A autoproclamada presidente interina da Bolívia, Jeanine Añez, enviou nesta quarta-feira (20) ao Congresso um projeto de lei para convocar eleições gerais, um mês depois da realização do pleito que marcou o início de manifestações violentas que já deixaram 32 mortos no país.
Em entrevista coletiva, Añez afirmou que a proposta pode ser aperfeiçoada, mas que o documento pode ser considerado uma base para gerar consenso nacional.
O ministro da Justiça, Álvaro Coimbra, explicou que o desejo do atual Executivo boliviano é a aprovação da lei pelo Parlamento o mais rapidamente possível, para assim eleger novas autoridades do Tribunal Supremo Eleitoral dentro de um prazo máximo de 15 dias.
São essas autoridades que definirão a data das eleições gerais para escolher um novo presidente e vice, além de renovar ao todo 130 deputados e 36 senadores.
A regra proposta serviria também para declarar a nulidade das eleições de 20 de outubro, na qual o ex-presidente Evo Morales venceu após um processo controverso de contagem de votos.
O envio do projeto de lei ocorre oito dias após Añez ter se declarado líder do país a partir de uma interpretação controversa da Constituição, ocupando um vácuo de poder provocado pelas renúncias conjuntas de Evo, do vice-presidente e dos chefes do Senado e da Câmara.
O agora ex-presidente deixou o cargo em 10 de novembro, sob pressão de manifestantes, grupos civis e Forças Armadas, o que gerou denúncias de um golpe de Estado.
Outro fator que contribuiu para a queda foi uma auditoria internacional realizada pela OEA (Organização dos Estados Americanos), que afirma ter encontrado sérias irregularidades na contagem dos votos do pleito, o que colocou em dúvida a vitória declarada de Evo.
Desde então, um governo interino conduzido pela ex-senadora conservadora Jeanine Añez tem atuado para reprimir os protestos muitas vezes violentos e abalado a política interna e externa do país, com mudanças bruscas em relação à gestão de Evo, primeiro presidente indígena da Bolívia.
Na manhã desta quarta, Añez afirmou em um comunicado que apresentaria um projeto de lei para convocar novas eleições "como todo o país está exigindo" e que isso aconteceria por meio de canais constitucionais legais, a menos que os legisladores o bloqueassem.
"Desenvolvemos um projeto de lei básico. Provavelmente pode ser corrigido, acordado e enriquecido por todos os setores envolvidos com o objetivo de pacificar o país e escolher nossos governantes", afirmou. "Mas haverá eleições no país, nós garantimos."
Carlos Mesa, candidato que disputou as últimas eleições com Evo, já disse que voltará a concorrer no próximo pleito e afirmou que, se o Parlamento, controlado pelo MAS, partido do ex-presidente, postergar a apreciação do projeto de lei, Añez deveria emitir um decreto presidencial para convocar um plebiscito.
Também nesta quarta-feira (20), o Conselho Permanente da OEA aprovou uma resolução proposta pelas delegações do Brasil e da Colômbia —com o apoio de outros 24 dos 34 países-membro— que pede a convocação urgente de eleições, com o estabelecimento de um calendário eleitoral claro e apoio técnico da organização para garantir o avanço do processo.
"Conclamar as autoridades bolivianas a que convoquem eleições urgentemente, em conformidade com o mandato constitucional e legal da Bolívia, adotando prontamente um calendário eleitoral que dê certeza ao povo boliviano sobre um processo eleitoral com todas as garantias democráticas", afirma o documento.
Os Estados afirmam ainda que é preciso garantir o fim imediato dos protestos violentos e que as autoridades bolivianas protejam os direitos humanos no país.
Votaram contra a resolução México, Nicarágua e São Vicente e Granadinas. Os dois primeiros já haviam travado uma discussão no plenário da OEA na semana passada sobre a renúncia de Evo Morales estar ou não condicionada a um golpe de Estado. Eles avaliam que sim, enquanto Brasil e EUA, por exemplo, rechaçam a tese.
Abstiveram-se na sessão desta quarta Barbados, Suriname, Trinidad e Tobago e Uruguai.
Os conflitos na região de Cochabamba e na cidade de El Alto atingiram a Bolívia na última semana desde a partida de Evo, hoje asilado no México, com o bloqueio de uma usina de gás na terça-feira, deixando ao menos oito pessoas mortas.
Isso elevou o número total de mortes nos distúrbios pós-eleitorais para 32, segundo a Procuradoria-Geral do país.
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