Manifestantes desafiam proibição e protestam contra China em Hong Kong

Vigília em memória do Massacre da Praça da Paz Celestial havia sido vetada pelo governo pró-Pequim

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São Paulo

Em um grande desafio ao governo de Pequim, milhares de manifestantes foram às ruas de Hong Kong para fazer uma vigília proibida em memória dos mortos no Massacre da Praça da Paz Celestial. Houve confronto com a polícia.

Em 4 de junho de 1989, a ditadura comunista matou centenas de estudantes que pediam mais democracia no ponto central da capital chinesa, o mais notório ato de repressão do regime que se abria para o mundo por meio da economia.

Manifestantes no parque Victoria, em Hong Kong, lembram o Massacre da Praça da Paz Celestial
Manifestantes no parque Victoria, em Hong Kong, em 4 de junho, no ato que lembrou o Massacre da Praça da Paz Celestial - Tyrone Siu/Reuters

Desde então, a data é lembrada com um evento no parque Victoria, na elegante área de Causeway Bay, em Hong Kong. Desde 1997, a antiga colônia britânica voltou ao controle chinês, mas com um sistema que permite um grau de liberdade política inaudito no resto do país, além de adotar capitalismo desregulado.

A vigília deste ano havia sido proibida pela executiva-chefe do território, Carrie Lam, sob a alegação de riscos envolvendo a Covid-19, que foi bastante controlada em Hong Kong.

Mas o motivo real é outro: a nova lei de segurança de Hong Kong, aprovada na semana passada em Pequim.

Ela visa coibir as manifestações que tomaram as ruas do território desde o ano passado, em princípio contra uma lei facilitando extradição de locais para a China e depois tornando-se um movimento amplo pró-democracia.

Como definiu o deputado Eddie Chu, um dos líderes da oposição no Conselho Legislativo, a lei visa "matar Hong Kong". Ele foi um dos parlamentares que boicotaram, antes da vigília, a votação que aprovou um dispositivo para punir insultos ao hino nacional chinês.

"Fui retirado do meu local de trabalho pela polícia logo depois. Isso mostra para onde vamos", disse, por aplicativo.​

Manifestantes sobre grade derrubada no parque Victoria, em Hong Kong
Manifestantes sobre grade derrubada no parque Victoria, em Hong Kong - Anthony Wallace/AFP

Apesar da proibição, no começo da noite (manhã no Brasil) honcongueses começaram a fazer fila para assinar uma petição contra a China e a pegar velas para a vigília no parque Victoria. Não houve estimativa de presença, mas fotos permitiam supor milhares de pessoas.

A polícia acompanhou o ato, levantando faixas informando que ele era ilegal e alertando para o risco de infecção. Em toda Hong Kong, 3.000 policiais da tropa de choque foram mobilizados.

As grades colocadas em torno do parque foram removidas por ativistas e, por volta das 19h (8h em Brasília), o local ficou lotado. No começo, manifestantes com máscara estavam respeitando alguma distância uns dos outros, mas isso se perdeu.

Comandados pelo veterano ativista Lee Chuk-yan, os presentes ouviram palavras de ordem contra o jugo chinês sobre Hong Kong e advertências acerca da nova lei de segurança. "Conclamamos o povo de Hong Kong a acender uma vela conosco no ano que vem", disse Lee ao fim do evento, às 21h (10h em Brasília).

Apesar do clima pacífico, houve tensão em outros pontos do território. Em Mong Kok, na parte continental de Hong Kong, cerca de mil pessoas se concentraram e houve escaramuças entre manifestantes e policiais, com pelo menos quatro prisões sendo feitas, segundo o jornal South China Morning Post.

Na dispersão do evento no parque Victoria, houve empurra-empurra entre policiais e ativistas, mas sem maiores consequências. Segundo o Post, a ordem do governo à polícia foi a de evitar grandes choques, para não aumentar a exposição internacional do ato.

Não deu certo, a julgar pela cobertura de órgãos de imprensa ocidentais do ato. Os Estados Unidos estão na linha de frente da pressão sobre Pequim, apoiando os manifestantes e prometendo sanções econômicas contra o território.

Passam por Hong Kong 65% dos investimentos estrangeiros que entram na China e também os que são feitos por ela no exterior.

O interesse americano também é político, dado que o governo de Donald Trump está em plena guerra comercial e geopolítica contra a potência asiática ascendente.

Já os antigos donos do pedaço, os britânicos, não só condenaram a lei de segurança como ameaçam facilitar a imigração de quase 3 milhões dos 7,5 milhões de honcongueses caso ela seja aplicada de fato.

Americanos, britânicos e outros afirmam que a lei viola o acordo de devolução entre Londres e Pequim, que previa a manutenção do sistema dual de Hong Kong até pelo menos 2047.

A China, por sua vez, associa tal interesse externo aos manifestantes pró-democracia, conforme sua narrativa de que os atos visam apenas desestabilizar o regime comandado por Xi Jinping.

Por óbvio, há objetivos maiores no apoio externo. Mas tachar as manifestações de manipuladas também ignora o enorme movimento da sociedade civil no território, que aparentemente não vai desistir de suas demandas com tanta facilidade.

Com isso, quando a lei de segurança estiver em vigor, talvez no crucial mês eleitoral de setembro, e forças chinesas puderem operar contra o que consideram terrorismo e secessionismo em Hong Kong, o embate subirá a outro patamar.

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