Descrição de chapéu guerra israel-hamas

Assembleia-Geral da ONU aprova resolução que pede trégua humanitária imediata

Documento, contudo, serve apenas como recomendação; Brasil votou a favor, e Israel e EUA votaram contra

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Washington

Enquanto Israel expandia uma incursão terrestre em Gaza, a Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou nesta sexta-feira (27) uma resolução que pede uma trégua humanitária imediata. O documento foi capitaneado pela Jordânia, em conjunto com os países árabes e islâmicos, e tem caráter apenas recomendatório, não mandatório.

O placar foi de 120 votos favoráveis, 14 contrários e 45 abstenções. Para ser aprovada pela Assembleia-Geral, que abrange os 193 membros da ONU, uma resolução precisa do apoio de dois terços dos Estados presentes e votantes —que somavam 179 nesta sexta.

O Brasil votou favoravelmente. Votaram contra Áustria, Croácia, República Tcheca, Fiji, Guatemala, Hungria, Israel, Ilhas Marshall, Micronésia, Nauru, Papua Nova Guiné, Paraguai, Tonga e Estados Unidos.

O representante de Israel na ONU, Gilad Erdan, faz discurso na Assembleia-Geral - REUTERS

Em comparação com as quatro resoluções apresentadas no Conselho de Segurança, que falhou em aprová-las, o texto da Jordânia se aproxima mais dos elaborados pela Rússia, com uma linguagem mais dura contra Israel e sem nenhuma menção ao Hamas, cujos ataques foram condenados e descritos como terroristas nas resoluções feitas pelo Brasil e pelos EUA.

Uma emenda apresentada pelo Canadá pediu a inclusão de um trecho em que o grupo terrorista é condenado pelos ataques de 7 de outubro e pelo sequestro de reféns. O adendo também pedia a soltura imediata e incondicional dos capturados. A emenda, no entanto, foi rejeitada ao não obter dois terços de apoio: teve 88 votos favoráveis, incluindo do Brasil, 55 contrários e 23 abstenções.

O texto final aprovado também pede respeito ao direito internacional, enfatizando a proteção de civis, e o suprimento de bens e serviços básicos, como água e combustível, à Faixa de Gaza.

Chamando Israel de "Poder Ocupante", a resolução demanda que Tel Aviv revogue a ordem de retirada de civis do norte de Gaza e "rejeita firmemente qualquer tentativa de transferência forçada da população civil palestina".

O embaixador israelense na ONU, Gilad Erdan, chamou a resolução de "ridícula"; o pedido de trégua imediata, de "audácia", e disse que o país continuará a se defender e usar todos os recursos ao seu alcance para tal —indicando que a votação desta sexta não vai alterar em nada as operações de Tel Aviv.

Ele voltou a atacar as Nações Unidas, dizendo que este dia será lembrado como uma infâmia pela história, e que é a prova de que a organização não tem mais "um pingo de legitimidade e relevância".

"É dever desse órgão nomear terroristas pelo nome. Por que vocês estão defendendo assassinos? Por que vocês estão defendendo terroristas? O que está acontecendo aqui?", questionou o diplomata.

Diante da preocupação verbalizada por diversos países, inclusive pelos aliados americanos, com a situação humanitária em Gaza, Erdan afirmou que Israel está monitorando a situação de perto, e que não há uma crise segundo os parâmetros do direito humanitário. Ele criticou ainda oficiais da ONU e outros Estados por acreditarem nos números divulgados por autoridades palestinas que, segundo ele, são controladas pelo Hamas.

A convocação da Assembleia-Geral acontece diante da paralisia do Conselho de Segurança, instância máxima das Nações Unidas, formado por 15 membros, sendo 10 eleitos e 5 permanentes —estes, com poder de veto. Responsável pela garantia da paz e segurança internacional, o grupo fracassou até o momento em dar uma resposta à escalada de violência no Oriente Médio.

Quatro resoluções foram postas em votação: duas pela Rússia, que não obtiveram o mínimo de votos necessários; uma pelo Brasil, que teria sido aprovada não fosse o veto dos EUA; e outra pelos EUA, que também teria passado, embora com menos votos do que a brasileira, mas foi vetada por Rússia e China.

"Nós ainda acreditamos que nossa primeira proposta de resolução poderia ter sido o melhor resultado possível para o conselho quando nós a apresentamos", afirmou nesta sexta o embaixador brasileiro na ONU, Sérgio Danese, durante a sessão da Assembleia-Geral.

