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Colômbia elege novo presidente em meio a campanha suja e empate técnico

Petro e Hernández fogem de debate, trocam acusações e afirmam ser alvo de ameaças de morte

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Bogotá

A Colômbia chega ao segundo turno da eleição presidencial neste domingo (19) num clima de campanha suja e empate técnico entre o esquerdista Gustavo Petro, 62, e o populista Rodolfo Hernández, 77.

Desde o primeiro turno, em que Petro teve 40% contra 28% de Hernández, houve um pouco de tudo. Ataques verbais com linguagem chula, vazamentos de vídeos de reuniões da campanha do esquerdista, uma decisão judicial descumprida para que ao menos um debate fosse realizado, supostas ameaças de morte contra o populista e até a possibilidade de que um deles se ausentasse do país até a votação.

Gustavo Petro (esq.) e Rodolfo Hernández (dir.), candidatos a presidente na Colômbia que disputam o segundo turno das eleições - Luisa Gonzalez/Reuters

De acordo com o agregador de pesquisas do site La Silla Vacía, a diferença entre eles é mínima: Petro tem 47,2% das intenções de voto, e Hernández, 46,5%. "Se a diferença for por poucos votos, creio que pode haver confusão, estamos muito preocupados e esperamos que a nossa autoridade eleitoral seja responsável", disse à Folha o senador Iván Cepeda, do Pólo Democrático Alternativo, ligado a Petro.

Nesta campanha, não houve debates entre os finalistas nem grandes atos públicos. Ambos os candidatos preferiram uma campanha de encontros localizados com eleitores e visitas porta a porta. Petro jogou futebol, jantou com uma família de classe média e se reuniu com estudantes, tudo transmitido nas redes sociais, o ambiente favorito de Hernández, que seguiu apostando em sua estratégia via TikTok.

Um dos episódios de maior repercussão antes deste segundo turno foi o vazamento de vídeos de reuniões de assessores do esquerdista debatendo como "arrasar" seus adversários. Batizadas de "petrovideos" por parte da imprensa alinhada ao atual governo e ao uribismo, as gravações revelam propostas controversas, como visitas a prisões para oferecer benefícios a criminosos e a incorporação de prefeitos à campanha, algo proibido no país e que já causou o afastamento do líder da cidade de Medellín, Daniel Quintero.

Petro negou haver ilegalidades nos vídeos e acusou o governo do presidente Iván Duque de ter facilitado os vazamentos, afirmando que apenas o Estado teria recursos para o que considerou ser espionagem.

Hernández aproveitou a ocasião para, de Miami, dizer que havia sido informado de um plano da campanha de Petro para matá-lo. Na ocasião, afirmou que não voltaria ao país até o segundo turno, o que não fez. Antes, o esquerdista já havia dito que foi alvo de ameaças de morte —ele chegou a cancelar eventos.

A possibilidade de se encontrarem em um debate foi outro ponto de tensão. Depois de a Justiça determinar que ao menos um evento do tipo fosse realizado, o populista disse que só aceitaria se reunir com Petro se fosse em seu reduto eleitoral, Bucaramanga —e apenas com temas escolhidos por ele. O adversário não aceitou as condições, e um acabou culpando o outro pela não realização do encontro.

Numa eleição em que o voto contra o establishment foi uma marca, tirando da disputa os principais partidos do país, o Liberal e o Conservador, além do Centro Democrático, força política comandada pelo ex-presidente Álvaro Uribe, os dois candidatos representam propostas de mudanças estruturais do Estado.

Caso seja eleito, Petro, ex-guerrilheiro que trocou a luta armada pela via democrática, eleito duas vezes ao Senado e uma à Prefeitura de Bogotá, vai se tornar o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, com propostas para mudar o modelo econômico local, dando mais relevo à produção agrária e reduzindo ações extrativistas —o principal produto de exportação do país é o petróleo. O esquerdista também promete uma reforma agrária baseada na taxação de terras improdutivas e no aumento dos impostos aos mais ricos.

No caso de Hernández, empresário que enriqueceu no mercado imobiliário de Bucaramanga, cidade da qual foi prefeito, as linhas programáticas são menos claras. Entre as propostas estão maior intervenção do Estado na economia, políticas anticorrupção —que incluiriam prêmios em dinheiro a delatores—, um censo de usuários de drogas para programas de redução de danos e a criação de prisões no campo, na forma de colônias de trabalho, para esvaziar os lotados centros de detenção do país. Seu discurso voltou-se aos mais pobres e aos "desplazados", ou seja, os deslocados pela violência na zona rural.

Ambos os candidatos apoiam o acordo de paz assinado em 2016 com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e querem reabrir as negociações com o ELN (Exército de Libertação Nacional), guerrilha ainda na ativa. Hernández e Petro também têm propostas menos severas para combater o crime organizado que governos anteriores. O esquerdista aposta que a reforma do modelo econômico trará a paz, e o populista, a diminuição da pobreza. O voto não é obrigatório na Colômbia, onde 39 milhões de pessoas estão aptas a votar. No primeiro turno, o comparecimento às urnas foi de 54%.

Ainda que todos esses elementos marquem um pleito histórico, as polêmicas acabaram chamando mais a atenção do que as propostas. E, pouco antes do dia da votação, ainda houve tempo para mais uma: na quinta (16), o site Cambio Colômbia publicou um vídeo de outubro de 2021 em que Hernández está em um iate cheio de mulheres de biquíni dançando. De acordo com a publicação, os gastos da festa foram pagos pela farmacêutica Pfizer, "interessada em ampliar seus negócios na Colômbia".

À época, o hoje candidato à Presidência não tinha cargo público, e as imagens não exibem o populista cometendo nenhuma ilegalidade. Mas foi o bastante para entrar no rol de controvérsias desta eleição.

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