Ativistas antiaborto dos EUA celebram um ano da revogação da Roe vs. Wade

Mulheres contra direito à interrupção voluntária da gravidez querem ampliar proibição e reclamam de timidez dos políticos

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Ruth Graham
The New York Times

Faz um ano que Bethany Bomberger se reuniu do lado de fora do salão de um hotel com colegas ativistas antiaborto, tomada por gratidão e otimismo, quando surgiram as notícias de que a Suprema Corte havia derrubado Roe v. Wade horas antes da abertura oficial da Conferência Feminina Pró-Vida.

Emocionada, ela relembrou neste fim de semana o que descreveu como um momento em que "o impossível se tornou possível". Ela e o marido lideram uma organização que se opõe ao aborto e que, ultimamente, uniu-se ao combate à crescente aceitação da identidade transgênero.

Bethany Bomberger discursa em evento contra o aborto no Missoui
Bethany Bomberger discursa em evento contra o aborto no Missoui - Marta Payne - 23.jun.23/The New York Times

Com a abertura da conferência deste ano, Bomberger subiu ao palco em um modesto centro de convenções suburbano nos arredores de St. Louis. "Quem está aqui comigo para soltar a voz?", perguntou à multidão, levando várias centenas de mulheres na onda. "Temos a vida do nosso lado!" Ela usava um pequeno colar de ouro onde se lia "mamãe", um presente de seu filho.

A decisão eliminou o direito nacional ao aborto e mandou a questão de volta aos estados. Embaralhou o cenário nos EUA, fechando clínicas, levando outras a abrir e estabelecendo novas batalhas sobre pílulas abortivas e contracepção. Os abortos legais caíram mais de 6% nos primeiros seis meses após a decisão.

Para aqueles que acreditam que o aborto é a destruição de vidas inocentes e passaram anos lutando para acabar com ele, 24 de junho agora marca "um grande dia na história de nosso país", diz Shawn Carney, presidente e CEO da 40 Days for Life. A organização é copatrocinadora de um comício de aniversário de Dobbs no Lincoln Memorial em Washington, onde uma multidão de pessoas se reuniu na manhã de sábado (24) para ouvir Mike Pence e Alveda King, sobrinha de Martin Luther King Jr. "O trabalho pela vida continua", disse Pence, que prometeu fazer do aborto uma peça central de sua campanha à Presidência.

Redi Degefa, que mora em Washington e trabalha como funcionária do Congresso, diz que foi ao comício para mostrar que as jovens estão representadas no movimento antiaborto. Ela conta que saiu há dois anos da faculdade, é católica e carregava uma placa que dizia "reze o rosário para acabar com o aborto".

"É uma celebração e um lembrete de que temos que manter a energia que tivemos nos últimos 50 anos –temos que duplicá-la", diz ela. "Não será uma vitória enquanto o aborto não for abolido nos 50 estados."

Aqueles a favor do direito ao aborto também usaram o fim de semana para angariar apoio em eventos em todo o país. Muitos se reuniram em estados liderados pelos democratas, como Califórnia e Nova York, mas também houve comícios na Flórida, cujo Legislativo aprovou recentemente a proibição da maioria dos abortos após seis semanas, enquanto uma disputa jurídica avança no estado.

No sábado, uma multidão de defensores do direito ao aborto se reuniu do lado de fora da Union Station, em Washington. Os palestrantes do evento, organizado pela Marcha das Mulheres, enfatizaram o apoio ao acesso ao aborto entre republicanos e independentes. Kristin Rowe-Finkbeiner, diretora do grupo progressista MomsRising, foi muito aplaudida quando pediu às mães que se identificassem.

No salão de exposições neste fim de semana em Missouri, as mesas exibiam adesivos de para-choque, pulseiras de oração e pilhas de livros para colorir "Crianças Pró-Vida". Freiras de hábito se misturavam a moças com camisetas com os dizeres "ame selvagemente" e "a vida tem objetivo". Uma estação de selfies ostentava uma placa de neon com a inscrição "pró-mulher e pró-vida".

Os participantes foram convidados a "ir vestidos com sua melhor roupa de 1972 ou 2022" a uma festa dançante, uma referência ao ano anterior à decisão de Roe e ao ano em que o tribunal voltou atrás.

"Fico muito feliz em saber que estou dançando para comemorar a derrubada de Roe", disse Danielle Pitzer, diretora de santidade da vida humana na Focus on the Family. Ela tinha levado um "vestido disco" caleidoscópico com lantejoulas, com sapatos de plataforma e uma tiara. Embora muitas mulheres lamentassem a perda do direito nacional ao aborto, as conservadoras –especialmente as jovens– impulsionaram o movimento contra o aborto e o infundiram com a energia renovada de sua geração. Para elas, foi um momento de celebração e de reconhecimento dos novos desafios à frente.

Alguns no movimento são céticos de que Dobbs represente uma vitória clara. Destiny Herndon-De La Rosa, fundadora do pequeno grupo antiaborto New Wave Feminists, estava numa conferência organizada pelo National Right to Life no ano passado quando o tribunal proferiu sua decisão. A sala explodiu em euforia, quase em pânico, disse ela. Seus próprios sentimentos foram mais mistos.

"Não resolveu nada nem fez nada, apenas criou o caos", disse ela. Algumas das novas leis estaduais não incluíam exceções para estupro ou incesto, diz, acrescentando que desde então surgiram "histórias de terror" nas quais as mulheres tiveram seus cuidados negados devido a complicações na gravidez.

"Os pró-vida podem ter vencido a batalha, mas não vão vencer a guerra" a menos que escrevam leis melhores e defendam uma rede de segurança social mais abrangente. Erros "poderiam facilmente levar à codificação dos direitos ao aborto". A anfitriã da conferência no Missouri, Abby Johnson, é uma ex-diretora de clínica da Planned Parenthood que agora é uma proeminente ativista antiaborto. Johnson fala sobre os desafios enfrentados pelo movimento, incluindo a relutância geral dos candidatos presidenciais republicanos, exceto Pence, de discutir o assunto em público.

"Não sei por que alguns políticos se afastam do aborto quando claramente o usam como uma ferramenta de arrecadação de fundos", diz ela. "Eles vêm arrecadando fundos nas costas de bebês há décadas, e agora que Roe se foi vão fingir que o aborto não é mais um problema?"

No palco, ela havia alertado sobre o aumento do aborto medicamentoso e sobre a dedicação do movimento pelo direito ao aborto de "nunca parar de matar bebês". "Acabamos de ter uma grande vitória", disse ela à multidão extasiada. "Vamos continuar vencendo."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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