A representante americana, Linda Thomas-Greenfield, fez duras críticas à resolução jordaniana, sobretudo pela falta de menções ao Hamas e aos reféns. Ela ainda usou o púlpito para atacar os russos, que, segundo ela, apresentaram textos unilaterais e de má-fé no Conselho de Segurança. "Resoluções parciais são documentos puramente retóricos que buscam nos dividir em um momento em que devemos nos unir."

O representante da Arábia Saudita fez um duro discurso. "Diante do cerco, dos assassinatos e do fracasso da comunidade internacional em pedir um cessar-fogo para permitir a entrada de ajuda humanitária, nós expressamos nosso descontentamento com a parcialidade e a seletividade ao lidar com essa crise, e lamentamos a hesitação de apoiar o direito do povo palestino de viver uma vida digna", afirmou Abdulaziz Alwasil.

O representante da União Europeia, Olof Skoog, por sua vez, criticou o uso de vetos pelos membros permanentes e o fracasso do conselho em cumprir sua missão. Ele ainda fez um apelo contra a desinformação e contra conteúdos ilegais espalhados nas redes sociais sobre o conflito, apontando que as plataformas digitais têm uma responsabilidade legal em combater esse problema.

Diferentemente dos textos votados na Assembleia-Geral, uma resolução aprovada pelo Conselho de Segurança tem caráter mandatório, ou seja, quem descumpri-la pode ser punido. O Brasil trabalha agora em uma quinta proposta de texto para apresentar ao colegiado, em conjunto com os demais membros não permanentes, na tentativa de driblar um veto de EUA, Rússia e China —França e Reino Unido também têm poder para derrubar resoluções, mas não fazem uso da prerrogativa desde 1989.

A resolução foi aprovada como um produto da décima sessão de emergência, iniciada em 1997 a pedido do Qatar e convocada de modo intermitente em momentos de agravamento do conflito entre Israel e Palestina desde então.


Veja a íntegra do texto aprovado:

A Assembleia Geral,

Guiada pelos propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas,

Recordando suas resoluções relevantes sobre a questão da Palestina,

Reafirmando a obrigação de respeitar e garantir o respeito ao direito humanitário internacional em todas as circunstâncias, de acordo com o artigo 1 das Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949,

Recordando as resoluções relevantes do Conselho de Segurança, incluindo as resoluções 242 (1967), 338 (1973), 446 (1979), 452 (1979), 465 (1980), 476 (1980), 478 (1980), 904 (1994), 1397 (2002), 1515 (2003), 1850 (2008), 1860 (2009) e 2334 (2016),

Recordando também as resoluções do Conselho de Segurança sobre a proteção de civis em conflitos armados, incluindo crianças em conflitos armados,

Expressando grave preocupação com a mais recente escalada de violência desde o ataque de 7 de outubro e a grave deterioração da situação na região, especialmente na Faixa de Gaza e no restante do Território Palestino Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental, e em Israel,

Condenando todos os atos de violência contra civis palestinos e israelenses, incluindo todos os atos de terror e ataques indiscriminados, bem como todos os atos de provocação, incitamento e destruição,

Recordando a necessidade de respeitar os princípios de distinção, necessidade, proporcionalidade e precaução na condução das hostilidades,

Enfatizando que os civis devem ser protegidos, de acordo com o direito humanitário internacional e o direito internacional dos direitos humanos, e lamentando, a esse respeito, as pesadas baixas civis e a destruição generalizada;

Enfatizando a necessidade de buscar responsabilidade, e destacando a importância de garantir investigações independentes e transparentes de acordo com padrões internacionais,

Expressando grave preocupação com a situação humanitária catastrófica na Faixa de Gaza e suas vastas consequências para a população civil, composta principalmente por crianças, e enfatizando a necessidade de acesso humanitário completo, imediato, seguro, sem obstáculos e contínuo,

Expressando forte apoio aos esforços do Secretário-Geral das Nações Unidas e a seus apelos para acesso imediato e irrestrito de ajuda humanitária para atender às necessidades básicas da população civil palestina na Faixa de Gaza, sublinhando a mensagem do Secretário-Geral de que alimentos, água, medicamentos e combustível precisam ser fornecidos em escala, e expressando seu apreço pelo papel crítico desempenhado pelo Egito a esse respeito,

Expressando forte apoio também a todos os esforços regionais e internacionais destinados a alcançar uma cessação imediata das hostilidades, garantir a proteção de civis e fornecer ajuda humanitária,

