Polícia de Israel bate em manifestantes que carregavam caixão de jornalista da Al Jazeera

Shireen Abu Akleh foi morta quando cobria ação na Cisjordânia; funeral registra ação violenta

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Jerusalém | Reuters e AFP

A polícia de Israel reprimiu com golpes de cassetete e bombas de efeito moral, nesta sexta-feira (13), pessoas que compareceram ao funeral da repórter da Al Jazeera Shireen Abu Akleh, morta durante uma operação militar na Cisjordânia na quarta (11).

Os soldados agrediram dezenas de palestinos que agitavam bandeiras e cantavam no complexo do hospital São José, em Jerusalém Oriental. Eles gritavam em coro "com nossa alma, com nosso sangue, nos sacrificamos por você, Shireen". A certa altura, com a confusão, o grupo que carregava o corpo da jornalista foi prensado contra uma parede e quase deixou cair o caixão, recuperando-o pouco antes de uma das extremidades atingir o chão.

Polícia israelense entra em confronto com pessoas que foram ao funeral da jornalista Shireen Abu Akleh, enquanto o caixão dela é carregado em Jerusalém - Ahmad Gharabli/AFP

De acordo com a agência Reuters, a repressão se deu porque os policiais aparentemente tentavam fazer com que o cortejo seguisse com o caixão em um veículo, em vez de carregado pelos presentes. As forças de segurança dizem que foram alvos de pedras.

As cenas de violência marcam a raiva crescente pelo assassinato de Abu Akleh. A repórter, que cobriu assuntos palestinos e do Oriente Médio por mais de duas décadas, foi baleada na cabeça enquanto cobria uma operação israelense na Cisjordânia ocupada, na cidade de Jenin.

Autoridades palestinas afirmam que ela foi assassinada pelas forças israelenses —mesma versão da emissora qatariana, que falou em uma ação "deliberada e a sangue frio". O governo de Naftali Bennett inicialmente sugeriu que a jornalista teria sido atingida por fogo palestino, mas autoridades depois disseram que não podiam descartar que o tiro tivesse partido de armas israelenses.

Vídeos gravados após Abu Akleh ter sido baleada mostram que a jornalista de 51 anos vestia capacete e um colete azul com a inscrição "Press" (imprensa). Pelo menos dois colegas que estavam com ela disseram que estavam sob fogo de atiradores israelenses, não próximos de militantes palestinos.

Nesta sexta, a confusão começou quando uma multidão foi ao hospital recuperar o corpo da jornalista palestino-americana, para fazer um cortejo até o cemitério. A polícia alega que o grupo de palestinos, descritos como desordeiros, começou a atirar pedras. "Os policiais foram forçados a agir", disseram as forças de segurança.

Poucos minutos depois, o caixão de Abu Akleh foi colocado em um veículo e levado para a Basílica da Anunciação da Virgem, na Cidade Velha de Jerusalém, onde a cerimônia transcorreu pacificamente. Multidões se aglomeraram nas vielas locais enquanto o cortejo seguia para o Cemitério Protestante Monte Sião. O túmulo da jornalista estava coberto de coroas de flores, com uma bandeira palestina pendurada sobre uma cruz.

A ação da polícia israelense recebeu críticas de diferentes partes. O Qatar e a Al Jazeera condenaram a conduta dos soldados, enquanto o porta-voz-adjunto da ONU Farhan Haq disse que o ocorrido foi "muito chocante". Representantes da União Europeia e dos Estados Unidos também se manifestaram.

A porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, classificou as cenas de perturbadoras e disse que os EUA mantêm contato com autoridades dos dois lados para monitorar a situação.

Enquanto o cortejo de Abu Akleh ocorria em Jerusalém, o Exército de Israel retomou as operações na região de Jenin, na Cisjordânia, onde a jornalista foi morta. De acordo com as Forças Armadas, a ação visava a deter suspeitos ligados a atividades terroristas.

Em Burqin foi registrado um confronto. Comunicado de Israel afirmou que os soldados foram alvo de "tiros e objetos explosivos e responderam abrindo fogo". O Ministério da Saúde palestino disse que ao menos 13 pessoas ficaram feridas, enquanto o gabinete de Bennett confirmou a morte de um policial —em ação reivindicada pelo grupo Jihad Islâmico.

"Perdemos um verdadeiro herói, um valente combatente que se colocou em perigo pela segurança de Israel", disse o primeiro-ministro em nota. O soldado Noam Raz tinha 47 anos e vivia em uma colônia israelense ao sul de Nablus, na Cisjordânia. Era membro da unidade especial Yamam.

Ainda nesta sexta, as Forças Armadas israelenses disseram que sua investigação inicial sobre a morte de Abu Akleh "concluiu que não é possível determinar inequivocamente a fonte do tiro que atingiu e matou" a jornalista.

O inquérito levantou duas possibilidades, segundo os militares. A primeira, que ela tenha sido atingida por militantes palestinos que dispararam dezenas de vezes contra veículos militares israelenses, "situados na mesma direção onde estava Abu Akleh". A segunda, que um soldado israelense a tenha atingido inadvertidamente ao contra-atacar os palestinos que atiravam. Esse militar estaria dentro de um jipe a cerca de 200 metros da repórter.

Um porta-voz de Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, afirmou que os eventos recentes em Jerusalém e Jenin podem levar os dois lados a uma grave escalada. O político já havia pedido uma investigação internacional sobre o caso da profissional da Al Jazeera.

A morte da jornalista ocorre quase um ano após o ataque aéreo israelense que destruiu o edifício em Gaza onde ficavam os escritórios da rede qatariana e da agência Associated Press, durante a guerra de 11 dias contra o grupo palestino radical Hamas. À época, Israel afirmou que a torre abrigava escritórios de membros da facção que governa a Faixa de Gaza, território sob bloqueio israelense.

A tensão atual voltou a crescer em 22 de março, quando começou uma série de ataques de que Israel foi alvo, que provocaram a morte de ao menos 18 pessoas. Depois, 31 palestinos morreram em ações das forças israelenses.

O cenário se deteriora particularmente na Esplanada das Mesquitas, em Jerusalém, o terceiro local mais sagrado do islã e o mais sagrado do judaísmo, onde mais de 300 pessoas ficaram feridas em confrontos desde abril. No final de abril, na mesquita Al-Aqsa, parte do complexo, um confronto deixou 42 palestinos feridos e desencadeou represálias.

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