Um enviado especial da ONU sobre escravidão moderna afirmou em relatório divulgado nesta terça-feira (16) que autoridades chinesas impuseram trabalhos forçados a pessoas de minorias muçulmanas na região autônoma de Xinjiang, no noroeste do país.
O regime comunista liderado por Xi Jinping é acusado de reprimir e deter mais de 1 milhão de uigures e integrantes de outras minorias, além de organizar trabalhos forçados e campanhas de esterilização. O governo dos Estados Unidos, por exemplo, acusa Pequim de praticar genocídio e crimes contra a humanidade na região.
O documento, assinado pelo relator Tomoya Obokata, cita depoimentos de vítimas, ONGs e centros de pesquisa e diz ser "razoável concluir" que minorias como uigures e cazaques estejam sendo submetidas a trabalhos forçados em setores como agricultura e manufatura —o que poderia ser configurado como escravidão.
O porta-voz da chancelaria chinesa Wang Wenbing negou as acusações e afirmou que Obokata "opta por acreditar nas mentiras e na desinformação fabricadas pelos EUA e outras forças anti-China".
O relatório aponta dois sistemas que envolveriam casos de trabalhos forçados ordenados pelo Estado. Um deles é um centro de formação profissional no qual as minorias são detidas e obrigadas a trabalhar, enquanto o segundo busca reduzir a pobreza por meio da transferência de mão de obra, com trabalhadores rurais excedentes sendo transferidos para setores secundário ou terciário.
"Embora esses programas possam criar oportunidades de emprego para minorias e aumentar sua renda, o relator especial considera que os indicadores de trabalho forçado que apontam para a natureza involuntária do trabalho prestado pelas comunidades afetadas estavam presentes em muitos casos", destaca o texto.
Segundo o documento, a natureza e o alcance do poder exercido sobre os trabalhadores —incluindo uma vigilância excessiva e condições de vida e trabalhistas abusivas— podem ser "equivalentes à escravidão como um crime contra a humanidade, algo que exigiria análises independentes".
O relatório ainda acrescenta que, no Tibete, existe um sistema de transferência de mão de obra parecido, pelo qual se "transfere agricultores, pastores e outros trabalhadores rurais para empregos de baixa qualificação e baixa remuneração".
O regime chinês diz que os centros de formação profissional de Xinjiang têm como objetivo combater o extremismo. Ao rebater o relatório de Obokata, o porta-voz da chancelaria insistiu que os direitos das minorias estão sendo protegidos e culpou o enviado especial da ONU por difamar o nome da China e agir como uma ferramenta política para as forças anti-Pequim.
Relatores especiais da ONU como Obokata são especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos, mas que não falam em nome da organização.
Em maio, a alta comissária das ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet, fez uma visita rara à China, que incluiu uma escala em Xinjiang para avaliar a situação das minorias muçulmanas.
Na ocasião, o governo dos EUA e organizações de defesa dos direitos humanos acusaram a chilena de não mostrar firmeza suficiente diante de Pequim. Um relatório sobre o tema deve ser publicado antes de ela deixar o cargo, no fim de agosto.
A visita, a primeira do tipo em 15 anos, coincidiu com a divulgação, dias antes, de milhares de documentos e imagens vazados de distritos policiais de Xinjiang, o que elevou a pressão para que a comunidade internacional imponha sanções ao regime de Xi Jinping.
Bachelet disse que a viagem não configurou uma investigação, mas uma chance de "conversar francamente" com as autoridades chinesas. Ela pediu a Pequim que reveja políticas antiterrorismo para evitar "medidas arbitrárias" contra minorias muçulmanas.
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