Descrição de chapéu internet alimentação

Donos de cafés e padarias divergem sobre oferecer wi-fi aos clientes

Equilibrar tempo de permanência e consumo é o maior desafio desses negócios

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São Paulo

Em janeiro, o vídeo de um dono de padaria em Barueri (SP) expulsando o cliente por ligar o computador sobre a mesa viralizou na internet e dividiu opiniões. Os comentários das postagens deixaram claro que o tema não é unanimidade.

Empreendedores como Gil Leite, 41, proprietário da padaria Le Jazz Boulangerie, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo, veem no wi-fi um chamariz para o público. Das 54 mesas do salão, 11 têm tomadas. Aberta das 7h30 às 22h, a casa tem ticket médio de R$ 78 e recebe até 400 pessoas por dia.

Homem está de pé, olhando para a foto, com uma xícara de café na mão. Uma mulher está sentada de lado para a foto, de frente de um notebook apoiado sobre a mesa
Gil Leite, sócio da Le Jazz Boulangerie, e Isadora Peruch, empreendedora e cliente da padaria - Lucas Seixas/Folhapress

Leite admite que a clientela plugada aumenta a conta de luz, já que boa parte aproveita para carregar computadores e celulares. Mas acredita que o retorno compensa. "O lugar fica simpático e atrai muita gente. Nunca pus na ponta do lápis, mas vejo que os benefícios são maiores do que o ônus", afirma.

Enquanto o tempo médio de permanência na padaria é de 35 minutos, quem vai até lá para trabalhar ocupa a mesa por até cinco horas, segundo Leite. O consumo, nesses casos, dificilmente aumenta na mesma proporção. Manter a equipe treinada para intervir no caso de abusos, ele diz, é fundamental para evitar prejuízo.

"Se o cara só pedir um café, a gente insiste, sugere que ele consuma mais itens, mas sem constrangimento. Os clientes precisam entender que é um espaço de consumo e, para que ele continue existindo, a gente precisa faturar."

A empresária Isadora Peruch, 32, vai à Le Jazz Boulangerie pelo menos uma vez por semana, para trabalhar sozinha ou fazer reuniões. Aproveita para lanchar e levar itens para casa. Em média, gasta R$ 60 a cada visita. "O cliente precisa ter bom senso, senão a conta não fecha", ela defende.

Sócia do Futuro Refeitório, no mesmo bairro, a chef Gabriela Barretto, 44, também projetou o ambiente para atrair trabalhadores com seus notebooks. Para ela, que mantém as portas abertas desde o café da manhã até a noite, é uma boa estratégia para que as mesas permaneçam ocupadas nos horários entre refeições.

"As pessoas acabam consumindo nos momentos em que a casa fica mais vazia", argumenta. A desvantagem, emenda, é quando chega o horário de rush e os clientes continuam firmes no lugar. "Nem todos têm o bom senso de ver que a casa está cheia e desocupar a mesa. Aí, a gente pede que eles se mudem para os sofás."

No time oposto estão empreendedores como Gabriel Penteado, 41, do Cupping Café, na Vila Madalena, zona oeste paulistana. Até a pandemia, a cafeteria liberava o wi-fi para a clientela. Na reabertura, deixou de oferecer a comodidade.

"A gente tinha dificuldade com alguns clientes, que ocupavam a mesa por muitas horas e consumiam pouco. Não conseguia o giro necessário para manter o negócio saudável."

Penteado admite que já perdeu fregueses por isso. "Já aconteceu de irem embora por não termos wi-fi, até indico estabelecimentos vizinhos. Mas isso nos ajudou a enxergar que os nossos clientes mesmo, aqueles que nos procuram pelos nossos produtos, continuaram vindo."

Entre as opções de liberar geral ou suspender o serviço, há modelos intermediários. Na Padoca do Maní, a concorrida padaria da chef Helena Rizzo, também em Pinheiros, é permitido conectar o wi-fi, mas com limite —independentemente do valor consumido, o cliente recebe um voucher que libera o acesso por 30 minutos.

Na opinião de Ivan Achcar, fundador da EGG (Escola de Gestão em Negócios da Gastronomia), estabelecer regras, como limite de horário ou consumação mínima, não fere o conceito da hospitalidade. "Não há serviço sem conceito e não há conceito sem regras. Mas elas precisam ser claras, descritas de forma ostensiva. O cliente escolhe se quer ficar ou não."

Segundo Achcar, a equipe deve ser treinada para agir em momentos tensos. "A casa deve estipular um protocolo, com discurso e até tom de voz ensaiado. Se o cliente insistir em desrespeitar a regra, é o caso de parar de servi-lo, jamais brigar. O prejuízo para a imagem pode ser muito maior."

Em vez de limitar a internet, a sócia da rede Botanikafé, Manuela Albuquerque, 32, fez diferente. Com três unidades em São Paulo, ela fez parceria com a Pluria, plataforma que conecta empresas adeptas do trabalho híbrido a espaços flexíveis de trabalho.

Dessa forma, garante que o cliente, ao ocupar a mesa, vai consumir também. "Funciona como um vale-refeição, a pessoa chega aqui com um valor fechado para gastar. Tem sido importante para o nosso movimento, especialmente nas unidades do Butantã e da Barra Funda, que ficam mais vazias nos intervalos das refeições."

Equilibrar o consumo com o tempo de ocupação das mesas é só um dos cuidados que os empreendedores devem tomar ao liberar o wi-fi para os fregueses.

Especializada em projetos do setor de alimentação, a arquiteta Claudia Novaes recomenda instalar um número extra de tomadas, o que não representa um grande investimento e proporciona conforto à clientela.

Providenciar revestimento acústico para o teto também é fundamental. "Sugiro um forro com NRC de, pelo menos, 65% [capacidade do material de absorver os sons]. Sem isso, o som reverbera, fazendo todo mundo falar muito alto, o que incomoda a todos, principalmente quem está trabalhando."

O advogado Danilo Pardi, especializado em crimes digitais, alerta para a importância de contratar uma rede wi-fi dedicada aos visitantes. "Se houver uma rede só, hackers podem acessar o servidor da empresa e infectá-lo com um malware [software malicioso] para roubo de dados", afirma.

Ele também recomenda exigir que os clientes façam login na rede, cadastrando nome e CPF. "Se alguém usar o wi-fi da padaria para cometer algo ilícito, o endereço de IP será o do estabelecimento, e a polícia vai chegar ao dono da padaria. Por isso, o registro é tão importante."

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