Auschwitz celebra 75 anos de sua liberação com dúvidas a esclarecer

Participação de empresas e atuação de governos e da Igreja Católica seguem sob escrutínio

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São Paulo

Soldados soviéticos entraram no campo de concentração de Auschwitz em 27 de janeiro de 1945. Encontraram ali prisioneiros em condições precárias, sem forças para andar. Além de resgatá-los, os militares levaram também caixas de documentos do campo. 

Assim, pastas com fichas de prisioneiros, chamadas de "livros da morte", foram preservadas, mas o conteúdo delas só seria revelado em 1991, após o fim da União Soviética.

A busca por novas informações sobre o Holocausto foi constante ao longo das últimas sete décadas. Nesta segunda (27), celebra-se o aniversário de 75 anos da liberação de Auschwitz, complexo onde mais de 1 milhão de pessoas foram mortas, centenas de milhares foram condenadas a trabalhos forçados e que se tornou símbolo da luta para evitar novos genocídios. 

A existência dos campos de concentração para judeus já era citada pela imprensa americana e britânica a partir de 1942, mas, em meio ao noticiário da Segunda Guerra, com suas batalhas diárias em várias frentes, o assunto aparecia de modo lateral. 

A partir de 1944, conforme os Aliados avançavam em direção a Berlim, os campos de concentração foram descobertos pelo caminho. Os soldados encontram pilhas de corpos queimados, valas comuns e prisioneiros muito doentes. 

No entanto, relatos e imagens feitas pelos correspondentes de guerra sofreram controle por parte dos governos. Na França, por exemplo, autoridades não queriam alarmar as famílias sobre o destino dos parentes enviados a combates.

Ex-prisioneiro de Auschwitz, à esq., atravessa portão de entrada do campo de concentração em Oswiecim com a inscrição ‘o trabalho liberta’
Ex-prisioneiro de Auschwitz, à esq., atravessa portão de entrada do campo de concentração em Oswiecim com a inscrição ‘o trabalho liberta’ - Wojtek Radwanski/AFP

Essa postura mudaria radicalmente a partir de 12 de abril de 1945. Naquele dia, o general americano Dwight Eisenhower, comandante dos Aliados na Europa, visitou o então recém liberado campo de Ohrdruf, na Alemanha. 

Ali, Eisenhower ficou chocado ao ver pilhas de corpos com tiros na cabeça, entre outras cenas fortes, e decide retirar todas as restrições à divulgação dos fatos. Além disso, convida congressistas e jornalistas a visitar os campos.

Houve então uma apuração detalhada, com registros em fotos e filmes, que seria usada nos julgamentos de Nuremberg. Os depoimentos durante as audiências, realizadas a partir do final de 1945, trouxeram novos detalhes sobre as atrocidades. Na época, livros com relatos de prisioneiros começaram a ser lançados.

Depois de Nuremberg, foi criado o conceito de crimes contra a humanidade, como saída para uma questão: muitos oficiais nazistas tentaram se defender dizendo que apenas seguiam ordens. A mudança na lei internacional passou a permitir a responsabilização dos executores de extermínios em massa, sem subterfúgios.

Nos anos 1960, houve um novo julgamento de nazistas, e novos fatos. A partir de 1970, historiadores israelenses buscam mudar a forma como se registra a memória do que ocorreu.

"Passou-se a valorizar mais as histórias individuais, em vez de citar os grandes números. No lugar de mostrar uma pilha de sapatos, conta-se a história de um par e de quem foi seu dono", explica Carlos Reiss, coordenador-geral do Museu do Holocausto de Curitiba.

 

Nas últimas décadas, conforme o prazo de sigilo de documentos oficiais de vários países expirava, historiadores vão desvendando como várias nações e instituições se comportaram em relação ao Holocausto.

"Por que os Aliados não bombardearam os campos ou ao menos as linhas por onde os trens levavam os prisioneiros?", questiona Fernando Lottenberg, presidente da Conib (Confederação Israelita do Brasil). 

"Falta saber mais também sobre o papel das indústrias alemãs, que forneciam gás para as câmaras, por exemplo".

"Ainda há muito a entender sobre qual foi o envolvimento de outros países, como os da América Latina, que foram colaboracionistas", conta Maria Luiza Tucci Carneiro, professora da USP e coordenadora do projeto Arqshoah, que reúne documentos e depoimentos relacionados ao Holocausto.

Ela conta que comunicações reveladas em 1995 mostraram que diplomatas brasileiros que serviam na Alemanha e na Polônia durante a Segunda Guerra alertaram o Itamaraty sobre os riscos corridos pelos judeus, já a partir de 1942. 

Carneiro explica que, além dos arquivos estatais, há muitos materiais nas casas de sobreviventes e seus familiares ainda a serem analisados. 

"Uma carta, uma foto pode nos ajudar a entender a postura dos governos à época." Para ela, a liberação de arquivos secretos do Vaticano sobre o período, em fevereiro, pode ajudar a esclarecer como o papa Pio 12 e a igreja Católica lidaram com a questão. 

Holanda pede perdão às vítimas do Holocausto

O premiê holandês, Mark Rutte, pediu desculpas neste domingo (26) em nome do governo pela perseguição a judeus na Holanda durante a Segunda Guerra. “Enquanto os últimos sobreviventes ainda estão conosco, peço desculpas em nome do governo pelas ações das autoridades à época”, declarou ele diante da comunidade judaica, figuras políticas e sobreviventes. 

É a primeira vez que o governo se desculpa pela perseguição a judeus na Holanda e pela deportação em massa para campos da morte. Dos 140 mil judeus no país, 102 mil foram mortos. “Faço isso sabendo que é impossível colocar palavras em algo tão grande e horrível quanto o Holocausto”, disse o premiê, usando uma kipá azul.

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