Preços do leilão de energia do Paraguai ficam longe do mínimo necessário de US$ 49,83

Esse seria o valor para eventual 'venda contábil' sugerida pelo país vizinho, segundo estimativa da Frente Nacional de Consumidores

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São Paulo

Simulações feitas pela Frente Nacional de Consumidores de Energia, e obtidas em primeira mão pela Folha, apontam que o Paraguai teria de comercializar a energia no mercado livre do Brasil acima de US$ 49,83 pelo MWh (R$ 277,53 pelo megawatt-hora), caso queira realizar a sugerida "venda contábil" utilizando a energia de Itaipu, sem perder dinheiro.

No final de julho, o Paraguai realizou um leilão para vender 100 MW médios de sua energia no Brasil, sem explicar como entregaria e sem que os trâmites regulatórios fossem concluídos. Nesta sexta-feira (6), a Ande (estatal paraguaia responsável pelo leilão e também pela energia de Itaipu no país vizinho) divulgou a lista de sete comercializadores que foram habilitados naquele leilão, sem deixar claro se já escolheu o vencedor. Os valores ficaram muito abaixo do piso estimado pela Frente de Consumidores (veja lista abaixo).

Escoamento de excedente de água em Itaipu - Sara Cheida/Itaipu Binacional/Itaipu Binacional

A Folha enviou mensagem solicitando mais esclarecimentos ao diretor de Planejamento da Ande, Francisco Escudero, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

Apesar de o ONS (Operador Nacional do Sistema) sinalizar a possibilidade de a importação ser física, com a energia indo do Paraguai para o Brasil pela conexão de Furnas, a Frente mantém o entendimento de restrição técnica para essa alternativa. Segundo a entidade, ainda que fossem feitos os ajustes regulatórios para o Paraguai utilizar a energia de Itaipu nessa operação, a conta não fecharia.

"Se custar menos que esses cerca de US$ 50 numa operação envolvendo Itaipu, significa que o Paraguai venderia energia duplicada, ou seja, que já foi paga pelo brasileiro", afirma Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente.

Para entender o valor apresentado pela entidade, é preciso assimilar como se faz a divisão do bolo financeiro na usina binacional.

As operações em Itaipu são feitas com base na potência, que é a capacidade de geração da energia considerando os equipamentos instalados, medida em megawatt. Cada sócio arca com o custo da quantidade de potência que consome e divide os demais custos operacionais e regulatórios, como pagamento de royalties. A base para a contabilização dessa conta é o Cuse (Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade).

Pelo tratado, a energia e demais despesas de Itaipu são divididas meio a meio entre os dois países sócios. Se um lado não conseguir consumir todos os seus 50%, obrigatoriamente, a fatia que sobra fica para o outro parceiro. É proibido vender diretamente para terceiros.

Desde o início da operação de Itaipu, o Paraguai não consome tudo e cede sua sobra para o Brasil. Nessa operação, os brasileiros pagam o Cuse da parcela que o país vizinho não consome, e ainda desembolsam um bônus pelo uso dessa energia cedida, que tecnicamente é chamada de energia excedente do Paraguai.

Pelas contas da Frente, em valores correntes, atualmente, quando o Paraguai cede para o Brasil um volume de 100 MW médios, ele deixa de pagar US$ 32,79 milhões (R$ 182,63 milhões) referentes ao Cuse, que o Brasil paga no seu lugar, e ainda ganha dos brasileiros US$ 10,86 milhões (R$ 60,48 milhões), pela cessão de energia.

Se quiser usar a energia de Itaipu para vender 100 MW médios no mercado livre do Brasil, não basta que o Paraguai suspenda a cessão do excedente de energia para o Brasil. Precisa, ao mesmo tempo, assumir o pagamento do Cuse referente a esse volume de energia.

Convertendo para MWh, que mede fluxo de energia, e é a métrica adotada nas transações: o Paraguai precisa garantir que vai receber no mercado livre brasileiro US$ 12,40 (R$ 69,06) por MWh para cobrir o que ganha do Brasil pelo excedente, e ainda receber outros US$ 37,43 (R$ 208,47) por MWh para quitar a parcela referente ao Cuse. Por isso o MWh chegaria ao mercado livre por, no mínimo, US$ 49,83 —o que não foi conseguido no leilão.

A proposta de usar energia de Itaipu não é uma simulação da Frente. Foi sugerida a comercializadores em evento da Ande no Paraguai e explicada à Folha, em troca de mensagem da reportagem com o diretor de planejamento da estatal paraguaia, realizada em julho.

"Como o Paraguai transfere boa parte de seu direito [de uso da energia] em Itaipu Binacional [para o Brasil], serão deduzidos dessa transferência os 100 MW médios vendidos pela Ande ao agente comercializador do ACL [Ambiente de Contratação Livre] que for adjudicado na competição de preços. Isso [a possibilidade] existe e consta na ata do conselho de administração da binacional Itaipu. Deve ser regulamentado e operacionalizado pelo MME do Brasil, que está trabalhando nisso", escreveu Escudero à Folha.

VALORES OFERECIDOS PELA ENERGIA DO PARAGUAI

1. Enel Trading Brasil
US$ 10,11 por MWh, de 1º de janeiro de 2025 a 31 de dezembro de 2026
R$ 56,30 por MWh

2. Matrix Comercializadora
US$ 12 por MWh, por até três anos, com mínimo de um ano
R$ 66,83 por MWh

3. Infinity
US$ 21,03 por MWh, por seis anos
R$ 117,12 por MWh

4. Âmbar
US$ 10,33 por MWh, por seis anos
R$ 57,53 por MWh

5. Engelhart – BTG Commodities
US$ 7,73 por MWh, por três anos
R$ 43 por MWh

6. Kroma
US$ 8,68 por MWh, por seis anos
R$ 48,34 por MWh

7. Vitol Power Brasil
US$ 8,66 por MWh, de 1º de janeiro de 2025 a 31 de dezembro de 2030
R$ 48,23 por MWh

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