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O que a Folha pensa

A destruição de Palmares

Ao segregar livros, presidente de fundação ligada a movimento negro degrada ainda mais sua função

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Sérgio Camargo promove expurgo de livros tidos como esquerdistas na Fundação Cultural Palmares
Sérgio Camargo com livros excluídos no expurgo - Reprodução/Twitter

O atual presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, já deu demonstrações suficientes de despreparo para a função que ocupa. A dissintonia não é estranha ao governo de Jair Bolsonaro (PL), que se dedica, em muitas frentes, mais à destruição do que à construção institucional.

Os exemplos são vários e saltam aos olhos em setores mais suscetíveis à estratégia da chamada guerra cultural. Trata-se de enfrentar a suposta ameaça de um marxismo fantasmagórico que se infiltraria nas instituições e na cultura para destruir valores tradicionais.

Camargo talvez seja a face mais caricata e degradante desse padrão, que prosperou na Educação, no Ambiente e no Itamaraty, entre outros setores e órgãos do atual governo —caso notório da Cultura, na qual se inscreve a fundação.

Dedica-se o gestor a fazer o triste papel de um homem negro que nega o racismo estrutural e atribui aos próprios negros as situações adversas que enfrentam em razão de discriminações. Declarações como as que ridicularizam o Dia da Consciência Negra falam por si.

Camargo, contudo, não se contenta com seus disparates retóricos. Procura efetivar o desmonte da fundação com medidas estapafúrdias, como a tentativa de banir obras da biblioteca da instituição por representarem "temática não negra, francamente marxista".

Autores como os economistas Celso Furtado e Maria da Conceição Tavares entraram na lista de banidos do burocrata, ao lado de nomes como o historiador Marco Antonio Villa, um conhecido crítico de visões de esquerda.

Impedido pela Justiça de se desfazer das obras, Camargo criou uma seção para confiná-las, em cuja porta afixou os dizeres "Acervo da Vergonha", com uma estrela vermelha e o símbolo da foice e do martelo.
Outra de suas obsessões é mudar o nome da fundação, trocando a referência ao quilombo liderado por Zumbi, no período colonial, por uma homenagem à Princesa Isabel, que assinou a Lei Áurea.

Camargo seria apenas uma figura deprimente e insignificante não estivesse no comando de um órgão que foi criado em decorrência de reivindicações de movimentos de defesa dos direitos de negros no momento em que o Brasil promulgava uma nova Constituição, em 1988, e procurava deixar para trás os anos de ditadura militar.

De um gestor tão disfuncional e desprovido de qualidades nada de construtivo se pode esperar.

editoriais@grupofolha.com.br

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