anos estaremos dizendo que perdemos mais 500 milhões de acres", disse em entrevista à Bloomberg no início deste mês.

Plantação de milho em McIntire, Iowa, nos Estados Unidos - Scott Olson - 31.out.2023/Getty Images via AFP

A pasta está dedicando dezenas de bilhões de dólares para promover práticas agrícolas amigáveis ao clima, à medida que o mundo corre para descarbonizar, lidando com tudo, desde fertilizantes até métodos de pastagem.

O objetivo é reduzir as emissões de gases de efeito estufa da agricultura e tornar os produtores elegíveis para participar de mercados potencialmente lucrativos, como o combustível de aviação sustentável (SAF, em inglês).

As iniciativas permitem que as fazendas lucrem monetizando seu excedente de eletricidade renovável, além de ajudá-las a acessar novos mercados para vender, incluindo escolas e feiras.

O USDA (Departamento de Agricultura dos EUA, na sigla em inglês) também está dedicando fundos para criar oportunidades de exportação mais robustas para os produtores dos EUA em regiões como África, Sudeste Asiático e América Latina.

"Isso está permitindo que os agricultores digam para a próxima geração: 'Você pode ser empreendedor e fazer a diferença no mundo'", disse.

A oportunidade de lucrar vendendo mais nos sistemas alimentares locais e regionais é significativa. Enquanto os agricultores podem receber cerca de US$ 0,15 a US$ 0,21 gasto no supermercado, eles podem receber até US$ 0,75 em uma feira ou em outros locais nos quais os produtores trabalham diretamente com os consumidores, disse Vilsack.

No entanto, paira a incerteza sobre se os agricultores dos EUA podem reduzir sua pegada de carbono rápido o suficiente para serem competitivos com grãos e oleaginosas de outros países, bem como com outras formas de produzir produtos de alto valor, como o combustível de aviação sustentável.

Em janeiro, a primeira fábrica do mundo a usar etanol de todos os tipos para produzir SAF foi inaugurada na Geórgia.

A milhares de quilômetros ao norte, em Iowa, o maior produtor de etanol à base de milho do país, produtores de biocombustíveis disseram que a abertura foi um alerta para acelerar a descarbonização para competir com o etanol do Brasil.

Vilsack, ex-governador democrata de Iowa, prevê uma "aceleração rápida" nos investimentos em SAF à base de culturas após o governo Biden divulgar detalhes há muito esperados sobre créditos fiscais federais destinados a desencadear uma explosão na produção americana de combustível para aviões com menor emissão.

A atualização de uma ferramenta dos EUA usada para calcular os gases de efeito estufa das indústrias de transporte e energia é esperada dentro de algumas semanas, disse Vilsack.

Enquanto a estratégia do governo está focada em fortalecer o pequeno agricultor e as comunidades rurais, Vilsack espera que as políticas da administração também fortaleçam a posição dos EUA nos mercados mundiais. Nos últimos dez anos, a América perdeu seu status como o principal exportador global de milho e soja para o Brasil.

Uma vez que os EUA consertem suas estradas e pontes, e os sistemas ferroviários e portuários funcionem de forma mais eficiente, a América poderá recuperar sua vantagem em infraestrutura, disse. A lei de infraestrutura de US$ 1 trilhão do presidente Joe Biden, aprovada em 2021, irá "mudar o jogo nas exportações", disse Vilsack.

Plantação de milho no Iowa - Kia Johnson - 5.out.2019/Reuters

Embora tenha se recusado a comentar diretamente sobre as eleições deste ano, Vilsack disse que vê pouco risco de um novo governo entrar e possivelmente reverter os esforços para ajudar o campo, já que a transição para a energia limpa será difícil de parar.

Ele disse que os agricultores há 10 anos teriam dito "não, obrigado" aos programas em relação ao clima, mas agora os grupos agrícolas e os produtores estão entendendo cada vez mais os benefícios.

Mudança de Mentalidade

"É uma oportunidade empreendedora ilimitada para sair da mentalidade de 'Cresça ou Saia'", disse. A frase é uma referência ao mantra de Earl Butz, que esteve à frente da pasta de agricultura nos governos Richard Nixon e Gerald Ford, que também foi adotado pelo chefe agrícola do presidente Donald Trump, Sonny Perdue.

"Agora o resto pode ser empreendedor", disse Vilsack. "Eles podem ter duas ou três fontes de renda e talvez não precisem trabalhar em um segundo emprego."

Vilsack, que também foi secretário da Agricultura sob Barack Obama e é o segundo mais longevo da história dos EUA, disse que sua abordagem não é enfrentar gigantes do manuseio de culturas como a Cargill e a Archer-Daniels-Midland.

"Isto se trata de dizer que deveríamos ser capazes de criar mais opções, e então o agricultor pode tomar a decisão sobre o que é melhor para sua operação", disse. "Essa é a beleza disso —complementa, não compete."

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