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Coreia do Sul elege presidente conservador em meio a explosão de Covid

Yoon Suk-yeol terá que equilibrar ainda relação com Coreia do Norte, China e Japão

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São Paulo

O conservador Yoon Suk-yeol será o próximo presidente da Coreia do Sul, mostra a apuração da acirrada eleição presidencial no país, realizada nesta quarta-feira (9). Ele assumirá o governo por cinco anos no lugar de Moon Jae-in, que não pôde concorrer à reeleição devido às leis locais.

As pesquisas de boca de urna após o encerramento da votação apontavam vantagem de apenas 0,6 ponto percentual de Yoon sobre o segundo colocado, Lee Jae-myung, do mesmo partido do atual presidente. Não há segundo turno. Antes do fim da apuração, Lee reconheceu a derrota e parabenizou o vencedor.

O presidente eleito na Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, em evento de campanha na terça-feira (8)
O presidente eleito na Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, em evento de campanha na terça-feira (8) - Jung Yeon-je/AFP

A vitória apertada foi confirmada ao fim da apuração das urnas: 48,56% contra 47,83% —​uma diferença de menos de 250 mil votos.

Yoon Suk-yeol, 61, procurador que ficou famoso por atuar no caso que levou à prisão da ex-presidente Park Geun-hye por abuso de poder, chegou a atuar como procurador-geral no governo Moon Jae-in, antes de romper com o mandatário e se candidatar pelo Partido do Poder Popular.

Ele vence a eleição no pior momento da pandemia da Covid-19 no país, quando a Coreia registra média de quase 250 mil novas infecções e 170 mortes por dia, em uma onda devastadora da variante ômicron.

Para ter uma ideia, desde o começo da pandemia até o final do ano passado, o país não havia registrado nenhum dia com média diária de mais de 7.000 casos. Assim, o novo presidente assumirá com uma série de desafios, sendo a pandemia o mais imediato deles.

Moon, o líder atual, conseguiu conter de forma satisfatória o avanço do coronavírus e esperava receber crédito por isso, mas sofreu um forte golpe com a explosão recente de casos, diz Yong-Chool Ha, professor de relações internacionais da Universidade de Washington, nos Estados Unidos. Isso ajuda a explicar a expressiva votação do candidato da oposição.

Yoon terá que lidar ainda com o aumento do endividamento doméstico e com uma grave crise imobiliária, que atinge sobretudo os mais jovens, com cada vez mais dificuldades para comprar ou alugar imóveis.

Metade dos 52 milhões de habitantes do país vive na capital, Seul, ou na região metropolitana, o que já torna caro morar na região, e os preços vêm subindo aceleradamente.

O governo afirma que o valor dos imóveis subiu 17% em média desde o começo da gestão Moon, mas pesquisas independentes apontam que esse aumento, na verdade, fica entre 75% e 93%. Yoon, candidato vencedor, prometeu construir 2,5 milhões de habitações nos próximos cinco anos no país.

Segundo Thiago Mattos, mestre em relações internacionais pela Uerj e especialista em Coreia do Sul que vive no país há quatro anos, o presidente eleito também precisará equilibrar as relações com os vizinhos.

Ao longo de seu governo, Moon Jae-in investiu em políticas consideradas mais hostis em relação ao Japão, afirma ele. De um lado, elas reavivaram um sentimento nacionalista, que ainda carrega traumas do período em que a Coreia foi colônia do Japão; de outro, gerou danos econômicos e frustrou parcela da população.

A relação com a China também é foco de atenção. O presidente manteve boas relações com Pequim, o que provoca certa resistência na parcela conservadora dos coreanos. O ponto mais sensível da política externa, no entanto, é a Coreia do Norte. Moon capitalizou o sentimento pró-unificação e ganhou popularidade ao mediar contatos entre o então presidente americano Donald Trump e Kim Jong-un, mas viu sua aprovação cair à medida que os vizinhos do norte se afastavam e que o ditador retomava testes militares.

​Yoon promete retomar o diálogo com a Coreia do Norte e se mostrou aberto a dar benefícios a Pyongyang se isso significar um caminho para a desnuclearização do norte da península, mas já defendeu que ações preventivas podem conter o país se houver informações sobre um ataque iminente.

Durante a campanha, afirmou que o melhor caminho para resolver o problema é estabelecer um diálogo triplo entre Coreia do Sul, Coreia do Norte e EUA. Yoon já afirmou que quer comprar mais sistemas de mísseis antibalísticos dos EUA, mesmo com o risco de retaliação econômica da China, que afirma que o radar do sistema pode alcançar o território chinês. Também quer ampliar a aliança com o Japão e entrar no chamado Quad, que envolve EUA, Austrália, Japão e Índia —o que deve afastá-lo ainda mais de Pequim.

Ainda na política externa, a guerra em curso na Ucrânia foi tema na campanha, ainda que tenha impacto menor nos resultados, diz Ha. "Os eleitores veem semelhanças estruturais por também se sentirem oprimidos por grandes potências e desejam tirar lições sobre o que acontece na Ucrânia", afirma o pesquisador. "O público, em geral, expressa simpatia pelo povo ucraniano, talvez por se ver em situação semelhante [com o temor de ser invadida por vizinhos com arsenais nucleares]".

Por fim, os analistas citam ainda como desafio a crescente polarização na pauta comportamental no país. "Hoje em dia, existe uma parcela grande de homens adultos e jovens que tem crescentemente se mostrado contrários a pautas progressistas, especialmente a feminista", afirma Mattos.

Segundo Ha, nesta eleição se buscava "um líder com integridade e senso de justiça". A razão, diz ele, é que "muita gente na Coreia acredita que o atual regime progressista, ao contrário do que alega, não tem sido consistente no cumprimento do princípio de justiça e equidade". Esse sentimento é particularmente forte entre as pessoas da chamada geração MZ, de 20 a 30 anos. "Sentem-se traídos pelo atual governo, que chegou ao poder após o impeachment de uma presidente conservadora."

Na campanha, o presidente eleito prometeu abolir o Ministério da Igualdade de Gênero e da Família e chegou a afirmar que o feminismo era o maior responsável pela baixa taxa de natalidade do país.

Eleitores votam em eleição presidencial na Coreia do Sul - Kim Hong-ji/Reuters

A eleição foi marcada por denúncias e episódios de violência. Na segunda-feira (7), o líder do Partido Democrático, o mesmo do presidente Moon Jae-in, foi atacado a machadadas e hospitalizado. Song Young-gil, que também foi coordenador da campanha do segundo candidato mais votado, foi atacado em Seul por um homem de 70 anos. O agressor foi preso, e Song passa bem.

O ataque ocorreu depois de denúncias envolvendo a votação antecipada, liberada na sexta e no sábado para o público geral, e no fim da tarde de sábado para eleitores com Covid, que poderiam sair de casa às 17h e deveriam chegar aos locais de votação às 18h. Como mais de 1 milhão de pessoas fazem tratamento para a doença, segundo autoridades do país, a concentração de eleitores no mesmo horário provocou enormes filas de pessoas doentes no frio de temperaturas próximas a 0°C.

Além disso, os eleitores denunciaram terem recebido cédulas já preenchidas. Mesmo com esses problemas, a antecipação atraiu 37% do eleitorado. Nesta quarta, os eleitores com Covid também puderam deixar suas casas para votar das 18h às 19h30. O restante dos eleitores pôde votar entre 6h e 18h.

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