A Rússia teria enviado ao menos 6.000 menores ucranianos, com idades de quatro meses a 17 anos, para campos de reeducação política e os inserido no sistema de adoção, segundo um relatório financiado pelo Departamento de Estado dos EUA divulgado nesta terça-feira (14).
Pesquisadores da Universidade de Yale identificaram 43 campos ou instalações na Crimeia e na Rússia para onde foram levadas crianças ucranianas como parte de uma rede operada por Moscou desde o início da invasão da Ucrânia, que completará um ano em 24 de fevereiro.
Entre as crianças consideradas órfãs pela Rússia estão as que estavam em instituições ucranianas antes da invasão, as que estavam sob a tutela de algum parente e menores cuja tutela é incerta.
O relatório indica que pais ucranianos são pressionados a permitir o envio dos filhos aos campos com a promessa de retorno deles. No entanto, há relatos de famílias que perderam o contato com as crianças e de menores que permanecem nesses locais por um tempo muito maior do que o prometido.
A maior parte dos menores enviados para esses campos é das regiões de Donetsk e Lugansk. A criança mais nova identificada no programa russo tinha apenas quatro meses. Alguns menores foram colocados no sistema de adoção da Rússia e em orfanatos do país.
"O objetivo principal dos campos parece ser reeducação política", afirmou Nathaniel Raymond, diretor-executivo do Laboratório de Pesquisa Humanitária da Escola de Saúde Pública de Yale.
Formação militar e patriotismo cultural
Raymond chamou a atenção para o alcance geográfico "massivo" das atividades russas, já que os centros para onde crianças e adolescentes ucranianos são levados estão em várias partes do país, como na península da Crimeia, em Moscou, na região do mar Negro e na Sibéria. Inclusive há uma instalação desse tipo em Magadan, na costa russa do Pacífico, "mais perto dos EUA continental do que de Moscou".
Segundo o pesquisador, foi possível identificar cerca de 32 centros em que estão sendo feitos "esforços sistemáticos de reeducação" para dar às crianças formação militar e ensino de patriotismo cultural.
De acordo com a pesquisadora Caitlin Howarth, o treinamento militar consiste no manuseio de armas de fogo. "Temos imagens em vídeo e fotografias [dos menores] fazendo percursos com obstáculos, em treinos físicos, conduzindo viaturas e manuseando armas", disse. No entanto, Raymond afirma que não foram encontradas evidências de que essas crianças foram enviadas para a guerra.
Crime de guerra
Raymond afirma que há provas de que a Rússia violou a Convenção de Genebra e outros elementos da lei internacional sobre os direitos dos menores de idade e a proteção deles em conflitos armados.
O pesquisador diz ainda que transferir crianças com o propósito de mudar, alterar ou eliminar a identidade nacional pode ser uma evidência de que Moscou estaria cometendo o crime de genocídio na guerra.
Segundo ele, a Rússia adota um enfoque governamental para reeducar, reassentar e promover adoções forçadas de crianças ucranianas. "Isso é exatamente consistente com o que concluíram alguns dos primeiros julgamentos de nazistas nos tribunais de Nurembergue", afirmou.
O relatório aponta também que essa operação está sendo controlada pelo governo da Rússia e há agentes em todos os níveis governamentais envolvidos nela, incluindo o presidente Vladimir Putin.
Rússia diz que crianças fugiram da Ucrânia
A embaixada da Rússia em Washington afirmou, em resposta, que aceita crianças que foram forçadas a fugir da Ucrânia. "Fazemos o nosso melhor para manter menores com as famílias e, em caso de ausência ou morte de pais e parentes, para transferir os órfãos sob tutela". A embaixada acusou ainda a Ucrânia de atacar a infraestrutura civil das regiões ocupadas e negou mirar alvos civis no país invadido.
O relatório indica que 350 crianças ucranianas foram adotadas por famílias russas e mais de mil estão na fila da adoção. O documento pede a suspensão de processos de adoção de crianças ucranianas na Rússia e o acesso de um grupo internacional independente aos campos.
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