Veja perguntas e respostas sobre possível reversão do direito ao aborto nos EUA

A prática se tornaria ilegal em todos os estados? Como o número de procedimentos mudaria no país?

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Claire Cain Miller Margot Sanger-Katz
The New York Times

Um parecer da Suprema Corte que pode derrubar a decisão Roe vs. Wade, que garante o direito ao aborto nos EUA, coloca o país num cenário não visto há quase 50 anos, em que a situação legal da prática depende totalmente dos estados. Se o rascunho da minuta, datado de fevereiro, que vazou e foi publicado na noite de segunda (2) pelo site Politico, acabar sendo semelhante ao parecer final do tribunal, previsto para o próximo mês, os direitos reprodutivos das mulheres seriam reescritos quase imediatamente.

Entenda abaixo o que uma mudança do entendimento do tribunal sobre o tema provocaria.

Manifestantes contrários ao direito ao aborto protestam em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington
Manifestantes contrários ao direito ao aborto protestam em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington - Evelyn Hockstein/Reuters

Se Roe for derrubada, o aborto se tornaria ilegal em todos os lugares? Não. Cada estado decidiria se e quando o aborto seria legal. Muitos estados continuariam a permiti-lo, e alguns até começaram a fazer provisões para atender mulheres que vivem em locais que provavelmente restringirão o aborto. Neste momento, o procedimento continua autorizado em todos os estados.

Onde o acesso ao aborto teria maior probabilidade de mudar? O procedimento provavelmente se tornaria ilegal em cerca da metade dos estados americanos, embora algumas das previsões sejam diferentes. De acordo com o Centro de Direitos Reprodutivos, grupo que luta na Justiça contra as restrições ao direito ao aborto e acompanha de perto as leis estaduais, 24 estados provavelmente proibirão o aborto se forem autorizados: Alabama, Arizona, Arkansas, Geórgia, Idaho, Indiana, Kentucky, Louisiana, Michigan, Mississippi, Missouri, Nebraska, Carolina do Norte, Dakota do Norte, Ohio, Oklahoma, Pensilvânia, Carolina do Sul, Dakota do Sul, Tennessee, Texas, Utah, Virgínia Ocidental e Wisconsin.

O Instituto Guttmacher, grupo de pesquisa focado em saúde reprodutiva, diz que uma lista um pouco diferente de estados provavelmente limitará bastante o acesso ao aborto: sua compilação de 26 estados exclui Carolina do Norte e Pensilvânia, mas inclui Flórida, Iowa, Montana e Wyoming. Treze estados têm as chamadas leis de gatilho, que foram aprovadas para tornar o aborto ilegal assim que um tribunal decidir.

Alguns têm antigas leis de aborto que foram invalidadas pela decisão do caso Roe, mas poderiam ser aplicadas novamente. Outros estados, como Oklahoma, têm proibições ao aborto que foram aprovadas durante a atual sessão legislativa, apesar do precedente de Roe.

Como o número de abortos mudaria nos EUA? Algumas mulheres que querem fazer aborto podem obtê-lo de outras maneiras, como viajar para um estado onde o procedimento é legal ou encomendar online pílulas de fora do país. O Texas é um exemplo. Em setembro, entrou em vigor uma lei que proíbe o aborto após a detecção de atividade cardíaca fetal, em torno de seis semanas de gestação. Os abortos nas clínicas do Texas caíram pela metade. Mas muitas mulheres conseguiram o procedimento em estados vizinhos ou encomendando pílulas, resultando em um declínio geral de apenas cerca de 10%.

Sem a Roe, o aborto provavelmente diminuiria mais porque as mulheres teriam que viajar mais longe até um estado onde a prática é legal. Muitas mulheres que abortam são pobres, e as longas distâncias de viagem podem ser impraticáveis. Os estados que provavelmente proibirão o aborto estão concentrados no sul, no centro-oeste e nas Grandes Planícies. Devido ao aumento esperado nas viagens interestaduais, as clínicas restantes provavelmente teriam menos capacidade de atender as mulheres que conseguissem alcançá-las. Pesquisas de dezembro sobre as mudanças estimadas nas distâncias até as clínicas descobriram que, se Roe for derrubada, o número de abortos legais provavelmente cairá cerca de 14%.

Quem faz abortos hoje? Sob a lei atual, cerca de 1 em cada 4 mulheres americanas faria um aborto em algum momento, de acordo com pesquisa do Guttmacher. Elas incluem mulheres de todas as origens. Mas as estatísticas mostram que as que fazem abortos nos EUA são mais propensas a ser solteiras; na faixa dos 20 anos; de baixa renda; e já têm um filho. Elas têm uma propensão desproporcional a serem negras. E são mais propensas a viver em um estado de tendência democrata.

Sem a Roe, como os EUA se comparariam ao resto do mundo? Os EUA se somariam a países que endureceram as leis de aborto nos últimos anos. Apenas três países o fizeram desde 1994: Polônia, El Salvador e Nicarágua. Nesse período, 59 países ampliaram o acesso, segundo o Centro de Direitos Reprodutivos. Sob a Roe, os EUA são um caso raro de permitir o aborto por qualquer motivo até cerca de 23 semanas de gestação.

No entanto, em muitos países com reduções anteriores, o aborto é permitido por uma ampla variedade de razões, de acordo com a entidade. Sessenta e seis países –que abrigam cerca de um quarto das mulheres em idade reprodutiva– proíbem o aborto ou o permitem apenas se a vida da mulher estiver em perigo. Sem a Roe, alguns estados americanos se alinhariam a eles.

Quando isso aconteceria? Não imediatamente. O aborto permanece legal em todos os estados por enquanto, e cada um tem pelo menos uma clínica. O documento vazado foi descrito como um rascunho, não uma opinião final. Pode levar um mês ou mais até que a Suprema Corte decida oficialmente o caso, e essa decisão pode diferir do projeto que está circulando. Se o tribunal decidir contra a Roe, as clínicas de alguns estados provavelmente começarão a fechar em poucos dias. Em outros estados que proíbem o procedimento, o processo pode levar vários meses.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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