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Promotores tratam incêndio em centro de migração no México como possível homicídio

Gravação de câmera de segurança vazada mostra supostos funcionários do local aparentemente ignorando o fogo

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São Paulo

Um vídeo mostrando o começo de um incêndio em um centro de migração em uma cidade mexicana na fronteira com os Estados Unidos ocorrido na segunda-feira (27) provocou suspeitas de que agentes do local tenham sido coniventes com a morte dos 39 migrantes que tinham ficado presos no espaço. Nesta quarta (29), promotores mexicanos disseram que estão investigando o incidente como um possível homicídio.

Uma filmagem vazada de uma câmera de segurança do centro, administrado pelo Instituto Nacional de Migração (INM), registra os detentos posicionando colchões contra as grades de suas celas e ateando fogo a eles.

Segundo o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, a ação dos presos foi motivada pela descoberta de que seriam mandados de volta a seus países.

Supostos agentes de centro de migração em Ciudad Juárez, no México, aparentemente ignoram incêndio em cela em imagem retirada de vídeo de câmera de segurança do local - Reprodução/via Reuters

Duas pessoas que aparentam ser agentes uniformizados surgem então no quadro. Eles não parecem fazer nenhum esforço para abrir as celas, no entanto, enquanto um dos detentos dá chutes nas grades, desesperado.

Ao fim da gravação, a fumaça é tão densa que a cela não é mais visível. Vale notar que o vídeo dura apenas 30 segundos —não se sabe o que ocorreu antes e depois do recorte.

O vídeo teve sua veracidade confirmada pelo governo segundo a agência de notícias AP (Asssociated Press).

Os promotores identificaram oito possíveis responsáveis pela morte dos migrantes, afirmando que os funcionários não fizeram nada para salvar as vítimas durante o incêndio. Oficiais investigam ainda se havia alguma chave ou outra forma de quebrar as grades da cela onde o fogo foi ateado. "Claramente houve um crime grave", disse a ministra de Segurança do país, Rosa Icela Rodríguez.

Embora nenhuma detenção ainda tenha sido feita, o chefe da unidade de direitos humanos da Procuradoria-geral do México disse que quatro mandados de prisão serão solicitados ainda nesta quarta, e que outros serão emitidos na quinta.

A conivência dos funcionários com a tragédia seria corroborada pelo fato de que eles soltaram 15 mulheres no início do incêndio, mas não fizeram o mesmo com os homens. Uma migrante venezuela que perdeu o marido no episódio disse à agência que os detentos só foram soltos com a chegada dos bombeiros.

El Salvador criticou a aparente inação dos agentes mexicanos em um comunicado divulgado nesta quarta-feira (29). Doze dos migrantes mortos eram salvadorenhos —os outros vinham de Honduras, Venezuela, Colômbia, Equador e Guatemala. "Demandamos que as autoridades responsáveis investiguem com cuidado o ocorrido e levem os autores do crime à Justiça", afirma o governo da nação centro-americana no texto.

O ministro do Exterior mexicano, Marcelo Ebrard, disse que recebeu a informação de que os envolvidos no incidente estão sendo investigados. Obrador também se comprometeu a responsabilizar devidamente possíveis culpados em seu encontro regular com a imprensa nesta quarta.

Ainda há 28 pessoas em estado grave internadas em quatro hospitais da região, segundo o INM, a maioria aparentemente por inalação de fumaça. Os EUA se ofereceram para tratar algumas delas.

A cidade em que ocorreu o incêndio, Ciudad Juárez, é vizinha de El Paso, no Texas, e uma das principais portas de entrada para os EUA. Ela acumula milhares de migrantes nas ruas à espera de resposta para cruzar para o país.

São muitas as tensões com os agentes federais na região, e na véspera o INM havia realizado uma operação para retirar das ruas pessoas que aguardavam na cidade.

A situação local se agravou após duas políticas da era Donald Trump. A mais importante foi a Permaneça no México, que forçava os imigrantes, mesmo aqueles que tinham outras nacionalidades, a aguardarem do lado mexicano da fronteira a resposta aos pedidos de asilo.

A medida foi suspensa pelo atual presidente, Joe Biden, mas em dezembro um juiz federal ordenou que fosse retomada até que processos que os estados abriram na Justiça contra o governo fossem julgados.

A segunda política é a chamada Título 42 que, sob a justificativa de conter a circulação do coronavírus, permite a expulsão de migrantes sem que eles possam pedir asilo no país usando o argumento sanitário. Biden tentou derrubar a medida, mas a Suprema Corte a manteve em vigor.

Embora tenha sido eleito prometendo uma abordagem mais humana nas políticas migratórias, o democrata tem dado sinais controversos ao relançar medidas do seu antecessor. Em fevereiro, propôs uma nova regra que pressupõe como inelegíveis para a concessão de asilo pessoas que entrarem de forma irregular no país, a não ser que provem que tiveram o asilo negado em outras nações antes de cruzarem a fronteira.

"Na ausência de tal medida, o número esperado de migrantes viajando aos Estados Unidos sem autorização deve aumentar significativamente, a um nível que pode comprometer a habilidade dos departamentos [de Segurança Interna e de Justiça] de pôr em prática de forma segura, efetiva e humana a lei imigratória dos EUA", diz projeto da norma, que entrou em consulta pública.

Com AFP e Reuters

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