Descrição de chapéu Eleições na Venezuela

Diáspora venezuelana na Colômbia cobra Maduro, 'o ditador', e Petro, 'o ambíguo'

País tem a maior população de emigrados em fuga do chavismo; grupo sai às ruas para condenar ditador, mas também cobrar posição mais dura do presidente colombiano

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Bogotá

Prestes a completar 15 anos, Cielo tinha aula de balé dali a 40 minutos, mas ela e a mãe, Caroline Prieto, 46, fizeram um desvio neste sábado (3) para comparecer à Praça de Bolívar, em Bogotá. Foram protestar ao lado de venezuelanos que, como as duas, se viram forçados a deixar seu país e cruzar a fronteira, a maior por terra, rumo à Colômbia.

Cielo carregava uma bandeira venezuelana e um cartaz com o desenho de três band-aids, cada um com uma das cores nacionais: "Venezuela, vamos te curar".

Diáspora venezuela protesta na Praça de Bolívar, em Bogotá, contra Nicolás Maduro
Diáspora venezuela protesta na Praça de Bolívar, em Bogotá, contra Nicolás Maduro - Luis Acosta/AFP

Junto ao pai e ao irmão caçula de Cielo, a família partiu de Maracaibo, a terra do petróleo venezuelana, em 2018. "No começo era tudo novo, não conhecíamos ninguém, tivemos que deixar nossos familiares e amigos. Agora já conheci muita gente que não é xenófoba", relata a adolescente em meio ao som das vuvuzelas.

A família, porém, gostaria de retornar. Caroline é engenheira civil e trabalha hoje como instrutora de ioga. O marido é arquiteto. Os filhos, estudantes. É na Maracaibo natal que está a casa própria e um negócio que por 25 anos a família do marido tocou no ramo veterinário —às traças desde 2018, o ápice da crise econômica na Venezuela.

A opção de voltar estaria aberta apenas se o vencedor fosse Edmundo González. A anunciada vitória de Maduro, contestada pela oposição, fez famílias como a de Cielo se frustrarem. Caroline tentou votar, mas foi impedida porque, embora imigrante legal e cidadã na Colômbia, está com o passaporte venezuelano vencido.

Cielo, 14, e sua mãe, Caroline Prieto, 46, durante concentração de protesto contra Nicolás Maduro na Praça de Bolívar, em Bogotá
Cielo, 14, e sua mãe, Caroline Prieto, 46, durante concentração de protesto contra Nicolás Maduro na Praça de Bolívar, em Bogotá - Mayara Paixão/Folhapress

A Colômbia é o principal destino da diáspora venezuelana. Hospeda mais de 2,8 milhões dos 7,7 milhões de migrantes e refugiados, seguida por Peru (1,5 milhão) e Brasil (568 mil). É como se toda a população de Guarulhos e de Campinas, juntas, tivesse se mudado para solo colombiano.

Esse contingente cria uma pressão que começa a ser sentida não apenas pela ditadura de Maduro, mas também pelo próprio governo colombiano, de Gustavo Petro, prestes a chegar a metade de seu mandato.

Caroline e a maioria dos que estavam ali criticam as atitudes de Petro diante da eleição presidencial na Venezuela. Com o Brasil e o México, a Colômbia é o negociador internacional mais importante da crise em Caracas.

Para muitos imigrantes, Petro tem sido muito comedido diante de Maduro, que intensificou a repressão. "No momento em que tinha que falar e nos defender como povo, Petro não nos apoia abertamente", diz a cuidadora de idosos Nieves Mendoza, 54. Do estado venezuelano de Táchira, está na Colômbia há sete anos.

Primeiro emigrou o genro, que então trouxe filha e neta. Ela partiu meses depois. Quer voltar a seu país para se reunir com seu outro filho e o neto de 6 anos de quem está distante. Mas não sob Maduro.

Até aqui a manifestação mais dura de Petro sobre a situação na Venezuela foi pedir que Maduro permita um escrutínio transparente dos votos, com divulgação das atas, participação de todas as forças políticas na auditoria e uma observação internacional profissional.

Mas muitos imigrantes o descrevem como ambíguo por não ir além. Do lado colombiano, os argumentos são os de que é preciso respeitar a soberania venezuelana e de que o governo pode negociar, mas não romper qualquer diálogo com Caracas em um momento no qual Maduro já se isolou diplomaticamente.

Para o pesquisador Ronal Rodríguez, diretor do Observatório de Venezuela da Universidade de Rosário, em Bogotá, "os governos democráticos de esquerda na região são um dos principais caminhos para dialogar com a Venezuela", e por isso é importante que Petro mantenha a porta aberta.

Em especial porque o chavismo tem controle de todos os Poderes na Venezuela. Mesmo em um cenário muito hipotético no qual a oposição assuma o Executivo, teria de negociar com um Legislativo e um Judiciário dominados pelos aliados de Maduro. "É preciso uma saída negociada."

A Colômbia prevê que nas próximas semanas comece a receber um fluxo maior de venezuelanos. Pesquisas apontaram que a população do vizinho desejaria emigrar caso o regime seguisse no poder.

Além de lar para a diáspora, a Colômbia é também o principal país de passagem. A facilidade para se cruzar a fronteira terrestre faz com que milhares de venezuelanos viajem ao país para imediatamente ou após alguns meses seguirem rumo ao norte para os Estados Unidos, passando pela perigosa selva de Darién.

Entre os venezuelanos, já há quem compare Petro aos chavistas. Há, claro, um estigma grande em torno do presidente, um ex-guerrilheiro que foi eleito democraticamente em 2022. Mas suas ações fazem muitos reviverem partes dos anos de Hugo Chávez (1954-2013).

Com dificuldades para aprovar suas reformas no Congresso, Petro tem insistido que o país precisa de uma Assembleia Constituinte para fazer uma nova Carta. Uma das primeiras medidas de Chávez na Venezuela foi justamente mudar a Constituição.

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