Putin ameaça Polônia com maior ataque no oeste da Ucrânia

Em dia de megadesfile militar em Varsóvia, russo alveja área que diz ser de interesse polonês

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São Paulo

Em um recado direto à Polônia, a Rússia de Vladimir Putin realizou o maior ataque com mísseis de longa distância contra alvos no oeste da Ucrânia desde que invadiu o país vizinho, há quase um ano e meio.

A região, que Putin diz sem provas estar na mira de uma intervenção de Varsóvia por sua proximidade e laços históricos com o país da Otan, a aliança militar ocidental, foi alvejada nesta terça (15), dia em que os poloneses fizeram o maior desfile de suas Forças Armadas desde que eram satélite da União Soviética.

Bombeiros trabalham em prédio incendiado após ataque russo a Lviv, na Ucrânia
Bombeiros trabalham em prédio incendiado após ataque russo a Lviv, na Ucrânia - Serviço Estatal de Emergência da Ucrânia no Facebook via Reuters

Foram lançados pelo menos 28 mísseis de cruzeiro em uma madrugada de frenética movimentação nas redes sociais ucranianas, que alertavam às 3h (21h em Brasília) que havia um número recorde de bombardeiros estratégicos no ar na Rússia —foram registradas decolagens de 16 Tu-95MS, 2 Tu-22M3 e de 1 Tu-160, o maior e mais pesado modelo no mundo, raramente empregado na guerra.

Essas aeronaves lançaram, da região do mar Cáspio, a quase 2.000 km do oeste ucraniano, mísseis da família Kh-101. Também houve disparos de mísseis Kalibr de fragatas no mar Negro. Modelos subsônicos, esses armamentos são mais facilmente interceptados: Kiev disse ter destruído 16 dos 28.

Tanques americanos M1A1 Abrams comprados pela Polônia são preparados para o desfile em Varsóvia
Tanques americanos M1A1 Abrams comprados pela Polônia são preparados para o desfile em Varsóvia - Kapcer Pempel - 10.ago.23/Reuters

Mas os que caíram causaram danos consideráveis em Lviv, a maior cidade da região, e três pessoas morreram na fábrica de rolamentos da marca sueca SKF em Lutsk, 150 km a nordeste. Houve outros ataques na Ucrânia, mas o grosso foi concentrado nessa região que faz fronteira com a Polônia, distante da frente principal de batalha no leste e no sul do país, onde se arrasta a contraofensiva de Kiev.

A escolha da data não foi fortuita. Nesta terça, no Dia das Forças Armadas, a Polônia fez uma exibição de força: 2.000 soldados poloneses e de outros países da Otan desfilaram com os recém-comprados tanques americanos M1A1 Abrams e sul-coreanos K2 Black Panther. Lançadores de foguetes americanos Himars e de defesa antiaérea Patriot, em uso na Ucrânia, estavam presentes, assim como 92 aviões e helicópteros.

"Essa parada será diferente. Mostraremos o progresso da modernização do Exército polonês", disse no domingo o chefe da Defesa, Mariusz Blaszczak. O país acelerou seu gasto militar e promete despender 4% do PIB com o setor neste ano, o maior índice da Otan, que preconiza no mínimo 2% como meta.

Há simbolismo também. O dia celebra os 103 anos da vitória polonesa sobre o Exército Vermelho, ainda antes da formação da União Soviética na Batalha de Varsóvia, que manteve o país independente até ser partido pelos ditadores Josef Stálin e Adolf Hitler em um acordo secreto em 1939, antes do início da Segunda Guerra Mundial.

Após a vitória dos Aliados no conflito, em 1945, o país ficou na linha de frente da disputa entre Moscou e Ocidente, sendo enfim controlada por comunistas aliados a Moscou. O Reino Unido propôs que terras hoje na Ucrânia fossem integradas à Polônia, incluindo a cidade de Lviv, atacada nesta terça-feira, que ao longo dos séculos esteve várias vezes sob controle de Varsóvia —esta é a origem das acusações de Putin.

Stálin se recusou, e ao fim os poloneses perderam cerca de 20% do território pré-guerra, com a chamada linha Curzon marcando a sua fronteira com a Belarus e a Ucrânia soviéticas. O governo polonês acabou tornando-se um dos principais satélites comunistas no Leste Europeu, servindo de zona tampão entre a Otan e a União Soviética na Guerra Fria, uma função estratégica que Putin vê para Kiev.

Após a queda do comunismo local, em 1989, a Polônia dez anos depois virou um dos mais aguerridos membros da Otan. Foi o primeiro país do clube a dar caças à Ucrânia, modelos antigos soviéticos MiG-29.

Está em disputa com a Belarus, ditadura aliada ao Kremlin, por temer a infiltração de membros do Grupo Wagner abrigados lá após o motim fracassado contra a cúpula militar de Putin. Pede armas nucleares americanas em seu território para fazer frente à instalação do mesmo armamento pelos russos no vizinho.

Por fim, há um componente local na flexão de musculatura militar polonesa: o partido PiS (Lei e Justiça, na sigla local) disputará eleições parlamentares em 15 de outubro e tentará manter o poder que detém desde 2015. A oposição acusa a sigla de usar os gastos militares para fins políticos, alimentando a crise com a Rússia e a Belarus como forma de galvanizar apoio. O PiS, nacionalista de direita, tem promovido reformas autoritárias que lhe valeram críticas na União Europeia, bloco que também integra.

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