Descrição de chapéu The Washington Post Venezuela

Corpo diplomático da Venezuela enfrenta briga de foice por acesso a embaixadas

Aliados de Guaidó e de Maduro disputam para ver quem tem o controle das missões diplomáticas

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Placa colocada por ativistas diz que embaixada venezuelana em Washington pertence ao "governo eleito" do país, em referência a Nicolás Maduro
Placa colocada por ativistas diz que embaixada venezuelana em Washington pertence ao "governo eleito" do país, em referência a Nicolás Maduro - Andrew Caballero-Reynolds - 19.abr.19/AFP
Anthony Faiola Marissa J. Lang
Washington | The Washington Post

Um cartaz de protesto colado à janela de um prédio de quatro andares em Georgetown de frente para a rua anuncia: “Esta embaixada pertence ao governo eleito da Venezuela”.

Mas exatamente qual governo é esse?

Nicolás Maduro e Juan Guaidó –os dois homens que reivindicam a Presidência da Venezuela— agora estão engajados numa disputa pelo controle das representações diplomáticas venezuelanas no mundo.

De Washington a Berlim, de Viena à Cidade do Panamá, formou-se um cabo de guerra internacional entre serviços diplomáticos rivais, no qual ambos se declaram os legítimos donos dos consulados e embaixadas da Venezuela e do credenciamento e acesso de diplomatas.

Enquanto disputam influência e imóveis, ambos estão reunindo aliados e encontrando inimigos.

Mesmo em Washington, onde a administração Trump se uniu a quase 60 outros países para declarar apoio a Guaidó, Maduro ainda tem aliados. Nas últimas semanas, quando os últimos diplomatas de Maduro se preparavam para deixar a sede da embaixada venezuelana, quase uma dúzia de manifestantes americanos ocupou o imóvel, prometendo impedir representantes de Guaidó de se instalarem no local.

Para entrar e sair do edifício, ativistas de diversas organizações de esquerda estão usando cartões que lhes foram dados pelos membros da equipe diplomática pró-Maduro. Medea Benjamin, co-fundadora do grupo de mulheres antiguerra Code Pink, se uniu a outros ativistas para bloquear o saguão da embaixada com bandeiras venezuelanas e retratos presidenciais de Nicolás Maduro e seu predecessor, o ícone socialista Hugo Chávez.

“Se alguém quiser entrar por aqui, vai dar de cara com retratos de Maduro e Chávez”, falou Benjamin na terça-feira. “Achamos que seria apropriado.”

Juan Guaidó, o líder oposicionista que em janeiro se declarou presidente interino, foi reconhecido como tal não apenas pelos Estados Unidos e outros países, mas também por organismos internacionais que incluem a Organização dos Estados Americanos.

Maduro, que se declarou vitorioso no ano passado em eleições amplamente vistas como tendo sido fraudulentas, ainda é reconhecido pela Rússia, a China, Cuba e as Nações Unidas.

Mesmo em muitos países que reconheceram a liderança de Guaidó, os “embaixadores” do presidente interino se veem envolvidos numa espécie de dança diplomática bizarra.

Atuando mais como lobistas que como emissários, eles são essencialmente diplomatas voluntários: pagam por suas próprias viagens, hospedam-se em casas de parentes e às vezes obtêm de governos estrangeiros apenas pseudo-títulos que não chegam a representar um status diplomático pleno. Em muitos casos, estão presentes nas mesmas capitais que emissários de Maduro.

“É uma situação estranha, sem dúvida alguma”, comentou William Dávila Valeri, emissário de Guaidó na Áustria. Duas vezes por mês ele viaja de sua casa em Madri para Viena, pagando sua própria passagem de classe econômica, para cumprir seus deveres diplomáticos na capital austríaca.

Hospeda-se na casa de um primo enquanto faz lobby junto aos austríacos para que adotem uma postura mais intransigente contra Maduro, a quem a oposição atribui a crise humanitária crescente que deixou milhões de venezuelanos passando fome.

Viena reconheceu Guaidó como presidente. Mas, como a maioria dos países europeus, não destituiu as credenciais dos diplomatas de Maduro, com isso criando um limbo diplomático esdrúxulo.

“O embaixador de Maduro ainda está presente, como um Darth Vader da revolução”, disse Valeri. “Mas eu tenho acesso ao governo e à imprensa, o que é importante.”

Telefonemas ao Ministério das Comunicações venezuelano e à missão das Nações Unidas em Nova York não foram retornados.

