Descrição de chapéu União Europeia

Protesto contra reforma da Previdência na França bloqueia Louvre e frustra turistas

Grupo que cercou pirâmide de vidro que é cartão-postal de Paris antecede nova mobilização contra governo Macron

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Paris | Reuters

Manifestantes contrários à reforma da Previdência na França bloquearam a entrada para o Louvre, em Paris, nesta segunda-feira (27), para a decepção de dezenas de turistas que esperavam poder visitar um dos museus mais famosos do mundo.

Sua pirâmide de vidro —um cartão-postal da capital francesa— foi cercada por um pequeno grupo de pessoas que brandiam bandeiras dos sindicatos CGT (Confederação Geral do Trabalho) e Sud (Unidades Democráticas de Solidariedade) diante de uma faixa que dizia "aposentar-se aos 60 anos; trabalhar menos para viver mais tempo".

Manifestantes diante de pirâmide de vidro do Louvre, em Paris, bloqueiam entrada para o museu em protesto contra reforma da Previdência - Horaci Garcia/Reuters

Entre os manifestantes estavam funcionários do museu. Uma guia turística local chegou a sair do ato para conversar com os visitantes, afirmando esperar que eles entendessem as razões dos protestos.

Jane, uma turista vinda de Londres que não informou seu sobrenome, foi uma das que demonstraram compreensão em relação ao ato. "Todos nós gostaríamos de ir ver a 'Mona Lisa', mas não importa". Já Samuel, visitante mexicano, chamou a manifestação de ridícula. "Viemos de todas as partes do mundo com nossos filhos para visitar o museu, é ridículo que 20 pessoas estejam bloqueando a entrada."

A mobilização se dá um dia antes de uma nova rodada de greves e de marchas por todo o país, marcada para a terça-feira. Enquanto isso, a polícia de Paris afirmou estar realizando uma operação para impedir aglomerações não autorizadas diante do Centro Pompidou, outro museu de referência na cidade.

Aprovada há onze dias, a reforma previdenciária eleva a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos e prolonga os anos de contribuição dos franceses para acesso à pensão integral, de 42 para 43 anos. A reformulação ainda mexe nos chamados regimes especiais —aqueles dedicados a atividades consideradas mais penosas, como as de garis, bombeiros, policiais e enfermeiros, que podem se aposentar antes das demais categorias, teriam a idade mínima elevada de 57 para 59 anos.

Segundo o governo, a reforma representa uma economia de € 18 bilhões (cerca de R$ 101 bilhões). O movimento é, porém, repudiado pelos franceses, que prezam a qualidade de seu sistema público de segurança social.

A indignação popular ganhou ainda mais força nas últimas semanas devido a uma série de atos do presidente francês, Emmanuel Macron. Para começar, sua decisão de recorrer ao artigo 49.3 da Constituição para aprovar a reforma sem que ela precisasse ir à votação na Assembleia Nacional foi vista como antidemocrática pelos franceses.

O dispositivo constitucional, de baixa densidade democrática, foi uma aposta radical do governo diante das incertezas sobre a votação na Casa de uma reforma considerada crucial para as finanças públicas e para a agenda reformista de Macron, mas altamente contestada por deputados e pela população.

O "número maldito", apelido dado pelos franceses ao artigo 49.3, já havia sido acionado dez vezes pela primeira-ministra Elisabeth Borne desde o início de seu mandato, em 2022, sempre diante de impasses nas votações de projetos de lei no campo das finanças públicas.

A utilização do dispositivo em um caso controverso e que mobilizou tantos franceses como a reforma da Previdência, porém, teve resultados explosivos nas grandes cidades da França. Ainda que as manifestações tenham perdido volume de adesão, os protestos se radicalizaram.

Macron, ao comentar pela primeira vez a medida após sua aprovação, comparou a violência vista nas manifestações em seu país às invasões do Capitólio, em Washington, e das sedes dos Três Poderes, em Brasília —numa manobra retórica que coloca seus críticos sob a mesma categoria de ambos os episódios flagrantemente antidemocráticos.

A oposição à dupla Macron e Borne até tentou usar moções de censura, ferramentas previstas pela Constituição francesa, para frear o projeto impopular. A primeira delas, que foi apresentada por uma coalizão transpartidária, recebeu 278 dos 287 votos necessários para sua aprovação. A segunda moção, proposta pelo partido de ultradireita Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen, teve votação ainda menos expressiva, com 94 votos a menos do que a meta, uma vez que vários deputados favoráveis à medida declararam se recusar a votar numa iniciativa do RN.

Apesar disso, é justamente a ultradireita que pode tirar vantagem política do cenário de instabilidade social consolidado na França. Para analistas ouvidos pela Folha, ao afetar de maneira desproporcional, e sem compensação, as classes médias pouco qualificadas, que já se sentem os grandes perdedores das mais recentes mudanças econômicas globais, a reforma age diretamente no principal reservatório de votos dos partidos populistas como o de Marine Le Pen —derrotada por Macron no segundo turno da última eleição.

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