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The New York Times Estados Unidos

Trump cria manual de vitimização para transformar reveses em capital político

Ex-presidente usa dezenas de acusações criminais e derrotas na Justiça como ferramenta eleitoral para se promover

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Maggie Haberman
The New York Times

Pode levar semanas para descobrir se a decisão da Suprema Corte do Colorado de declarar Donald Trump inelegível para constar nas cédulas das eleições primárias estaduais será mantida.

Mas o impacto político foi imediato e ficou claro quando Trump deixou o palco de um comício agendado na noite da terça-feira (19), no estado de Iowa, ao saber da sentença.

Aliados do ex-presidente chegaram a postar em redes sociais que a deliberação foi um ultraje, algo que a Suprema Corte dos Estados Unidos precisaria corrigir.

Donald Trump em palco, com palanque, e bandeiras norte-americanas ao fundo.
Candidato à presidência e ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump em evento de campanha em Iowa - Scott Olson/Getty Images

A Suprema Corte do Colorado concluiu que Trump incitou uma insurreição em 6 de janeiro de 2021 e deveria ser impedido de concorrer com base na 14ª Emenda à Constituição. O ex-presidente pode permanecer nas eleições, apesar disso —os juízes do Colorado mantiveram a decisão em suspenso à espera dos recursos, mas a equipe do candidato não se atentou a esse detalhe.

Mesmo que Trump permaneça na cédula eleitoral, qualquer tribunal que tenha afirmado que ele incitou uma insurreição será usado contra ele em uma eleição geral, de maneira que seus assessores sabem que pode ser prejudicial.

Mas a primária republicana é diferente. Funcionários das campanhas rivais do ex-presidente temiam que a decisão fosse vista como um excesso por parte dos democratas, algo que poderia fortalecer sua liderança atual entre os republicanos nas prévias de Iowa em 15 de janeiro e nas primárias que se seguirão.

Ao longo dos anos, eventos que prejudicariam outros políticos tiveram, na melhor das hipóteses, um impacto limitado no avanço de Trump, com a notável exceção de sua derrota na eleição de 2020 para Joe Biden. Em 2023, o ex-presidente fez de eventos que teriam prejudicado outros candidatos material político —como ter sido indiciado quatro vezes, em 91 acusações de crimes graves— com um eleitorado republicano que foi informado de que os democratas ameaçam seu modo de vida.

Desde março, Trump aprimorou um manual de vitimização, arrecadando fundos de campanha com cada acusação e incentivando autoridades republicanas a defendê-lo. Muitos, incluindo alguns que temem sua influência sobre os eleitores centrais do partido, têm obedecido.

Democratas e os poucos republicanos que querem ver Trump impedido descreveram seus problemas legais como resultado de suas próprias ações, destacando os detalhes dos crimes dos quais é acusado. As violações variam amplamente e incluem acusações de conspiração para fraudar os Estados Unidos com meses de mentiras eleitorais destinadas a subverter a transferência de poder, bem como acusações relacionadas à manipulação de documentos sigilosos.

No entanto, Trump repetidamente reduziu todos esses casos a uma "caça às bruxas" que estaria visando interromper sua candidatura em vez de responsabilizá-lo. Ele e seus aliados já estão incorporando a decisão do Colorado a essa mesma narrativa.

Donald Trump, que ascendeu na política em 2011 propagando uma mentira de que o presidente Barack Obama, o primeiro presidente negro dos EUA, talvez não fosse elegível para servir, agora se vê lidando com sua própria elegibilidade após as consequências de suas ações após a derrota em 2020.

Enquanto a maioria dos republicanos rejeitou as mentiras sobre Obama, muitos apoiam a alegação de Trump de ter sido prejudicado.

Mesmo pessoas que não gostam intensamente de Trump temem que a decisão de retirá-lo da eleição apenas o ajude com um eleitorado republicano que verá isso como interferência no processo eleitoral, em um momento em que os democratas o descrevem regularmente como uma ameaça à democracia.

"Isto valida a insistência dele de que isso é uma conspiração política para interferir na eleição", disse Ty Cobb, que trabalhou como advogado na Casa Branca de Trump e desde então condenou seu comportamento, à CNN. "É assim que ele tenta vender isso", acrescentou o ex-funcionário que zombou dessa alegação de uma conspiração ampla, mas mesmo assim previu que a Suprema Corte dos EUA pode reverter unanimemente a decisão do Colorado.

A campanha de Trump divulgou por email essa parte da entrevista. "RETIRADO DA ELEIÇÃO - REAJA!", era o assunto de um segundo email de arrecadação de fundos de Trump horas depois.

Trump não falou sobre a decisão em seu comício em Iowa, mas outros republicanos preencheram o vazio por ele. Seus oponentes do mesmo partido —os poucos que restam de um campo antes lotado— mais uma vez foram deixados tendo que equilibrar-se em torno do homem que estão tentando vencer.

O governador Ron DeSantis, governador da Flórida, zombado diariamente pela equipe de Trump e que luta para substituir o ex-presidente como a nova geração do movimento MAGA (sigla em inglês para "faça a América grandiosa novamente"), poderia muito bem ter articulado a própria defesa de Trump em sua declaração.

"A esquerda invoca a 'democracia' para justificar seu uso do poder, mesmo que signifique abusar do poder judicial para remover um candidato da eleição com base em fundamentos legais espúrios. A Suprema Corte deveria reverter", escreveu DeSantis em uma publicação nas redes sociais.

Chris Christie, ex-governador de Nova Jersey, cuja mensagem principal é que Trump não é adequado para o cargo, disse que os eleitores, não os tribunais, deveriam decidir se ele é presidente.

Nikki Haley, ex-governadora da Carolina do Sul, que teve ganhos significativos em pesquisas recentes, fez uma declaração semelhante.

Vivek Ramaswamy, o mais vocalmente pró-Trump de todos os candidatos nesta eleição, disse que se retiraria da eleição do Colorado a menos que Trump fosse restaurado.

A equipe de Trump está confiante de que essa restauração acontecerá. Privadamente, vários de seus assessores concordaram com a avaliação do ex-advogado de que a Suprema Corte dos EUA analisará seu apelo e ficará ao lado dele. Resta saber se isso acontecerá ou se os juízes decidirão deixar a decisão em pé. Se escolherem a última opção, processos semelhantes provavelmente seriam apresentados em outros estados, embora uma série de ações baseadas na 14ª Emenda já tenha falhado em outros lugares.

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