Fabíola Zavarce, a representante de Guaidó no Panamá, chegou cedo a um fórum de países regionais na capital panamenha este mês para fazer um discurso.

Ela contou que estava tomando um café quando uma equipe de funcionários pró-Maduro chegou ao local. Disseram que o ex-embaixador venezuelano no Panamá estava chegando e que ela deveria partir, apesar de o governo panamenho ter destituído o ex-embaixador de seu status diplomático.

“Eles chegaram com comportamento hostil”, disse Zavarce. Para evitar problemas, ela deixou o recinto em um protesto ao qual se uniram mais tarde os representantes de outros países, incluindo Colômbia e Peru. Então o encontro inteiro foi cancelado.

O Panamá reconheceu Zavarce como a embaixadora da Venezuela e destituiu funcionários seniores nomeados por Maduro de seu status diplomático. Mesmo assim, a embaixada venezuelana continua sob controle do governo de Maduro.

Para garantir que serviços consulares continuem a ser prestados às dezenas de milhares de venezuelanos residentes no Panamá, Zavarce disse que vem procurando agir cautelosamente com os representantes do governo de Maduro que permanecem no país.

“Isso faz parte dos desafios que enfrentamos para representar o presidente Guaidó”, ela comentou.

O Canadá reconheceu Orlando Viera como embaixador no início de fevereiro. Mas os consulados da Venezuela em Toronto, Montreal e Vancouver e a representação consular em Ottawa ainda são comandados por representantes de Maduro.

“O fato de ser credenciado me possibilita encontrar regularmente com representantes do Ministério do Exterior, trocar comunicações sobre a emergência humanitária na Venezuela e pedir tratamento especial a venezuelanos residentes no Canadá, que hoje têm problemas frequentes com seus passaportes devido à ineficiência com que os consulados estão funcionando”, disse Viera. “Mas os representantes de Maduro ainda controlam todas as informações. E não queremos provocar um enfrentamento com eles.”

Viera trabalha em sua casa em Montreal e, quando tem reuniões em outras cidades, paga por seus próprios deslocamentos. Ele opera com uma equipe de 30 voluntários.

“Nenhum de nós está recebendo salário”, ele disse. “Não há orçamento para isso. Pagamos tudo de nossos próprios bolsos.”

Viera disse que há semanas sua equipe vem sendo confrontada por manifestantes pró-Maduro brandindo cartazes dizendo “tirem as mãos da Venezuela”. Ele culpa os funcionários pró-Maduro na embaixada.

Protestos semelhantes vêm ocorrendo também na Europa.

Na Alemanha, o representante de Guaidó no país, Otto Gebauer, disse que estava chegando a uma reunião com venezuelanos residentes em Hamburgo quando foi confrontado por 16 pessoas que carregavam cartazes e que, aos gritos, chamaram sua equipe de bando de “fantoches dos Estados Unidos” e “golpistas”.

“Houve insultos, mas não houve violência, porque havia polícia presente”, disse Gebauer.

Em Washington, Medea Benjamin, a ativista, se descreveu como “antiguerra”, não como “pró-Maduro”. Ela disse que sua organização havia procurado os funcionários da embaixada para ocupar o imóvel, e não vice-versa.

Quatro diplomatas venezuelanos pró-Maduro ainda remanescentes na embaixada perderam seu status quando a OEA reconheceu o enviado de Guaidó este mês.

O Departamento de Estado dos EUA deu a eles o prazo de duas semanas para deixarem a embaixada. O prazo termina esta quarta-feira (25). Dois outros funcionários do governo Maduro que têm cidadania dupla, venezuelana e americana, permanecem na embaixada. Eles se negaram a falar com um jornalista. Não ficou claro se vão continuar a trabalhar na embaixada depois que os diplomatas partirem.

Os representantes de Guaidó nos EUA já assumiram controle de três edifícios no país pertencentes ao governo venezuelano –dois prédios em Washington ligados ao adido militar e o imóvel do consulado venezuelano em Nova York—, depois que os diplomatas ligados a essas missões passaram do lado de Maduro para o da oposição.

Medea Benjamin disse que os manifestantes em Washington querem evitar que a mesma coisa ocorra no grande complexo da embaixada em Georgetown.

“Sei que os venezuelanos estão em crise e que há muitas coisas que o governo (de Maduro) fez de errado”, ela disse. “Mas sei também que o caminho que estamos percorrendo vai levar ao derramamento de sangue, possivelmente a uma guerra civil e décadas de violência.

“Estamos aqui para dizer ‘não agravemos uma situação que já é ruim’.”

Tradução de Clara Allain

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