Cuba reconhece crise de energia e anuncia cortes em Havana em meio a protestos

Capital vinha sendo poupada de apagões programados, que têm gerado manifestações pontuais em outras cidades

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Havana | AFP e Reuters

A capital cubana começará a ter cortes de eletricidade em agosto, cancelou o Carnaval, decretou férias coletivas em estatais e prevê novas medidas em meio ao agravamento de uma crise energética no país, anunciou a mídia estatal neste sábado (30).

Havana, que abriga um quinto da população de 11,2 milhões de habitantes do país, até agora vinha sendo poupada dos cortes diários na luz, de ao menos quatro horas, que o resto da ilha sofre há meses.

A escassez tem provocado manifestações pontuais. O mesmo motivo permeou os protestos históricos de 11 de julho do ano passado, em meio a uma frustração mais ampla, com o agravamento que a pandemia de Covid impôs a problemas crônicos locais, como a falta de liberdades, o desabastecimento e dificuldades no acesso a saúde.

Imagem mostra duas pessoas jantando em cozinha sem energia elétrica
Mulher olha a tela do celular enquanto come à luz de velas, durante apagão na cidade de Havana, capital de Cuba - Yamil Lage - 25.mai.22/AFP

Na ocasião, o regime reprimiu os atos com brutalidade, e tentativas de replicá-los acabaram contidas por prisões e pressão para que opositores partissem para o exílio. Ainda hoje, 700 manifestantes continuam detidos à espera de julgamento.

O cronograma de cortes anunciado neste sábado prevê que cada uma das seis regiões de Havana tenha o fornecimento de eletricidade suspenso a cada três dias no horário de pico do meio-dia, de acordo com o jornal local do Partido Comunista.

As autoridades afirmam que a medida se dará em solidariedade aos demais cubanos, não por necessidade. Foram anunciados ainda um período de férias coletivas em estatais, o trabalho domiciliar e um corte de 20% nas alocações de energia para empresas privadas com alto consumo. O Carnaval, previsto para acontecer em agosto, foi cancelado.

Analistas, porém, afirmam que por trás da decisão está o fato de a rede elétrica cubana estar obsoleta e perto do colapso, num quadro agravado por incêndios recentes, que atingiram 2 das 20 usinas.

Os cortes registrados em pleno verão provocaram manifestações em pequenas comunidades. Veículos independentes reportaram atos no último dia 21 em Jagüey Grande, Matanzas, Caibarien e Sagua la Grande. Uma semana antes, dezenas de residentes de Los Palacios marcharam batendo panelas. Autoridades confirmaram que o protesto foi motivado pela falta de luz e disseram que não houve detidos ou atos de vandalismo.

Na pequena cidade de Jesús Menéndez, a AFP ouviu de moradores que a luz falta entre 8 e 10 horas diárias. "O que fazemos? Cozinhamos com carvão [vegetal] ou querosene, quando conseguimos", diz a dona de casa Gisela González, 54. Segundo dados oficiais, 68% dos lares cubanos usam fogões elétricos.

O líder da ditadura, Miguel Díaz-Canel, disse no dia 22 que os novos atos pontuais atendem à "contrarrevolução e aos que desejam nosso bloqueio", em alusão ao embargo dos EUA. Ele pediu aos cubanos compreensão e economia de eletricidade, já que a situação não teria solução imediata.

Segundo a estatal União Nacional Elétrica (UNE), 95% da energia do país é gerada por combustíveis fósseis —cujo preço disparou no mercado internacional, em meio à Guerra da Ucrânia e a inflação global.

O regime reconhece, ainda, que 19 dos 20 blocos de geração de energia que abastecem Cuba ultrapassam os 35 anos de vida útil, mas trabalhos de manutenção iniciados em maio e as constantes avarias deixam pouca margem de manobra. Com essa defasagem na estrutura, o consumo nos horários de pico chega à casa dos 2.900 megawatts, ultrapassando os 2.500 disponíveis e levando às quedas na distribuição.

Edier Guzmán, diretor da UNE, informou à imprensa estatal que a "situação de emergência vai se manter, com recuperação gradual".

Para o veterano dissidente Manuel Cuesta Morúa, os apagões são "o melhor aliado" da oposição e abrem espaço para a "expressão generalizada do mal-estar social acumulado". Como mostrou a Folha em abril, a repressão do regime aos atos de um ano atrás deixou a oposição na ilha fraturada.

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