Bolsonaro leva ato de campanha ao funeral da rainha Elizabeth 2ª

Discurso a apoiadores e presença de pastor evangélico despertam críticas de oposição e imprensa internacional

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Londres e Guarulhos

O presidente Jair Bolsonaro (PL) seguiu o rito de outros chefes de Estado, visitando o caixão da rainha Elizabeth 2ª neste domingo (18) e assinando o livro de condolências da soberana. Antes, porém, fez de sua viagem a Londres um ato de campanha e discursou em tom eleitoral a um grupo de apoiadores.

Em ambas as ocasiões, Bolsonaro esteve acompanhado da primeira-dama, Michelle, transformada em peça-chave de sua campanha na corrida pela reeleição para conquistar principalmente o voto feminino. Na visita ao caixão, também esteve ao lado do pastor Silas Malafaia, aliado que integra a comitiva brasileira e a quem o presidente tem chamado de "conselheiro".

Presidente Jair Bolsonaro (PL), ao lado da primeira-dama, Michelle, e do pastor Silas Malafaia, no Palácio de Westminster, em Londres, onde está o caixão com o corpo da rainha Elizabeth 2ª - Chip Somodevilla/Pool - 18.set.22/AFP

Hospedado na casa do embaixador do Brasil em Londres, Bolsonaro foi à varanda e falou a um grupo de brasileiros vestidos de verde e amarelo que o recepcionaram com gritos de seus slogans de campanha. O presidente disse, entre outras coisas, que ganhará a eleição no primeiro turno, ainda que pesquisas de intenção de voto desenhem um cenário desfavorável a ele, atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O presidente também participou de uma recepção no Palácio de Buckingham, sede da realeza britânica. Ao lado de apoiadores que gritavam "o capitão chegou", disse que teve uma conversa breve com o rei Charles 3º, quando manifestou pesar pelo falecimento da rainha, ocorrido no último dia 8.

Em breve fala depois de assinar o livro de condolências, Bolsonaro disse que o Brasil guarda na memória a viagem de Elizabeth 2ª ao país em 1968. Na única passagem da soberana pelo Brasil, ela esteve com o então presidente Arthur da Costa e Silva, em cuja gestão foi decretado o Ato Institucional nº 5, que marcou o início do período mais repressor da ditadura militar.

O tom eleitoral da agenda despertou críticas da oposição e de ex-aliados. O ex-presidente Lula disse ser louvável que Bolsonaro tenha ido ao funeral, mas o acusou de usar o espaço para insuflar seus apoiadores com críticas a opositores. Entre as frases que Bolsonaro ecoou, estava "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão".

"Em vez de ir para o velório da rainha, seria mais louvável se ele tivesse visitado familiares e órfãos das vítimas da Covid e se tivesse comprado vacinas no tempo certo", escreveu Lula em uma rede social. A deputada federal Joice Hasselmann (PSDB-SP), ex-aliada de Bolsonaro, disse que o presidente "transformou o funeral da rainha em um palanque".

A postura também foi destacada na imprensa britânica. O jornal The Guardian, referindo-se ao presidente como "populista sul-americano", reportou que Bolsonaro expressou "profundo respeito" pela família real, mas logo mudou o discurso para a agenda de campanha.

Já o Daily Mail, no qual Bolsonaro é descrito como um governante populista de direita e integrante da lista de "líderes controversos" convidados para o funeral da rainha, relatou que o presidente fez uma espécie de comício. "Para ganhar pontos políticos em casa antes das próximas eleições", diz o texto.

A deputada Gleisi Hoffmann, presidente do PT, em linha semelhante, disse que Bolsonaro "faz campanha eleitoral numa viagem oficial, custeada com recursos públicos". "Viajam com o presidente pessoas que não são agentes públicos, mas cabos eleitorais dele; um abuso de poder político e econômico."

Além de Michelle e Malafaia, estavam com o presidente o padre Paulo Antônio de Araújo e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). "Essa consideração é impagável", escreveu Eduardo em uma publicação na qual aparece sorrindo e fazendo fotos com os brasileiros em Londres.

Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação da Presidência e coordenador da campanha bolsonarista, também esteve com o presidente no discurso feito na varanda do embaixador e nos encontros com apoiadores.

Malafaia tem sido exaltado por Bolsonaro como conselheiro de campanha. Como outras figuras que rodeiam o presidente, o pastor também dissemina teorias infundadas a apoiadores, a exemplo da ideia de que possa haver fraude no sistema de urnas eletrônicas.

Nas redes sociais, o evangélico publicou um vídeo com o embaixador brasileiro em Londres, Fred Arruda, no qual o diplomata diz ser uma "enorme honra ter Malafaia representando o Brasil" naquele momento, a despeito do fato de o país ser um Estado laico.

Levantando bandeiras conhecidas de seu governo e de sua trajetória política no Congresso, Bolsonaro falou a dezenas de apoiadores contra a legalização do aborto, a política de drogas e o que ele chama de "ideologia de gênero". Ainda que seu mandato deixe como herança o endividamento e o agravamento da dívida, disse que a economia vai bem e também realçou a biodiversidade do país, embora o desmatamento tenha avançado em seu governo.

Ele também voltou a usar um mote de origem fascista que se tornou um dos slogans de sua campanha. "O nosso lema é Deus, pátria, família e liberdade", afirmou, adicionando o termo "liberdade" à frase adotada por fascistas brasileiros da Ação Integralista e pela ditadura Salazar em Portugal.

Na terça (20), Bolsonaro estará em Nova York para participar da Assembleia-Geral da ONU, onde deve fazer o discurso de abertura. Nenhum encontro de peso, no entanto, está na agenda do presidente.

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