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Eleições EUA 2020

Mosca na cabeça de Pence rouba a cena em debate civilizado e sem vencedores

Com Trump atrás nas pesquisas, empate é derrota para os republicanos

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São Paulo

Diante do show de horror que foi o primeiro debate presidencial americano, o embate entre os dois candidatos à Vice-Presidência na noite de quarta-feira (7) foi um banho de calma e civilidade —tanto que quem roubou a cena foi a mosca que pousou durante dois longos minutos na cabeça de Mike Pence.

Seguindo o roteiro de debates normais, nenhum dos dois candidatos respondeu às perguntas da moderadora, Susan Page. O vice-presidente Mike Pence não explicou por que os Estados Unidos foram o país recordista em mortes por Covid-19 nem se comprometeu a aceitar os resultados da eleição de 3 de novembro, a exemplo de Donald Trump.

A senadora Kamala Harris e o vice-presidente Mike Pence acenam em debate em Salt Lake City - Alex Wong/Getty Imagens/AFP

A senadora democrata Kamala Harris tampouco se comprometeu a não aumentar o número de vagas na Suprema Corte no caso de uma vitória democrata.

Com a grande probabilidade de os republicanos conseguirem confirmar Amy Coney Barrett na vaga de Ruth Bader Ginsburg, o que ampliaria a tendência da corte à direita, uma ala dos democratas pressionam para que Biden expanda o número de magistrados do tribunal para, assim, indicar juízes progressistas.

Habitualmente, debates entre candidatos a vice são eventos secundários. Mas esse tinha um peso maior.

Kamala é vice na chapa de Joe Biden, um presidente que terá 78 anos ao assumir a Presidência, se for eleito. Ele mesmo já disse ser um “candidato de transição” para as gerações mais novas do Partido Democrata. E Pence é vice de Donald Trump, um presidente que, além de ter 74 anos, está com Covid-19 e cujo estado de saúde é alvo de informações conflitantes.

Nesse sentido, Kamala, que é menos conhecida do eleitorado, conseguiu cumprir sua principal missão no debate: mostrar-se presidenciável. Com as habilidades retóricas de seus anos como promotora de Justiça, ela demonstrou segurança e muito mais assertividade que Biden em seu confronto com Trump.

A senadora democrata deixou claro que, ao contrário de seu cabeça de chapa, não aceita bullying.

Pence caprichou no manterrupting —prática de homens interromperem mulheres desnecessariamente—, mas Kamala não deixou barato.

“Senhor vice-presidente, eu estou falando.”

“Senhor vice-presidente, se o senhor me deixar terminar, podemos ter uma conversa.”

“Susan [a moderadora], eu devo ter tempo igual.”

No final das contas, nem a moderadora nem Kamala conseguiram disciplinar Pence —ele não respeitou as regras e teve muito mais tempo de fala do que a senadora democrata.

Mas as intervenções de Kamala, deixando claro que ele não a deixava falar, certamente não ajudaram a chapa republicana com o voto feminino, um dos maiores flancos de Trump.

O segundo objetivo de Kamala era demonstrar que não é uma socialista enrustida que levaria um governo Biden para a esquerda radical, como vive martelando Trump. Ela repetiu várias vezes que não elevará impostos da classe média nem impor um New Deal verde que aumentaria os custos de muitas empresas.

Já a tarefa de Pence era mais difícil —defender o histórico do governo Trump em temas como combate à Covid e economia, que já foi um dos trunfos do republicano, mas que agora demora a se recuperar. “O que quer que esse governo diga que fez, claramente não funcionou. Estamos olhando para 210 mil cadáveres”, disparou Kamala. É difícil convencer os eleitores que esses 210 mil cadáveres eram inevitáveis.

Comparado ao irascível Trump, Pence é um lorde inglês: iniciou o debate afirmando ser “um privilégio” dividir o palco com Kamala e a cumprimentou pela “natureza histórica” de sua indicação —a senadora é a quarta mulher a compor uma chapa presidencial e a primeira candidata negra em um grande partido.

O republicano usou toda sua cordialidade para não responder nada do que era perguntado e se ater aos slogans de campanha.

Houve momentos de humor involuntário. Ao questionar a veracidade de afirmações de Kamala, Pence recorreu duas vezes à frase atribuída ao ex-senador Daniel Patrick Moynihan: “Você tem direito às suas próprias opiniões, não aos seus próprios fatos”.

Pence é vice do governo que eternizou a expressão “fatos alternativos”. Trump, do início de seu mandato até julho, deu mais de 20 mil declarações mentirosas ou distorcidas, segundo contagem do Washington Post.

De maneira geral, não houve vencedores no debate e dificilmente alguém irá mudar seu voto após assistir aos 90 minutos de evasivas e de slogans de campanha de Kamala e Pence.

Mas, para os republicanos, empate é derrota —a vantagem de Biden sobre Trump está aumentando, e, nas últimas pesquisas, chega a distâncias consideráveis em estados cruciais como Flórida e Michigan.

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