Coringa, Gaules e outros streamers contam como lucram com jogos na internet

'LoL', 'CS:GO', 'GTA' e 'Valorant' estão entre os games mais jogados pelos influenciadores

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Engana-se quem pensa que um bom influencer de games deve vencer todos os jogos. Nas transmissões ao vivo, as partidas são para a diversão do jogador e do seu público. O objetivo é, acima de tudo, entreter.

Para isso, vale desde conversar sobre a vida até assistir a filmes, vídeos ou jogos de outros influenciadores junto com sua comunidade.

Streamers nacionais estão entre os mais vistos do mundo. Segundo colocado no ranking mundial de 2021, Alexandre "Gaules", 38, é o mais popular do Brasil, com 165 milhões de horas assistidas na Twitch, plataforma de lives mais usada pelos jogadores.

Victor Augusto, o "Coringa", quinto mais visto no mundo, é o segundo do Brasil, com 100 milhões de horas, aponta a Streams Charts, que monitora plataformas de eSports.

A Folha conversou com seis influenciadores sobre comunidade digital, monetização e conteúdo. Todos têm nas transmissões sua atividade principal. Leia abaixo.

O streamer brasileiro Gaules
Alexandre Borba Chiqueta, o Gaules, foi o streamer brasileiro mais assistido na Twitch em 2021, ultrapassando 165 milhões de horas assistidas - Torin Zanette/Divulgação

'SEI QUE SOU REFERÊNCIA E TENTO PASSAR VALORES COMO RESPEITO E AMIZADE'

Alexandre Borba Chiqueta, ‘Gaules’, 38, São Paulo (SP), ex-jogador profissional, segundo streamer mais popular do mundo

Comecei a fazer streaming de jogos em 2018. Não tinha um público muito grande, eram duas, três, às vezes cinco pessoas assistindo, apesar dos meus 20 anos de experiência com jogos eletrônicos. Na infância, eu me lembro de jogar sempre com alguém.

Eu não estava em um momento bom financeiramente, então olhei as ferramentas que tinha: um computador com acesso à internet e uma webcam. Na época, fui diagnosticado com depressão, e as lives foram uma forma de contato com outras pessoas.

Além de jogar "Counter Strike" e outros jogos de tiro, eu compartilhava a minha rotina. Isso ajudou no tratamento, que durou cerca de dois anos.

Hoje, as transmissões ao vivo envolvem até esportes não eletrônicos como NBA, Fórmula 1, Stock Car e campeonatos de futebol. Gosto de proporcionar às pessoas acesso a eventos que eram mais segmentados.

Tenho consciência de ser uma referência e tento passar alguns valores para a tribo, como chamo meus seguidores. Destaco o respeito e a compreensão à diversidade cultural, e a amizade. Atualmente, existem famílias inteiras que me assistem da sala de casa, e me atento a isso.

Minha posição de relevância, hoje em dia, é fruto de um trabalho em equipe. Por trás das câmeras existe toda uma estrutura, não sou só eu como streamer. A empresa Gaules conta com mais de 30 funcionários e ainda faz parte do Grupo Omelete.

Isso ajuda na rotina das streams e abre frentes de monetização. Temos os modelos oferecidos pela própria plataforma, no meu caso a Twitch, onde conto com as inscrições pagas pelas pessoas, envio de moedas digitais e pagamento pelas horas assistidas.

Além disso, produzimos conteúdo patrocinado, sou embaixador de marcas e recebo para participar de eventos. Já lancei cartões de crédito personalizáveis com o Banco do Brasil, mouse pads em parceria com a Razer, pôsteres com a CCXP… Em junho, lancei uma coleção de roupas com a Nike que esgotou em poucos minutos. As peças variavam de R$170 a R$ 350.

'TINHA UMA MENINA GANHANDO DE HOMENS; QUERIAM SABER QUEM ERA'

Nicolle Merhy, ‘Cherrygumms’, 25, Rio de Janeiro (RJ), ex-jogadora profissional e CEO do time de eSports Black Dragons

Sou amante de jogos desde os 6 anos de idade. Meu pai, que era técnico de informática, me apresentou a esse mundo.

Em 2015, comecei a jogar "Tom Clancy's Rainbow Six Siege" com um grupo de amigos e me tornei jogadora profissional. Ao mesmo tempo, criei meu canal no Youtube para falar sobre games e compartilhar minha rotina como pro-player.

O público veio naturalmente: tinha uma menina jogando contra os homens e ganhando pela primeira vez! Acho que queriam saber quem era.

Ser influenciadora me ajudou a trazer visibilidade e capital para a empresa Black Dragons e-Sports, onde sou sócia-proprietária e CEO.

Com essas atribuições, entrei para a lista Under 30 da Forbes de 2019, na categoria Web e E-sports. Na época, eu já tinha deixado de jogar profissionalmente para me dedicar à empresa e à produção de conteúdo.

