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A venda direta de etanol dos produtores para os postos de combustível no varejo deve ser permitida? NÃO

Mais custo, menos qualidade

Caminhão carregado de cana atravessa canavial em Luís Antônio (SP)
Caminhão carregado de cana atravessa canavial em Luís Antônio (SP) - Joel Silva - 12.mai.17/Folhapress
Leonardo Gadotti Filho

Antes de mais nada, é preciso dizer que as usinas de etanol podem vender seu produto diretamente aos postos. Para isso, basta que tenham uma distribuidora, como, aliás, muitas já possuem. Dessa forma, são capazes de cumprir todas as regras e normas definidas pelo órgão regulador e não abrem uma lacuna na estrutura tributária em vigor.

Quanto à proposta aprovada em um processo que correu em regime de urgência no Senado, sem que houvesse nenhuma discussão envolvendo as partes, é importante esclarecer que a Unica (entidade que representa mais de 60% da produção de etanol), a Plural e a Brasilcom, que representam as distribuidoras, e a Fecombustíveis e o Sincopetro, que reúnem mais de 40 mil revendedores, são contra. Resta saber a reação do consumidor quando descobrir que o custo e a qualidade do produto não estarão garantidos.

O setor de combustíveis tem uma agência reguladora, a ANP, a quem compete definir as regras desse mercado. O modelo atualmente em vigor foi criado no fim da década de 90, a partir da divisão de responsabilidades entre os setores de produção, distribuição e revenda, de forma a criar uma estrutura sólida que garantisse o abastecimento de combustíveis de maneira segura e consistente ao longo dos 365 dias do ano em todo o Brasil, o recolhimento de impostos, a segurança no transporte e a qualidade do produto a ser distribuído e vendido.

Dentro desse modelo, que busca com o uso das melhores práticas e tecnologias garantir um produto de qualidade ao consumidor com custos competitivos, as distribuidoras, além de manter um negócio de logística integrado, que contempla transporte ininterrupto, seja rodoviário, dutoviário, ferroviário e aquaviário, respondem ainda pela manutenção de estoques em terminais e bases de distribuição em todo o país.

Com isso, ao longo do ano, independentemente das sazonalidades e safras, o suprimento está garantido. Como uma usina, que deve ter como princípio o foco em eficiência de produção e plantio, vai substituir esse sistema logístico criado ao longo de décadas de investimento?

Um estudo recente da consultoria Leggio demonstra que o modelo de venda do etanol da usina direto para o posto aumentaria os custos de transporte por perda de escala em R$ 467 milhões ao ano. São estimados ainda outros R$ 410 milhões de custos administrativos e operacionais a serem incorporados às usinas. Ao todo, quase R$ 880 milhões de custos adicionais e ineficiências.

Outro ponto de grande importância é que recentemente tivemos aprovado pelo governo federal o programa RenovaBio, que colocará o Brasil entre os países com políticas de redução de emissões das mais modernas do mundo.

Esse programa de redução de emissões e fomento à produção de biocombustíveis é ancorado nas distribuidoras, já que elas são a parte obrigada do sistema, e como tal precisarão cumprir as metas. Com a implementação desse projeto de venda direta, o RenovaBio simplesmente fica inviabilizado.

A proposta aprovada em regime de urgência no Senado, agora em tramitação na Câmara, não vai modernizar ou trazer mais competitividade ao mercado de combustíveis no Brasil.

Pelo contrário, trará atraso, na medida em que perderemos um programa como o RenovaBio e teremos fuga de investimentos, potencial de sonegação e aumento de custos e ineficiências em toda a indústria. É disso que o Brasil precisa?

Leonardo Gadotti Filho

Engenheiro civil e presidente da Plural (Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Lubrificantes, Logística e Conveniência)

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