O direito à liberdade de expressão permite que uma designer evangélica se recuse a criar produtos para casais gays, decidiu nesta sexta (30) a Suprema Corte dos EUA, na semana do Orgulho LGBTQIA+. A decisão, dizem críticos, pode abrir caminho para a proteção jurídica de diferentes tipos de discriminação.
O processo envolve Lorie Smith, do Colorado, que desafiou uma lei estadual que proíbe a discriminação em negócios comerciais. Ela tentava garantir que sua empresa de design de sites não seja obrigada a desenvolver páginas para casais de pessoas do mesmo sexo, com o argumento de que tinha esse direito com base na Primeira Emenda da Constituição, que garante a liberdade religiosa e de expressão.
O argumento foi acatado por seis dos nove juízes da corte. "A Primeira Emenda prevê os Estados Unidos como um lugar rico e complexo onde todas as pessoas são livres para pensar e falar como quiserem, não como o governo exige", escreveu o magistrado Neil Gorsuch na decisão.
Em voto discordando da maioria, a juíza Sonia Sotomayor afirmou que, "ao dar licença para discriminação em um caso trazido por uma empresa que procura negar a casais do mesmo sexo seus serviços de forma ampla e igualitária, o efeito simbólico dessa decisão é marcar gays e lésbicas como cidadãos de segunda classe". "Essa decisão estigmatiza, além de provocar qualquer dano por um serviço recusado."
Em nota, o presidente Joe Biden chamou a decisão de "decepcionante" e disse que "nenhuma pessoa deve enfrentar discriminação por ser quem é ou por quem ama." "A decisão enfraquece leis de longa data que protegem todos os americanos contra a discriminação em locais públicos –incluindo minorias raciais, pessoas com deficiência, religiosos e mulheres." Ele pediu que o Congresso aprove um projeto que transforme em lei proteção de direitos civis de minorias LGBT+.
A decisão é mais um reflexo da maioria conservadora da Suprema Corte atingida na era Donald Trump. O tribunal tem seis juízes conservadores e três progressistas, que refletiram o placar desta sexta.
O caso foi decidido um dia após a mesma maioria do tribunal reverter entendimentos anteriores e determinar que universidades não podem considerar a raça dos candidatos em processos de admissão, encerrando assim as políticas de ações afirmativas para incentivar o ingresso de minorias raciais no ensino superior. Há um ano, em junho de 2022, outra decisão crucial da corte mudou entendimento de quase 50 anos e passou a considerar que o acesso ao aborto não é um direito constitucional.
Na terça (27), outra decisão baseada na Primeira Emenda reverteu a condenação de um homem que enviou milhares de mensagens pelo Facebook —incluindo frases antes interpretadas como ameaças de morte— a uma cantora que nunca encontrou pessoalmente. Na decisão, sete dos nove juízes afirmaram que ameaças não estão protegidas pela liberdade de expressão, mas defenderam que a emenda "requer provas de que o réu tinha entendimento subjetivo da natureza ameaçadora das declarações".
No caso desta sexta, a designer, dona da empresa 303 Creative, argumentou que atender casais gays iria contra sua crença religiosa. Para tal, porém, ela esbarrava na Lei Antidiscriminação do Colorado, que proíbe empresas abertas ao público de negar atendimento por raça, gênero, orientação sexual e religião.
Críticos argumentam que a conduta não está sujeita às leis que envolvem liberdade de expressão, que protegem indivíduos, mas às que regulam relações comerciais no Colorado, onde esse tipo de discriminação é proibido. A designer foi defendida pela Alliance Defending Freedom, grupo religioso que também representa um confeiteiro processado por se recusar a fazer um bolo para um casamento gay.
"O governo pode forçar um redator democrata a escrever discursos promovendo o Partido Republicano? Ou forçar um ateu a cantar no culto de Páscoa de uma igreja? A resposta é um sonoro não. O governo não pode forçar os americanos a promover pontos de vista com os quais discordam", afirma a entidade.
"É isso que está acontecendo com Lorie Smith", argumenta. "O Colorado aprovou uma lei que exige que ela crie mensagens que violem suas crenças fundamentais, inspiradas pela fé que anima sua criatividade."
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