Grandes empresas correm atrás de startups para modernizar processos

Companhias criam programas de parceria, mas sucesso depende de ajustes

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São Paulo

As grandes empresas estão mais interessadas do que nunca em trabalhar com startups. Nos últimos anos, pululam programas por meio dos quais os negócios mais tradicionais buscam soluções inovadoras para melhorar seus processos.

“As corporações começaram a ser incomodadas pelo sucesso das startups porque viram que seu modelo tradicional tinha uma ponta de fraqueza e havia empresas trabalhando de maneira diferente, e aí começaram a abrir as portas para elas”, afirma Junior Bornelli, 37, fundador da StartSe, empresa de educação executiva continuada.

De acordo com empreendedores donos de startups, essa mudança ganhou força nos últimos dois anos. Antes disso, a aproximação com as grandes corporações era mais complicada.

“Era email não respondido, tentativa de abordagem malsucedida pelo LinkedIn... Hoje já existe interesse e ações concretas para essas empresas estarem próximas de nós”, conta Gabriel Senra, 31, diretor-executivo e fundador da lawtech Linte, empresa fundada em 2015 que faturou R$ 5 milhões em 2018 e tem Itaú e Accenture como clientes. 

A Linte opera dentro do Cubo, espaço de empreendedorismo mantido pelo Itaú e pelo fundo Redpoint eVentures, que, entre outras coisas, ajuda na conexão entre startups e potenciais parceiros.

De acordo com Fernando Freitas, superintendente executivo de inovação do Bradesco, as grandes companhias passaram a dar mais atenção às startups também porque elas evoluíram.

“Essas empresas agora têm mais maturidade do que há alguns anos, porque hoje há mais capital disponível para elas. Com isso, o número de talentos cresceu e as grandes marcas passaram a ter um olhar mais atento”, afirma.

O Bradesco abriu no ano passado o Inovabra habitat, espaço que também abriga startups. Ali, elas podem entrar em contato com eventuais clientes ou até mesmo se tornar prestadoras de serviço do próprio banco.

Mas, uma vez que a parceria é firmada, ainda há obstáculos. Os dois tipos de empresa representam modelos diferentes de fazer negócio. 

Enquanto as startups são dinâmicas e buscam celeridade em seus processos, as empresas maiores costumam ser mais engessadas e, consequentemente, demorar mais na tomada de decisão, que pode ter de passar por diversos departamentos.

“O grande demanda mais. Seus processos internos são maiores, e para esses clientes, que são importantes para a receita, temos de estar mais abertos a customizações”, diz Denise Ditz, vice-presidente da Qulture.Rocks, plataforma de gestão de desempenho, que tem clientes como Grupo Pão de Açúcar e L’Occitane e também fica no Cubo.

Para que os dois tipos de negócios consigam trabalhar bem juntos, é preciso haver um alinhamento de expectativas, avalia Maximiliano Carlomagno, fundador da Innoscience, consultoria em gestão da inovação.

“Às vezes a startup pensa ‘nossa, agora essa grande empresa vai mudar minha vida’ e a companhia já consolidada acha que a inovação trazida pela startup vai salvá-la, e nem sempre é assim”, diz.

Além disso, acrescenta Carlomagno, é necessário que as  partes saibam muito bem o que querem na parceria. Se não houver essas duas coisas, avalia, a relação não funciona.

Rodrigo em frente a um vidro transparente cheio de post-its rosas e amarelos
Rodrigo Moreno, na sede da MarketUP, na região central de São Paulo  - Karime Xavier/Folhapress

Do lado das grandes companhias, há medidas que podem ser tomadas para mitigar os riscos da colaboração.

O Bradesco, conta Freitas, após identificar uma possível parceira, a escrutina à exaustão. Primeiro tenta ter a certeza de que a ela entrega realmente o que seus clientes desejam. “Às vezes a startup soluciona um problema que é só um pouquinho diferente do dos nossos clientes, mas já não funciona”, diz. 

Depois, há uma série de testes, após os quais o banco pode fazer pedidos de correção e adaptação pontual do produto. “Só então podemos seguir em frente, mas 90% dos relacionamentos acabam nessas duas etapas”, afirma.

Com isso, o Bradesco espera já estar mais alinhado com a parceira quando começarem os trabalhos. 

Uma das empresas que passaram pelo processo, a MarketUP, fornecedora de um software de gestão voltado para MEIs (microempreendedores individuais), entregou soluções ao banco no ritmo de startup.

“Entre a primeira conversa e o nosso produto ser colocado no ar se passaram exatos 25 dias”, relembra Rodrigo Moreno, 41, sócio da empresa. 

Moreno conta que geralmente a relação com grandes empresas é engessada, mas que nesse caso específico houve agilidade. 

“Nos permitiram fazer o projeto como idealizamos e confiaram em nós sem precisarmos passar por todos os processos que geralmente existem numa companhia maior. Era um projeto em que eles tinham o prazo como um dos principais problemas”, conta.

Outra estratégia que as grandes corporações adotam para acelerar seus processos internos durante esses projetos é criar demandas de cima para baixo, com o endosso do conselho da companhia.

“É inevitável que ocorram impasses por conta do ritmo acelerado das startups, mas esse endosso de cima pode acelerar a implementação, mitigando qualquer coisa que possa travar a parceria”, afirma Bernardo Costa, gerente de inovação e transformação digital da Algar Tech, empresa do grupo Algar.

Apesar das diferenças quanto ao modelo de negócios, conseguir prestar um bom serviço para um cliente grande pode ajudar a startup a alçar voos mais altos.

“Se a gente entra e faz um trabalho bem feito, eles compartilham isso com os clientes deles, o que nos ajuda a ter mais abertura com essas outras empresas”, diz Kedma Tolentino, 44, CEO da 4DMais, startup de educação que tem a Algar como cliente.

As startups, avalia Guilherme Arradi, gerente do Centro de Referência em Economia Criativa do Sebrae-SP, devem se preparar para vender bem a solução que oferecem quando forem participar de algum programa de conexão disponibilizado por corporações. 

“Esses processos têm uma fase de apresentação, que precisa ter muita clareza. Muita gente perde tempo falando só de tecnologia e não consegue mostrar o que exatamente sua solução faz”, diz.

Segundo ele, cerca de 90% dos pitches (termo usado nesse mercado para descrever apresentações sucintas) são incompreensíveis.

Programas de conexão de empresas

Germinar M Dias Branco 
Com foco em startups das áreas alimentícia, industrial e logística. Inscrições até 21 de abril; germinarmdiasbranco.com.br

Empreenda Santander
Seleciona startups para aporte financeiro e bolsa de estudos na Babston College (EUA). Inscrições até 26 de abril; santander.com.br/universidades/empreendedorismo

Ocyan Waves
Voltado para startups do setor de óleo e gás. Serão escolhidas até oito empresas para virarem parceiras da Ocyan. Inscrições até 28 de abril; ocyanwaves.com

Gerdau Builders
Escolhe dez empresas do setor de construção civil e do de reciclagem. Inscrições até  29 de abril; endeavor.org.br/scaleup/gerdau-builders

Radar Santander
Busca startups de qualquer setor e seleciona entre oito e dez delas. Inscrições até 5 de maio; santander.com.br/radar

SLC Agrícola Agroexponencial
Seleciona startups do setor do agronegócio para que se tornem parceiras da empresa. Inscrições até 14 de maio; slcagricola.brightidea.com/agroexponencial

Scale-Up Tech
Endeavor busca 15 empresas que ofereçam soluções com base tecnológica para acelerá-las. Inscrições abertas até 17 de junho; endeavor.org.br/scaleup/tech

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