Hoje, tenho 76 mil seguidores na Twitch, onde faço lives jogando, assistindo a torneios e conversando com o público. Temos um contrato de exclusividade para os streams ao vivo. Também estou no Instagram, Twitter, TikTok e LinkedIn –acredito que ter um perfil profissional é importante na hora de negociar campanhas de publicidade ou patrocínio.

Sou embaixadora de marcas como Intel, Nike, Acer, O Boticário e Corsair. Meus ganhos variam de acordo com o tipo de trabalho, período de contrato e demandas da empresa, mas cada contrato costuma ter uma média de R$ 25 mil por mês.

O influenciadora digital de games Coringa
Victor Augusto é influenciador e produtor de conteúdo da Loud - Divulgação/ Loud

'O BURGER KING TEM UM LANCHE COM O MEU NOME E ISSO É MUITO LEGAL'

Victor Augusto, ‘Coringa’, 25, Belo Horizonte (MG), influenciador e produtor de conteúdo da organização de eSports Loud

No começo, era muito difícil explicar que dava para trabalhar na internet e converter isso em grana. Foi a vontade de provar que era possível morar em uma casa com amigos, jogando, e no final do dia dar orgulho para família que me motivou.

Fiquei conhecido por jogar "Free Fire". Em 2019, o Bruno PlayHard [fundador da equipe de esporte eletrônico Loud] me chamou para participar de campeonatos e criar conteúdo sobre games junto com uma galera.

A divulgação do time fez sucesso e decidimos criar uma game house. Todo mundo se mudou para São Paulo e fomos crescendo.

Hoje, tenho 3,4 milhões de seguidores na Twitch e quase 6 milhões no Youtube, fora as outras redes sociais. Crio conteúdo a partir de assuntos diferentes: faço transmissões assistindo a vídeos, jogando "GTA", "Counter Strike", "Valorant" e games engraçados, mas também estou na área de lifestyle, falando de roupa, de carro…

Para isso, conto com marcas parceiras como Itaú, Submarino, Fusion e Burger King. Eu frequento o fast food desde criança e hoje sou embaixador, tem um sanduíche com meu nome [o Rodeio Coringa]; isso é muito legal.

Além do meu contrato como influencer da Loud, tenho fontes de renda vindas da Twitch, por anúncios, inscrições pagas e uma porcentagem em cima das visualizações, além de contratos com marcas e patrocinadores.

Graças a Deus, tem uma galera de peso que me assiste diariamente. Isso faz com que a gente esteja presente nesse ranking mundial com números absurdos, embora eu ache que nem tudo é sobre isso.

Acredito que o principal ponto do meu trabalho é ser verdadeiro. Nem sempre jogo para fazer o melhor desempenho, muito menos para fazer uma coisa séria –estou ali para me divertir, para ver o lado em que a gente erra, perde, mas se diverte no final das contas. Essa espontaneidade faz com que se identifiquem comigo.

A influenciadora digital Liz
Elizabeth Sousa é player, streamer e influencer da Loud - Divulgação/ Loud

'NAS LIVES, ME DIVIRTO E NÃO CARREGO O PESO DE PRECISAR JOGAR BEM'

Elizabeth Souza, ‘Liz’, 22, Rio de Janeiro (RJ), ex-jogadora profissional de '"LoL" e influenciadora da organização de eSports Loud

Me tornar streamer foi a forma que encontrei para manter um equilíbrio entre a saúde mental e a paixão por jogos. Hoje, sou contratada como influencer pela Loud para produzir conteúdos sobre games para as redes sociais.

Faço streams pela Twitch, onde tenho 58 mil seguidores, jogando games como "Fortnite", "LoL", "Detroit", entre outros. Também crio conteúdo reagindo a vídeos, assistindo a filmes com meus seguidores, e interagindo pelo chat.

A stream me ajudou a fazer as coisas do dia sem me sentir sozinha, e a criar relações de amizade com as pessoas que me seguem. Comecei há um ano, quando passava por problemas de saúde como tendinite, estresse e ansiedade, que começaram justamente quando conquistei o sonho de me tornar jogadora profissional.

Comecei a jogar "League of Legends" em 2014, e queria muito trabalhar com games. Em 2017 passei a participar de campeonatos amadores. No cenário profissional ainda não tinha nenhuma menina.

Em 2020, entrei para times semi-profissionais treinando em casa. A gente ganhava cerca de R$ 500 para treinar, e eram poucos os que pagavam para meninas.

Foi nesse ano que tranquei a faculdade e começaram a entrar franquias no jogo. A Loud foi uma delas, e pouco depois me contratou como jungler [caçadora]. Me mudei para São Paulo, comecei a ter um bom salário e a jogar no competitivo. Em dois meses eu subi para a posição de titular e isso me desestabilizou.

