Apreensão de imigrantes brasileiros nos EUA volta a crescer e supera 5.000 por mês

Inflação, falta de perspectivas e regras confusas estimulam imigração irregular, dizem especialistas

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Washington

A cada dia de maio, em média, 165 brasileiros foram barrados ao tentar entrar nos EUA de modo irregular, via México, mantendo uma tendência de alta que ganha força desde março. O total de apreensões no mês passado, 5.118, foi quase o quádruplo do de março (1.346), mas abaixo dos 10.471 registrados em setembro do ano passado, segundo o CBP (Departamento de Controle de Fronteiras).

"A justificativa que a gente mais escuta nas entrevistas com imigrantes brasileiros que chegam aos EUA é a economia brasileira, devido à alta da inflação e à estagnação dos salários", afirma Gabrielle Oliveira, professora na Universidade Harvard e pesquisadora de imigração. "Muitos deles dizem não ver perspectiva de melhora no Brasil, independentemente de quem for eleito presidente em outubro."

Agente de fronteira dos EUA detém imigrantes brasileiros que entraram no país de maneira ilegal, em Los Ebanos, no Texas
Agente de fronteira dos EUA detém imigrantes brasileiros que entraram no país de maneira ilegal, em Los Ebanos, no Texas - Adrees Latif - 15.ago.18/Reuters

O aumento de brasileiros detidos é parte de um recorde de imigrantes que tentam entrar nos EUA. O total de barrados na fronteira tem ficado acima de 200 mil por mês desde março. Em maio, atingiu 239 mil, a maior cifra mensal já registrada —o dobro do que se via em 2021. Essa alta tem várias razões: se muitos países da América Latina enfrentam crises econômicas, os EUA têm vagas de trabalho sobrando; outro ponto é a percepção de que Joe Biden seria mais tolerante com a imigração do que Donald Trump.

Para Oliveira, o caso divulgado na segunda (27), quando ao menos 51 pessoas, provavelmente imigrantes em situação irregular, foram encontradas mortas dentro e ao redor de um caminhão em San Antonio, no Texas, mostra que a fronteira continua bastante difícil de cruzar, mesmo sob comando democrata.

"Quanto mais vigiada estiver a fronteira, mais gente buscará esse tipo de entrada, superarriscada. As pessoas estão chegando [à fronteira] e sendo recusadas, o que aumenta o desespero para entrar. Veremos mais gente escondida em veículos, morrendo por desidratação e altas temperaturas", diz a pesquisadora.

Felipe Alexandre, advogado do escritório AG Immigration, por outro lado, afirma que as condições ficaram um pouco melhores sob o governo Biden. "Temos visto mudanças nos tribunais de imigração. Agora, os promotores têm mais poder para ajudar, como concordar em juízo com a defesa do imigrante [para que ele fique no país]. Antes, eles estavam com as mãos totalmente amarradas."

O governo Trump, que fazia do combate à imigração irregular uma bandeira, criou medidas para dificultar a entrada de estrangeiros. Muitas delas seguem em vigor, como a Título 42, que permite a agentes barrar pedidos de asilo na fronteira e mandar os requerentes embora para esperar o resultado da solicitação em outro país, sob a justificativa de risco à saúde pública. A regra foi criada em meio à pandemia de Covid.

A lei americana autoriza estrangeiros a pedir asilo aos EUA caso sofram perseguições em seus países, por razões políticas, religiosas, de nacionalidade e etnia, mas o modo de lidar com essas solicitações pode variar muito. Se o viajante chegar ao posto de fronteira e pedir asilo, provavelmente será orientado a aguardar a resposta no México, como parte dos procedimentos da medida Título 42.

Caso o estrangeiro cruze a fronteira de modo irregular e se entregue já em solo americano, o agente que fizer a captura tem poder para decidir se encaminha o imigrante para deportação ou a uma corte que analisará o pedido de asilo. "Vai muito de qual agente a pessoa encontrou naquele dia", diz Alexandre.

Se as autoridades de imigração aceitarem abrir um processo de análise de asilo, os estrangeiros podem ficar nos EUA enquanto aguardam a resposta, que leva em média entre seis a oito anos para ser dada. No período de espera, os imigrantes podem pedir autorização de trabalho depois de alguns meses e, assim, começarem a se estabelecer no país enquanto aguardam a resposta final.

Uma medida debatida pela gestão Biden é acelerar o trâmite dos processos de asilo, de modo a dar a resposta em menos de um ano. Assim, haveria chances menores de o requerente permanecer por anos no país, o que desestimularia migrações de quem não se encaixa nas categorias de asilo.

No entanto, especialistas apontam que o debate dessas medidas podem ser gatilhos para estimular a migração, por medo de que alterações nas regras tornem o processo mais difícil no futuro.

Erramos: o texto foi alterado

O número de brasileiros detidos na fronteira dos EUA em maio foi quase o quádruplo do de março, diferentemente do que afirmava versão anterior da reportagem.

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