Descrição de chapéu União Europeia

Conselho Constitucional da França valida núcleo da reforma da Previdência de Macron

Aposentadoria aos 64 anos, ponto que levou milhões às ruas do país, foi chancelado pelo órgão

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Toulouse (França)

O cerco policial feito 24 horas antes de o Conselho Constitucional da França emitir seu parecer, nesta sexta (14), após 30 dias de análise do texto da reforma da Previdência do presidente Emmanuel Macron, parecia um mau presságio para os movimentos sociais que levaram milhões às ruas contra a proposta.

De fato, os chamados "sábios" que integram o órgão aprovaram a reforma com ressalvas, o que significa que uma parte da lei não está em conformidade com a Constituição francesa, mas eles mantiveram o ponto mais polêmico do contestado projeto de lei do governo francês: a aposentadoria aos 64 anos.

Manifestantes se reúnem em frente ao Hotel De Ville após tribunal aprovar elementos-chave da reforma da Previdência do presidente da França, Emmanuel Macron - Geoffroy Van Der Hasselt/AFP

Essa censura parcial configura uma vitória da dupla formada por Macron e pela primeira-ministra Élisabeth Borne, já que valida o elemento principal da reforma, permitindo promulgar a lei nas próximas duas semanas, depois de retiradas as passagens que não receberam o aval dos sábios.

Borne escreveu no Twitter que "o Conselho Constitucional julgou tanto a substância quanto o procedimento, a forma, em conformidade com a Constituição". "O texto chegou ao fim de seu processo democrático. Esta noite, não há vencedor nem perdedor."

Em 16 de março, quando o texto aprovado pelo Senado seguiu para uma votação incerta na Assembleia Nacional, Borne interrompeu a tramitação da reforma ao evocar o artigo 49.3 da Constituição Francesa.

O dispositivo, considerado pouco democrático, permite ao governo atropelar a votação parlamentar e aprovar automaticamente um projeto de lei de sua autoria. O recurso, apelidado de "número maldito", inflamou os protestos que ocorrem na França desde janeiro contra a proposta previdenciária do governo. Em seguida, o texto seguiu para a análise e parecer do Conselho Constitucional.

O projeto de reestruturação previdenciária de Macron e Borne aumenta a idade mínima para a aposentadoria de 62 para 64 anos até 2030 e prolonga os anos de contribuição de 42 para 43 anos já em 2027 como condição de acesso à pensão integral. O texto é rejeitado por cerca de 70% dos franceses.

Entre os dispositivos do projeto de lei censurados pelo Conselho Constitucional estão o chamado "índice sênior", em que empresas deveriam divulgar informações sobre as idades de seus empregados a partir deste ano e cuja não conformidade com a regra implicaria em sanções financeiras, e uma emenda dos senadores de direita que facilitaria a contratação de pessoas com mais de 60 anos de idade.

O conselho também negou o pedido feito por partidos de oposição acerca de um referendo sobre a reforma, que foi novamente solicitado e deve receber novo parecer em 3 de maio.

Mesmo antes da decisão do órgão ser anunciada, houve bloqueios em estradas e atos em várias cidades francesas, após a 12ª jornada de greves na véspera. Os protestos na quinta-feira reuniram 380 mil pessoas, segundo o Ministério do Interior, ou, de acordo com a junta intersindical que articula o movimento grevista, mais de 1,5 milhão.

Feito o anúncio, outros protestos eclodiram pela França, a começar pela frente do prédio do Conselho Constitucional, em Paris, onde foram feitas mais de 110 prisões. A estação de trem de Marselha foi fechada pelos trabalhadores, e as viagens foram canceladas. Em Estrasburgo houve confronto entre policiais e manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo. E quebra-quebras ocorreram em cidades como Toulouse, Nantes e Lyon.

"Estamos agora sobre um vulcão", disse Fabien Roussel, deputado e secretário-nacional do Partido Comunista Francês. "A luta continua e deve reunir suas forças", reagiu Jean-Luc Mélenchon, do partido de ultraesquerda França Insubmissa.

"O destino político da reforma da Previdência não está selado. O povo tem sempre a última palavra e cabe a ele preparar a alternância que virá dessa reforma inútil e injusta", afirmou Marine Le Pen, líder do partido de ultradireita Reunião Nacional, para o qual devem convergir nas próximas eleições os votos de eleitores ressentidos com as medidas.

O líder do Republicanos, Eric Ciotti, declarou, por sua vez, que "todas as forças políticas têm de aceitar a decisão do Conselho Constitucional e respeitar as nossas instituições".

A junta intersindical apelou a Macron para que não promulgue a reforma. O presidente havia convidado os líderes sindicais para um encontro na próxima terça-feira, mas, após o parecer do Conselho Constitucional, os sindicalistas afirmaram que não se encontrarão com ele antes do dia 1º de Maio.

O Conselho Constitucional é formado por nove membros: três nomeados pelo presidente, três pela Assembleia Nacional e três pelo Senado. Durante a apreciação do texto, o órgão recebeu apelos de diferentes siglas de oposição a Macron. Deputados da coalizão dos partidos de esquerda, Nupes, pediam que o conselho vetasse todo o texto devido ao tipo de projeto escolhido pelo governo para a reforma.

O chamado projeto de lei de financiamento de seguridade social retificadora, usado para a reforma da Previdência, limita o debate parlamentar a 50 dias e permite o recurso ao artigo 49.3 mais de uma vez por trâmite. Os deputados do Nupes também acusam o governo de pouca transparência nas informações transmitidas aos parlamentares durante os debates sobre o texto.

Deputados da ultradireita enviaram pedidos semelhantes ao Conselho Constitucional, enquanto um grupo de senadores socialistas, ecologistas e comunistas questionou, em representação ao órgão, o acúmulo "sem precedentes" de instrumentos processuais evocados para "forçar o Legislativo a adotar a lei".

À TV francesa, em março, Macron declarou que esperava ter a reforma previdenciária em vigor até o final deste ano. Para que isso ocorresse, no entanto, seria necessário que o Conselho Constitucional aprovasse o texto da reforma na sua integralidade, permitindo que ele fosse então promulgado e entrasse em vigor. "Vamos respeitar a decisão [do conselho]", completou o presidente na entrevista.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.