A gente quer se esforçar porque são poucas as mulheres que conseguem, então tentamos mostrar que somos tão boas quanto os caras. Só que aí eu comecei a esquecer do resto, passei a treinar demais e deixei de cuidar de mim.

Meu desempenho estava caindo e conversei com o pessoal da Loud, que me ofereceu apoio psicológico, fisioterapia, e perguntou se eu gostaria de mudar meu contrato para produtora de conteúdo.

Hoje, eu estou me divertindo e tem pessoas se divertindo comigo, então eu consigo tirar o peso de precisar jogar bem. A intenção da live é trazer entretenimento para as pessoas.

O influenciador digital Mose
Moisés Alves Cesar, Mose, é streamer e influencer da FURIA - Divulgação/FURIA

'MINHA MÃE USAVA O VIDEOGAME PARA ME MANTER DENTRO DE CASA'

Moisés Alves, ‘Mose’, 25, Belford Roxo (RJ), streamer, produtor de conteúdo e influenciador da empresa de eSports FURIA

Eu cresci na periferia, criado pela minha mãe e meus irmãos. Como ela não gostava de ver a gente na rua, o videogame foi uma estratégia para manter a gente dentro de casa.

Depois do ensino médio, eu tentei cursar faculdade e fiz prova para concursos no Exército e na Marinha. Sem conseguir nada de imediato, comecei a trabalhar como garçom. Foi aí que consegui montar um computador e tive internet em casa pela primeira vez, já com 21 anos.

Decidi produzir conteúdo para a internet, ser Youtuber. Comecei com o "Freefire" –baixei um emulador no computador e fazia live para duas, às vezes cinco pessoas. Eu intercalava as transmissões de manhã e o trabalho de garçom à tarde e à noite.

Quando a pandemia explodiu e o comércio começou a fechar, fui demitido. Entreguei parte da rescisão para minha mãe e guardei o restante para investir no meu sonho. Esse momento foi o diferencial para mim, porque pude me dedicar às lives.

Entrei para o coletivo de pessoas pretas Wakanda Streamers na mesma época em que George Floyd foi assassinado. Houve uma comoção contra o racismo, e grandes personalidades começaram a se engajar.

Um dia, o Gaules entrou na minha transmissão e levou o público dele junto. Eu estava com uma meta de doação aberta para comprar melhorias para meu computador e ele doou todo o dinheiro de que eu precisava.

Eu não tinha outra reação, a não ser chorar. Foi um dos momentos mais felizes da minha carreira: eu estava acostumado a ter 10 pessoas me assistindo, e tinha 40 mil na minha live.

Hoje, tenho 15,4 mil seguidores na Twitch e sou influencer da FURIA, com quem tenho contrato para produzir conteúdo. Também me mudei para São Paulo. Além das streams, participo de eventos de marcas e patrocinadores.

 A influenciadora digital Gabs
Gabriela Freindorfer, Gabs, é ex-jogadora profissional de CSGO, streamer e criadora de conteúdo da FURIA - Divulgação/FURIA

'QUANDO COMECEI, O MERCADO AINDA NÃO VALORIZAVA AS MULHERES'

Gabriela Freindorfer, ‘Gabs’, 26, São Paulo (SP), ex-jogadora profissional de "CS:GO", é streamer e criadora de conteúdo da FURIA

Jogo desde os 6 anos de idade, mas os jogos se tornaram fonte de renda quando eu já tinha 20 anos. Eu cresci junto com o cenário de games –comecei ganhando R$ 300 por mês, e foi aumentando. Nessa época, eu ganhava para jogar e participar de campeonatos de "CS: GO".

O mercado, principalmente para as mulheres, ainda não era muito valorizado.

Entrei na FURIA como jogadora profissional do time feminino, e fomos ganhadoras invictas por muito tempo. Na pandemia, quando não tinha muitas competições e as coisas estavam um pouco paradas, eu me senti estagnada e decidi mudar.

Conversei com o time e anunciei minha aposentadoria em setembro de 2021. Desde então, sou streamer e produtora de conteúdo da empresa. Faço stream de jogos na Twitch, onde tenho mais de 105 mil seguidores. Jogo também "Valorant" e estou me preparando para entrar no "GTA".

Como "CS: GO" tem um público bastante masculino, isso se reflete em quem assiste as lives. Minha proposta agora é furar a bolha com jogos que atraiam o público feminino. Ainda pretendo me aventurar no TikTok e falar mais de estilo nas redes –sou apaixonada por tênis.

Atualmente, sou embaixadora da HyperX, marca de equipamentos para games. Faço anúncio de lançamentos, testo e divulgo produtos, avalio de acordo com meus gostos… Também participo de ações e eventos por intermédio da FURIA.

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