A estratégia do governo Emmanuel Macron era clara: reduzir o fenômeno dos “coletes amarelos” a uma mutação efêmera e oportunista da extrema-direita.
Um dos seus mais jovens e influentes ministros, Gérald Darmanin, chegou a referir-se ao movimento como uma “peste marrom”, expressão usada para associar o nazismo a uma doença durante a Segunda Guerra Mundial.
A regularidade dos protestos e a escalada da violência obrigou o governo a fazer concessões. Depois de semanas de mutismo, Macron abriu uma rodada de conversas com as lideranças dos partidos políticos e representantes dos “coletes amarelos”.
Em caso de fracasso, a oposição na Assembleia Nacional ameaça apresentar uma moção de censura contra o governo condenando a sua gestão calamitosa da crise.
O movimento surgiu em finais de outubro em reação a um novo imposto sobre o carbono para lutar contra o aquecimento global.
Pilar da política econômica de Macron, a transição energética passou a simbolizar o abismo entre as prioridades das elites e da “França real”. “Enquanto eles se preocupam com o fim do mundo, nós nos preocupamos com o final do mês”, explicou, em tom de comício, um manifestante à imprensa francesa.
Popular e estruturado de forma totalmente autônoma —o governo tem enfrentado dificuldades para dialogar com os manifestantes devido à ausência de lideres legítimos—, o movimento impressiona por romper com a dinâmica tradicional de protestos centralizados e urbanos da França contemporânea.
Ele promove um regresso ao tempo das “jacqueries” —revoltas camponesas da era revolucionária nas regiões periurbanas e rurais.
Os “coletes amarelos” forçaram definitivamente o regresso à terra do autointitulado “Jupiteriano” Macron.
Ele passou de presidente altivo e sóbrio a um tipinho da banca de investimento arrogante e distante.
O seu partido República Em Marcha foi de rolo compressor parlamentar a grupo heteróclita e diletante. E sua equipe ministerial de nova geração de supertecnocratas a políticos amadores ultrapassados pelos acontecimentos.
Está claro que o modo de fazer política de Macron baseado na instauração de uma relação direta entre o Executivo e a sociedade fracassou redondamente na sua primeira grande prova.
O governo que optou por dispensar os intermediários —partidos tradicionais, sindicatos, movimentos sociais— parece incapaz de dialogar com a sociedade e antecipar a dinâmica dos protestos.
Recentemente, Paulo Guedes declarou que o Brasil está preso na “armadilha social-democrata”. Esperemos que ele esteja atento para a armadilha da política sem intermediários.
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