Recordando que uma solução duradoura para o conflito israelo-palestino só pode ser alcançada por meios pacíficos, com base nas resoluções relevantes das Nações Unidas e de acordo com o direito internacional,

  1. Solicita uma trégua humanitária imediata, duradoura e sustentada, que leve a uma cessação das hostilidades;

  2. Exige que todas as partes cumpram imediatamente e integralmente suas obrigações de acordo com o direito internacional, incluindo o direito humanitário internacional e o direito internacional dos direitos humanos, especialmente no que diz respeito à proteção de civis e objetos civis, bem como à proteção de pessoal humanitário, pessoas hors de combat e instalações e ativos humanitários, e para permitir e facilitar o acesso humanitário para o fornecimento de suprimentos e serviços essenciais a todos os civis necessitados na Faixa de Gaza;

  3. Exige também o fornecimento imediato, contínuo, suficiente e sem obstáculos de bens e serviços essenciais para civis em toda a Faixa de Gaza, incluindo, mas não se limitando a, água, comida, suprimentos médicos, combustível e eletricidade, enfatizando o imperativo, de acordo com o direito humanitário internacional, de garantir que civis não sejam privados de objetos indispensáveis à sua sobrevivência;

  4. Solicita acesso humanitário imediato, completo, sustentado, seguro e sem obstáculos para a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo e outras agências humanitárias das Nações Unidas e seus parceiros implementadores, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e todas as outras organizações humanitárias, respeitando os princípios humanitários e prestando assistência urgente a civis na Faixa de Gaza, encoraja o estabelecimento de corredores humanitários e outras iniciativas para facilitar a entrega de ajuda humanitária a civis, e saúda os esforços nesse sentido;

  5. Solicita também a revogação da ordem de Israel, a Potência Ocupante, para que civis palestinos e pessoal das Nações Unidas, bem como trabalhadores humanitários e médicos, evacuem todas as áreas na Faixa de Gaza ao norte do Wadi Gaza e se desloquem para o sul da Faixa de Gaza, recorda e reitera que civis são protegidos pelo direito humanitário internacional e devem receber assistência humanitária onde quer que estejam, e reitera a necessidade de tomar medidas adequadas para garantir a segurança e o bem-estar de civis e sua proteção, em particular de crianças, e permitir seu livre movimento;

  6. Rejeita firmemente qualquer tentativa de transferência forçada da população civil palestina;

  7. Solicita a libertação imediata e incondicional de todos os civis que estão sendo ilegalmente mantidos em cativeiro, exigindo sua segurança, bem-estar e tratamento humano em conformidade com o direito internacional;

  8. Solicita respeito e proteção, de acordo com o direito humanitário internacional, de todas as instalações civis e humanitárias, incluindo hospitais e outras instalações médicas, bem como seus meios de transporte e equipamentos, escolas, locais de culto e instalações das Nações Unidas, bem como todo o pessoal humanitário e médico, jornalistas, profissionais de mídia e pessoal associado em conflitos armados na região;

  9. Enfatiza o impacto particularmente grave que o conflito armado tem sobre mulheres e crianças, incluindo como refugiados e pessoas deslocadas, bem como outros civis que possam ter vulnerabilidades específicas, incluindo pessoas com deficiência e idosos;

  10. Enfatiza também a necessidade de estabelecer urgentemente um mecanismo para garantir a proteção da população civil palestina, de acordo com o direito internacional e as resoluções relevantes das Nações Unidas;

  11. Enfatiza ainda a importância de um mecanismo de notificação humanitária para garantir a proteção das instalações das Nações Unidas e todas as instalações humanitárias, bem como para garantir o movimento não impedido de comboios de ajuda;

  12. Enfatiza a importância de prevenir a desestabilização e a escalada da violência na região e, nesse sentido, apela a todas as partes a exercer o máximo de contenção e a todos aqueles que têm influência sobre elas a trabalhar para esse objetivo;

  13. Reafirma que uma solução justa e duradoura para o conflito israelo-palestino só pode ser alcançada por meios pacíficos, com base nas resoluções relevantes das Nações Unidas e de acordo com o direito internacional, com base na solução de dois Estados;

  14. Decide adiar temporariamente a décima sessão especial de emergência e autorizar o Presidente da Assembleia Geral na sua sessão mais recente a retomar a reunião mediante solicitação dos Estados-Membros.

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