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Conheça os makers que tomaram a dianteira na luta anti-Covid e salvaram vidas

Laboratórios e universidades criam de ventiladores pulmonares a pias; plataforma reúne iniciativas

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Denise Meira do Amaral
São Paulo

Quando a pandemia fez o sistema de saúde na Europa entrar em colapso, um grupo de engenheiros da Escola Politécnica da USP ligou o sinal de alerta. Era uma prévia do que aconteceria no Brasil, semanas depois, quando os casos de Covid-19 começaram a ser notificados.

Adepta da cultura maker —embasada na criação aberta e colaborativa—, a equipe da Poli liderada pelos professores Marcelo Zuffo e Raul González formulou o Inspire, ventilador pulmonar emergencial de alta complexidade produzido no próprio laboratório do Citi (Centro Interdisciplinar em Tecnologias Interativas), da USP.

Enquanto os aparelhos convencionais variam de R$ 30 mil até quase R$ 400 mil, o Inspire custa em torno de R$ 5.000.

"A cultura maker possibilita a democratização do conhecimento e há vários experimentos que mostram seu benefício na cura dessa doença", conta Zuffo. Só para Manaus, o grupo doou 49 ventiladores.

Dentro dessa nova cultura incluem-se os Fab Labs, laboratórios criativos com máquinas de impressora 3D e cortadora a laser. "Uma das grandes vantagens dos laboratórios de fabricação digital é que as máquinas permitem a criação protótipos com mais velocidade a um custo muito mais baixo em comparação com a indústria", diz Gustavo Abreu, coordenador do Fab Lab Facens, em Sorocaba (SP).

Parte da rede criada pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology), o Fab Lab Facens desenvolveu uma caixa de intubação que permite o manuseio do paciente pelo médico de forma segura, bloqueando as secreções.

De policarbonato, cada caixa custa cerca de R$ 1.000. Já foram produzidas e doadas 17 unidades, com financiamento do Centro Universitário Facens, para entidades como Graacc e InCor.

As caixas intubadoras seguem um dos pilares do movimento maker: são de código aberto, ou seja, qualquer um pode baixar, mudar e replicar.

Já o Hospital Alemão Oswaldo Cruz diminui o número de intubações em pacientes de Covid-19 após adaptar aparelhos de ventilação mecânica não invasiva com filtros antivirais acoplados —o que não existia nos equipamentos tradicionais. Antes, os pacientes infectados eram impedidos de utilizar ventiladores não invasivos porque seu uso só é possível sem máscara, e eles contaminariam as pessoas ao redor.

"Dessa forma, poupamos ventiladores invasivos para os quadros mais graves e liberamos leitos de UTI", conta o fisioterapeuta Milton Telles, que atua no combate à pandemia no hospital. Até agora, já foram doadas quase 500 peças, produzidas por uma impressora 3D no sistema de inovação do próprio Oswaldo Cruz.

Com tantas iniciativas, a plataforma Protege BR surgiu justamente para agrupar os projetos, criar uma rede de apoio aos profissionais de saúde e atender às demandas de urgência. Em parceria com o Google.org, a Protege reuniu 250 iniciativas. "A gente não precisa mais esperar passivamente que as soluções venham de algum lugar. A mentalidade do maker é de ser ativo, de se juntar para encontrar soluções", afirma Gabriela Agustini, sócia-fundadora do Olabi, organização que busca democratizar a produção de tecnologia e criadora da plataforma.

Mas nem só equipamentos hospitalares vivem os Fab Labs na pandemia. Em Recife, o projeto Lava-Mão chama atenção de quem circula pelo Mercado de São José. Em estrutura pré-moldada de concreto, a pia foi criada pelo Fab Lab Recife como forma de contenção da disseminação do vírus. Instalada em julho, custou R$ 4.000 e conta com duas torneiras antifurto —uma delas mais baixa para crianças e cadeirantes.

"Estamos entrando em um modelo de sociedade em que a criação será cada vez mais global e a produção, local. A pia pode ser criada aqui, mas alguém em outro país pode baixá-la e produzi-la. A cultura do 'faça você mesmo' já era. A nova onda, que chegou com os makers, é 'façamos juntos'", diz Edgar Andrade, diretor-executivo do Fab Lab Recife e um dos principais ativistas do movimento maker no Brasil.

Algumas iniciativas globais da comunidade maker na pandemia podem ser encontradas no livro "Viral Design", organizado pelo Fab Lab Barcelona. Para Tomas Diez, diretor do projeto e sócio-fundador do Fab City Global, a cultura maker é a promessa do futuro.

"Nossa comunidade foi a primeira a responder à crise no início da pandemia. Assim, é fundamental perceber seu potencial para articular grandes questões da atualidade, como o desmatamento, as mudanças climáticas e o impacto da industrialização dos últimos 200 anos", diz o venezuelano radicado na Espanha.

Ele faz um apelo pela manutenção dos Fab Labs do mundo. "Na pandemia, esse espírito altruísta está tornando esses espaços insustentáveis do ponto de vista financeiro."

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