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América Latina

Apoio de Lula à ditadura cubana é lembrete incômodo para o petismo em 2022

Petista reduz protestos a 'passeata' e ignora repressão; assim como corrupção, tema assombra o PT

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São Paulo

No distante 2005, Luiz Inácio Lula da Silva foi questionado pela Folha em Roma, onde o então presidente acompanhava o funeral de João Paulo 2º, se ele considerava Cuba uma democracia.

Como ocorrera antes e muitas vezes depois, o petista tentou sair pela tangente, balbuciando algo sobre a necessidade de ajudar a ilha de Fidel Castro a construir sua democracia, só para engatar a crítica ao embargo americano.

Os ex-presidentes Dilma Rousseff e Lula, o então ditador Raúl Castro e o ditador Nicolás Maduro em evento para homenagear Fidel Castro em Santiago de Cuba
Os ex-presidentes Dilma Rousseff e Lula, o então ditador Raúl Castro e o ditador Nicolás Maduro em evento para homenagear Fidel Castro em Santiago de Cuba - Carlos Barria - 3.dez.16/Reuters

Passados 16 anos, nada mudou na visão de mundo do ex-presidente e do PT. Lula concedeu entrevista e fez postagem no Instagram dizendo que os grandes protestos de rua registrados em Havana foram uma mera passeata. Nem uma palavra sobre a repressão da ditadura ora dirigida por Miguel Díaz-Canel.

"Mas você não viu nenhum soldado em Cuba com o joelho em cima do pescoço de um negro, matando ele...", disse a conta do petista, querendo evocar George Floyd. Além de serem casos incomparáveis, o que dizer das diversas imagens de ação policial do domingo (11)? Já o partido divulgou na segunda (12) uma nota na qual comunica seu "apoio ao povo e ao governo cubano". O texto é um primor ao não citar os protestos e, ao mesmo tempo, culpar Washington por tudo de errado que ocorre na ilha.

O embargo americano de fato é um entulho da Guerra Fria perdido no século 21, assim como o regime comunista cubano. Se retroalimentam. O breve período de liberalização nas relações, patrocinado por Barack Obama, insinuou uma saída possível para o país —e não se trata de defender que Cuba volte a ser uma "plantation" dos americanos, como nos tempos de Fulgencio Batista.

Há muito mais dúvidas do que certezas nos atos em curso, até porque a ilha vive um bloqueio de internet promovido pelo governo. Claro que o apoio de Joe Biden aos manifestantes leva à acusação de que há uma quinta-coluna em ação, mas isso parece irrelevante ante o aparato repressivo montado pelo regime.

Tal opacidade, porém, não comove Lula e o petismo, isso para não falar em radicais livres como os militantes do Partido da Causa Operária, sigla nanica célebre após atacar um punhado de tucanos num protesto conjunto contra Jair Bolsonaro, querendo briga em frente ao consulado cubano em São Paulo.

Pior para Lula e seu projeto de voltar à Presidência em 2022, de preferência com Bolsonaro como um exangue adversário —por enquanto, indo de vento em popa segundo os dados mais recentes do Datafolha.

Assim como no tema da corrupção, que o partido quer deixar em segundo plano pela óbvia vidraça que a discussão lhe garante, falar sobre Cuba é tudo o que o petista poderia não querer. Além de evidenciar o anacronismo monolítico, o apoio aos líderes cubanos cai como uma luva para o bolsonarismo e o seu "vai para Cuba" ou "vai para Caracas" como xingamento-padrão para esquerdistas desde a campanha de 2018.

Claro que um petista poderá apontar que Bolsonaro tem mais em comum com a ditadura esquerdista do chavismo na Venezuela do que Lula, mas será uma disputa entre roto e esfarrapado ideológicos.

Na comunicação imediata, ganhou o bolsonarismo. Carlos, filho presidencial e guru de redes sociais do clã, já foi ao Facebook com a crítica pronta à nota. Será questão de tempo para lembrarem dos financiamentos amigos dos governos petistas a obras como o porto de Mariel, em Cuba.

Lula, claro, pode se beneficiar do fastio que tal discurso monocórdico tem causado no eleitorado. A intenção de voto de Bolsonaro está estacionada em 24%, mostrou o Datafolha, enquanto o ex-presidente surfa nos 46% em dois cenários de primeiro turno testados.

À medida que a campanha e a eleição se aproximarem, contudo, parece evidente que tais temas, corrupção e o apoio a ditadores, voltarão à baila. Mesmo que não sejam decisivos, são lembretes incômodos para o candidato Lula acerca do DNA do partido que quer voltar a governar o país.

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