Mike Pompeo, novo secretário de Estado dos EUA, defende Trump com ardor

Ao contrário do ponderado Tillerson, ex-diretor da CIA deve endossar posições do presidente

O diretor da CIA, Mike Pompeo, ri durante uma das reuniões de um encontro sobre segurança nacional em Washington
O diretor da CIA, Mike Pompeo, ri durante uma das reuniões de um encontro sobre segurança nacional em Washington - Yuri Gripas - 19.out.2017/Reuters
David E. Sanger
The New York Times

A súbita demissão, na terça-feira (13), do secretário de Estado Rex Tillerson, ex-presidente-executivo Exxon Mobil que nunca conseguiu capturar o papel de chefe da diplomacia dos EUA, abre espaço para alguém que compartilha das ideias do presidente Donald Trump, cujo lema é "América em Primeiro Lugar", e que criticou severamente o acordo nuclear com o Irã.

Ele também é profundamente cético quanto à possibilidade de que negociações convençam a Coreia do Norte a abandonar seu arsenal nuclear.

O homem apontado como sucessor de Tillerson é o diretor da Agência Central de Inteligência (CIA), Mike Pompeo, e esteve entre os mais severos críticos do acordo nuclear entre as potências mundiais e o Irã em 2015.

Se confirmado no posto, Pompeo assumiria o Departamento de Estado no exato momento em que o presidente está considerando abandonar o acordo —mesmo que isso cause indignação entre os aliados europeus dos Estados Unidos.

A indicação também colocaria Pompeo, que esteve imerso nos detalhes quanto ao programa nuclear de Pyongyang, em papel central na condução das negociações com o ditador norte-coreano Kim Jong-un, com quem Trump anunciou que se reunirá em maio.

Apesar de todas as críticas a Tillerson —e elas eram muitas, especialmente dentro do Departamento de Estado, cujos quadros o secretário vinha  reduzindo—, ele era visto como influência moderadora sobre Trump. Já Pompeo vem sendo um ardoroso defensor das políticas do presidente, ao ponto de gerar preocupações entre muitos atuais e antigos dirigentes da CIA, que consideram que ele talvez seja politizado demais para o posto.

Em suas declarações públicas —entre as quais a dúbia afirmação, no domingo, de que Trump fez mais para conter a Coreia do Norte do que qualquer presidente—, Pompeo parecia estar ciente de que em breve deixaria a função de apresentar ao presidente seu briefing diário de inteligência, e passaria a colocar em prática em todo o mundo a agressiva postura de "América Primeiro" adotada por Trump.

"Tivemos uma ótima química desde o começo", disse Trump a repórteres na Casa Branca, na manhã da terça-feira, ao descrever seu relacionamento com Pompeo.

É essencial que exista química entre o presidente e seu principal negociador diplomático. Mas a mudança vai perturbar o delicado equilíbrio de poder na equipe de segurança nacional do governo.

FREIOS

Tillerson e o secretário da Defesa, James Mattis, se revezavam para manter o presidente sob controle, e chegavam à Casa Branca com posições previamente acordadas quanto a políticas para o Oriente Médio, o leste da Ásia e tudo mais, quando se reuniam com o presidente.

Por quase um ano, isso dificultou que Trump contrariasse as posições dos dois, que muitas vezes também se alinhavam às de H. R. McMaster, o assessor de segurança nacional da Casa Branca.

Um importante funcionário do governo que assistiu a muitas dessas reuniões, descreveu na semana passada a crescente frustração de Trump ao se ver contrariado pelos dois principais membros de sua equipe de segurança nacional.

Isso parece ser especialmente verdade quanto ao Irã, e Trump destacou o assunto na terça-feira, enquanto se preparava para uma viagem à Califórnia. Ele disse que Tillerson e ele "discordavam quanto a algumas coisas".

"Por exemplo, o acordo com o Irã —para mim, é horrível. Acho para ele era OK", o presidente disse, se referindo a Tillerson. "Eu queria quebrar o acordo, ou fazer alguma coisa. E a opinião dele era um pouco diferente".

Os comentários do presidente certamente alarmarão os aliados europeus dos EUA, que passaram os últimos dias negociando com o assessor mais próximo de Tillerson, Brian Hook, sobre uma forma de expandir o acordo que limitou o programa nuclear do Irã, em lugar de reabrir as negociações ou cancelá-lo.

As conversações tinham por objetivo impedir que Trump abandonasse o acordo na metade de maio, quando ele precisa decidir se vai manter suspensas as sanções que os Estados Unidos tinham em vigor contra o Irã por seu programa nuclear.

PREVISIBILIDADE

A ascensão de Pompeo resolverá um dos problemas centrais da diplomacia dos Estados Unidos nos últimos 12 meses: quando ele falava, pouca gente confiava em que estivesse expressando a visão do presidente.

"Isso abre possibilidades, porque alguém que conhece as questões e tem um relacionamento confortável com o presidente agora estará na cadeira", disse Richard Haass, que serviu a diversos presidentes democratas e republicanos em posições importantes do Departamento de Estado e do Conselho de Segurança Nacional.

Haass acrescentou que os interlocutores dos Estados Unidos agora acreditarão que o secretário de Estado "fala com o poder e o apoio do presidente".

"A questão é determinar, quando o presidente Trump fala, se parece que ele consultou seu secretário de Estado", disse Haass, agora presidente do Conselho de Relações Exteriores norte-americano, em um telefonema da Índia.

A única arena em que as posições de Pompeo ainda são um mistério é a Rússia. Quando foi deputado federal, ele criticava o presidente Vladimir Putin. Como diretor da CIA, Pompeo disse acreditar nas avaliações dos serviços de informações de que Putin comandou o esforço russo para influenciar a eleição norte-americana de 2016 - ainda que Trump as tenha descartado completamente, por medo de que comprometessem a legitimidade de sua eleição.

Mas Pompeo não chegou a descrever o que achava que os Estados Unidos deveriam fazer para combater as ações russas.

Talvez a maior incógnita quanto à indicação de Pompeo seja como isso afetará as negociações com a Coreia do Norte.

Ele já alertou diversas vezes, desde a metade do ano passado, de que Kim está "a alguns meses" de adquirir a capacidade de atacar os Estados Unidos com uma arma nuclear. Isso se baseia em um cálculo de quanto tempo os norte-coreanos demorarão para projetar uma ogiva capaz de sobreviver à reentrada de um míssil intercontinental na atmosfera.

Mas Pompeo também está no comando de uma campanha clandestina ativa contra a Coreia do Norte, à qual aludiu elipticamente em diversas ocasiões. A questão agora é se essa campanha clandestina —que ao que se sabe inclui sabotagem da cadeia de suprimentos norte-coreana e ataques cibernéticos renovados contra os programas nucleares e de mísseis de Pyongyang— criará tempo e dará força suficiente a Trump para fazer com que as negociações funcionem.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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