Descrição de chapéu The Washington Post

Baixa participação na eleição pode deixar governo do Afeganistão ainda mais enfraquecido

Ameaças do Taleban e necessidade de tirar foto afastaram eleitores das urnas

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Cabul | The Washington Post

A participação dos eleitores na eleição presidencial do Afeganistão no fim de semana não chegou à metade do que foi visto na eleição presidencial passada, estimaram autoridades no domingo (30), fato que ameaça enfraquecer o próximo governo, seja quem for declarado vencedor.

Com pouco mais de metade dos votos contabilizados, a Comissão Eleitoral Independente afegã estimou que apenas 2,2 milhões dos 9 milhões de eleitores cadastrados foram às urnas no sábado, a quarta eleição realizada no país. A última eleição presidencial aconteceu em 2014.

Funcionárias fazem contagem manual de votos em Cabul - Rahmatullah Alizadah - 29.set.19/Xinhua

“O comparecimento de eleitores às urnas foi a mais baixa dos últimos 18 anos”, disse Sughra Saadat, da entidade independente Fundação por Eleições Transparentes no Afeganistão. “Foi pequena até mesmo em áreas seguras, onde mais pessoas votaram no passado.”

Preocupações de segurança, medo de fraudes e irregularidades na votação desencorajaram os eleitores de sair para votar, disseram monitores eleitorais.

Os dois candidatos principais foram o presidente Ashraf Ghani, candidato à reeleição, e o primeiro-ministro Abdullah Abdullah.

“O baixo comparecimento às urnas chama a atenção para os dois maiores desafios que assombram o país há anos: a ameaça constante de violência e a falta de confiança pública nos líderes políticos”, comentou o pesquisador Michael Kugelman, do Wilson Center.

Segundo Saadat, a participação foi ainda menor entre as mulheres. Ela atribuiu a baixa participação feminina nas eleições em parte à nova exigência de que todos os eleitores sejam fotografados nos locais de voto.

Em algumas áreas rurais conservadoras, mulheres e seus familiares homens fizeram objeção à exigência, que segundo as autoridades foi adotada para impedir fraudes.

Os costumes tribais e religiosos nessas áreas, especialmente entre a etnia pashto, não permitem que as mulheres se mostrem a homens que não sejam seus parentes ou ao público.

As mulheres só podem sair de casa usando burca que cubra o rosto por inteiro.

“Com base em nossas descobertas preliminares, as mulheres não representaram mais de 20% dos eleitores, sendo que na eleição de 2014 chegaram a 38%”, disse Saadat.

Scott Worden, diretor de Programas do Afeganistão e Ásia Central no United States Institute of Peace, disse: “Embora o dia não tenha sido tão violento quanto se temia e tenha havido poucas baixas, o Taleban conseguiu reprimir a votação com ameaças, restringindo o acesso de eleitores às urnas”.

Cinco pessoas morreram e 76 ficaram feridas no sábado em ataques em todo o país, segundo o Ministério da Defesa.

Worden descreveu a baixa participação de eleitores como “uma faca de dois gumes”.

Por um lado, explicou, “significa que apenas um pequeno número de afegãos ajudará a decidir quem será o próximo presidente”, mas, por outro, “não houve a oportunidade enorme para fraudes” que prejudicou eleições anteriores no país.

“O resultado final será menor, mas potencialmente mais legítimo”, opinou.

A prioridade do vencedor será fechar um acordo de paz com o Taleban –mas a baixa participação popular nas eleição pode enfraquecer a reivindicação do próximo presidente de ocupar um lugar na mesa de negociações.

Ghani enfrentou pressões para adiar a eleição enquanto o Taleban e os EUA negociassem um acordo.

Ele resistiu, dizendo que a eleição era necessária para autorizar o governo a negociar diretamente com o Taleban, que há anos minimiza a importância do governo de Cabul, dizendo que seus integrantes não passam de fantoches dos EUA.

As discussões entre EUA e Taleban caíram por terra este mês. O Taleban não indicou se estará disposto a negociar com o próximo governo afegão.

“Supondo que não haja queixas plausíveis de fraude e que um vencedor claro seja identificado no primeiro ou segundo turno, seria bom que o novo presidente entendesse que sua autoridade é parcial”, observou a pesquisadora Kate Clark, da Afghan Analysts Network.

Ela disse que muitos afegãos não foram votar por viver em áreas controladas pelo Taleban ou porque são apáticos em relação aos candidatos.

A diretora da Comissão Eleitoral Independente afegã, Hawa Alam Nuristani, disse que o pleito do sábado “foi a eleição mais sadia e mais justa, comparada às anteriores”.

Desde a restauração do governo civil, em 2001, o país já teve quatro eleições presidenciais e duas eleições legislativas.

Com a votação concluída, muitos agora temem um período prolongado de disputas políticas. Após a eleição presidencial de 2014, em que Ghani e Abdullah foram os dois candidatos principais, o país mergulhou numa crise política que se prolongou por meses, movida por acusações de fraude eleitoral.

Um relatório da União Europeia mais tarde levantou a possibilidade de fraude em cerca de um quarto dos votos naquela eleição.

Abdullah disse ao Washington Post que seus partidários não vão se dispor a sacrificar a vitória desta vez e que se o resultado for afetado por fraudes, será contestado.

Um candidato presidencial precisa de mais de 50% dos votos para vencer. Se nenhum candidato chegar a esse patamar, haverá um segundo turno em até duas semanas após a divulgação dos resultados oficiais.

Tradução de Clara Allain

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