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Justiça de Honduras condena ex-executivo de hidrelétrica por morte de célebre ambientalista

Berta Cáceres, que atuava em defesa de terras indígenas, foi morta em 2016

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Tegucigalpa (Honduras) | Reuters e AFP

Roberto David Castillo, ex-alto executivo da hidrelétrica Desa, foi condenado pela Justiça de Honduras nesta segunda-feira (5) por ter participado do assassinato em 2016 da ambientalista Berta Cáceres, opositora de um projeto da empresa desenvolvido em território indígena.

Vencedora do Prêmio Ambiental Goldman em 2015, a ativista foi morta em março de 2016 por atiradores que invadiram sua casa em La Esperanza, no oeste do país. Gustavo Castro, ativista mexicano que estava com Cáceres no local do crime, sobreviveu ao atentado com ferimentos.

Roberto David Castillo, ex-alto executivo da Desa, foi condenado pela morte de Berta Cáceres, ativista ambiental de Honduras
Roberto David Castillo, ex-alto executivo da Desa, foi condenado pela morte de Berta Cáceres, ativista ambiental de Honduras - Fredy Rodriguez/Reuters

Na decisão, a juíza afirmou que Cáceres, então coordenadora do Copinh (Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras), foi assassinada por ordem da Desa (Desarrollos Energéticos S.A.), por se opor, com manifestações, à construção de uma hidrelétrica no rio Gualcarque.

O projeto de US$ 50 milhões (R$ 254,4 milhões, na cotação desta segunda) previa a construção de uma barragem no território da tribo Lenca, considerado sagrado. Segundo ativistas, a obra causaria grandes interrupções no abastecimento de água e alimentos, e os grupos indígenas da área não foram consultados. Após o assassinato de Cáceres, investidores internacionais abandonaram o projeto.

Na audiência, foi revelado o conteúdo de telefonemas entre Castillo e os outros sete condenados, julgados em 2019 e que receberam penas de 30 a 50 anos de prisão. A acusação original contra o ex-executivo, que também é militar reformado e foi treinado nos EUA, era a de ser mentor do crime, mas sua condenação foi por co-conspiração —ele se declarou inocente. Sua pena será definida em uma audiência convocada para 3 de agosto.

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O avanço das condenações dos envolvidos no assassinado de Cáceres traz um precedente importante para Honduras, uma vez que o país é líder mundial em índices de assassinato per capita de defensores do meio ambiente, segundo a ONG Global Witness. De acordo com relatórios anuais publicados pela organização, 166 ativistas ambientais foram assassinados no país desde 2012 —no mundo todo, foram 1.992.

A condenação do executivo “é um grão de areia na justiça pelo assassinato de minha mãe”, disse Laura Zúniga. “Hoje nos sentimos felizes. O povo hondurenho está farto de tanta impunidade e morte. Falta o próximo passo”, acrescentou. A família Cáceres e a liderança do Copinh exigem a punição de Castillo e a condenação dos sócios da Desa, membros de famílias influentes de banqueiros, apontados como mandantes intelectuais do crime.

No Twitter, o Copinh classificou a decisão como uma vitória para o povo de Honduras. “Isso significa que as estruturas de poder do crime não conseguiram corromper o sistema de Justiça.”

Por seu ativismo de mais de duas décadas em defesa de terras indígenas contra a construção de hidrelétricas, represas e obras de infraestrutura, Cáceres vivia sob ameaça. Antes dela, outros 130 ativistas haviam sido mortos em dez anos, mas a maioria desses casos continuou impune. A morte da ambientalista, no entanto, ganhou projeção internacional. Ela havia conquistado prêmios e falado sobre as tentativas de eliminá-la a jornais estrangeiros.

O assassinato expôs ainda a contínua tensão civil em Honduras, governada por um partido e um presidente, Juan Orlando Hernández, acusados de corrupção e de vínculos com o narcotráfico.

O país é um dos mais violentos do mundo, com uma taxa de homicídios de 39 por cada 100 mil habitantes, e é governado pelo Partido Nacional desde 2009, quando o então mandatário Manuel Zelaya foi deposto.

Em entrevista à Folha em dezembro, Bertha Zuñiga Cáceres, coordenadora geral da Copinh e filha de Berta, afirmou que há pelo menos 51 concessões de projetos hidrelétricos e eólicos no território da comunidade Lenca. Outros projetos, muitos voltados para o turismo e a extração de óleo, também geram embates com o povo afrodescente garífuna no litoral do país.

Na ocasião, Bertita, como é conhecida, disse que um dos principais problemas é a ausência —ou a manipulação— de consultas prévias às comunidades indígenas para obter seu consentimento sobre projetos que podem impactar suas terras, cultura ou modo de vida. Apesar de Honduras ser signatária da Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que versa sobre o assunto, e ter adotado em 2007 a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que reitera o tema, as consultas raramente são feitas e respeitadas no país.

Para a primogênita de Berta, desde o assassinato de sua mãe pouca coisa melhorou para os ativistas e movimentos ambietais hondurenhos—ao contrário, o cenário piorou nos últimos anos.

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