Ambientalistas pedem que Portugal cancele projetos de lítio após renúncia de premiê

Escândalo de corrupção que envolve extração do minério gerou nova crise política; chefe de agência ambiental é investigado

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São Paulo

O escândalo de corrupção que motivou a renúncia do primeiro-ministro de Portugal, António Costa, na segunda-feira (7) aumentou a pressão de entidades e ambientalistas contra a exploração de lítio no país, atividade no centro das atuais investigações.

Em nota conjunta publicada nesta terça (8), oito grupos que já eram contrários à extração do mineral exigiram o cancelamento imediato de todos os projetos de mineração de lítio, estejam eles em fase de prospecção, de avaliação ou de exploração.

Primeiras páginas de diversos jornais portugueses em banca de jornal estampam renúncia do primeiro-ministro António Costa, na capital Lisboa
Primeiras páginas de diversos jornais portugueses em banca de jornal estampam renúncia do primeiro-ministro António Costa, na capital Lisboa - Patricia de Melo Moreira/AFP

As associações argumentam que as ações de busca desencadeadas pela polícia lusa no dia anterior "tornam claro que suas suspeitas sempre tiveram legitimidade". Elas fazem referência às acusações de falta de transparência nos processos de licenciamento e exploração mineira que vinham fazendo.

"Os projetos devem ser imediatamente cancelados, sob pena de se permitir afetar territórios e populações com base num processo corrupto e pouco claro, que de forma nenhuma tem o bem-estar das populações ou do ambiente como preocupação primeira", alegam.

Entidades como a Montalegre com Vida e a Povo e Natureza do Barroso afirmam que a transição energética em Portugal, necessária, foi capturada por um "mecanismo de negociatas entre amigos, que vai desde o plano de fomento mineiro à criação de um 'hub' do lítio".

O minério, essencial para a produção de baterias de carros elétricos, tem sido uma das principais apostas de Portugal e de outros países da União Europeia para promover a transição energética e diminuir sua dependência externa na área, em especial em relação à China.

Neste sentido, mesmo a América Latina, onde há reservas consideráveis, tem sido um campo de interesse e barganha europeus, que enfrentam também competição com americanos e chineses.

Portugal, com suas mais de 60 mil toneladas métricas de lítio, é o país com maior reserva do minério em toda a Europa, e sua exploração tem crescido, em especial na porção norte. Agora, o minério está no centro da investigação iniciada pela Procuradoria-Geral.

Há suspeitas de irregularidades na concessão e na extração do minério no município de Montalegre, no norte do território. Também está no foco do caso o hidrogênio verde, com suspeitas sobre a atuação do governo em um grande projeto a ser realizado em Sines, porto importante no sudoeste.

As investigações miram uma série de figuras próximas ao socialista António Costa, entre elas seu chefe de gabinete, Vítor Escária, além do consultor Diogo Lacerda Machado, seu amigo pessoal.

Após a polícia realizar uma série de buscas em endereços suspeitos na manhã de terça-feira, o premiê anunciou sua renúncia. Espera-se que novas eleições gerais sejam convocadas para janeiro.

Ainda na nota, as oito associações dizem que o governo atual tem demonstrado em relação à "contestação legítima por parte das populações" sobre o lítio e que isso "evidencia que este processo não tem em mente os melhores interesses das pessoas ou do país".

Os grupos também criticam a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), que afirmam trabalhar em prol de empresas mineradoras em vez de fiscalizá-las. A acusação, aliás, foi outra que escalou após o nome do presidente da agência, Nuno Lacasta, ser mencionado pelo Ministério Público como um dos "arguidos" —acusados formalmente— no caso, bem como o do ministro das Infraestruturas luso, João Galamba.

No início deste ano, a APA concedeu autorizações para que a empresa local Lusorecursos extraia lítio e para que a londrina Savannah Resources desenvolva mais quatro minas a céu aberto. Todos os projetos estariam situados no norte do país, área central das investigações, segundo informações da agência de notícias Reuters.

Também nesta quarta, o presidente luso, Marcelo Rebelo de Sousa, a quem coube aceitar formalmente a renúncia do premiê, iniciou conversas com diferentes partidos políticos para entender os próximos passos.

Rebelo poderia dar ao Partido Socialista, sigla que tem maioria no Parlamento, a chance de tentar formar um novo governo, ou então pode dissolver o Parlamento e convocar eleições. Analistas projetam que a segunda opção é a mais viável —e provável. O presidente fará um discurso nesta quinta-feira (9), quando espera-se que anuncie a decisão e possivelmente já convoque o novo pleito.

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