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Mais uma farra

Gasto com indenizações a procuradores expõe dificuldade para limitar privilégios

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O procurador-geral da República, Augusto Aras - Jefferson Rudy/Agência Senado

De tempos em tempos, a revelação de despesas milionárias com altos servidores choca os menos familiarizados com os privilégios das corporações da elite do Estado.

Desta vez, noticiou-se que o pagamento de verbas indenizatórias no Ministério Público Federal atingiu R$ 123 milhões no ano passado, acima dos montantes de 2020 (R$ 110 milhões) e 2019 (R$ 109 milhões), em valores corrigidos.

A exorbitância da cifra fica mais evidente quando se observam casos individuais: como publicou O Estado de S. Paulo, há contracheques mensais acima dos R$ 400 mil. O próprio procurador-geral da República, Augusto Aras, recebeu R$ 70 mil em indenizações.

Os valores são obviamente muito maiores que os já vultosos salários dos procuradores, que chegam a R$ 37,3 mil —enquanto o teto oficial para todo o serviço público brasileiro é de exatos R$ 39.293,32.

Tal limite é descaradamente contornado, em especial nos órgãos do sistema de Justiça, por meio de auxílios, abonos e outros penduricalhos extrassalariais que se tornam parte da remuneração efetiva e são tidos como direitos adquiridos por seus beneficiários.

No Ministério Público Federal, a benesse mais custosa —somando R$ 63,4 milhões em 2021— foi a conversão da esdrúxula licença-prêmio (o direito a três meses de descanso remunerado a cada cinco anos de trabalho) em dinheiro, conforme autorizado em 2017 pelo conselho nacional da instituição.

Práticas do gênero não têm apenas impacto simbólico —o que não seria pouco. Elas contribuem para que a despesa pública brasileira com o aparato judicial (Judiciário, Ministério Público, defensorias e advocacia) chegue a 1,5% do Produto Interno Bruto, patamar não encontrado em nenhum outro país.

Os abusos são mais difíceis de combater quando seus beneficiários têm o poder de decisão. Em 2014, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal estendeu um auxílio-moradia de R$ 4.377 mensais a todos os magistrados e procuradores, incluindo os que residiam na cidade onde trabalhavam.

A norma absurda só foi revista em 2018 —e sob a condição de que o teto salarial do funcionalismo fosse reajustado em 16,38%.

São exemplos que recomendam algum ceticismo quanto a tentativas de regulamentar o teto, há anos em debate no Congresso Nacional. Um projeto já aprovado pelo Senado foi modificado pela Câmara dos Deputados no ano passado e retornou à Casa de origem.

Parece difícil levar os parlamentares, muito suscetíveis ao lobby dos servidores, a aprovar um texto rigoroso. Mais ainda, é improvável que as corporações não venham a buscar novos meios de driblar os limites a seus privilégios.

editoriais@grupofolha.com.br

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