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Clara Serva e Maria Paula Bonifácio

Visibilidade trans

Novo protocolo do CNJ facilita compreensão de agentes da Justiça sobre tema

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Clara Serva e Maria Paula Bonifácio

Respectivamente, sócia responsável e advogada da área de Empresas e Direitos Humanos de TozziniFreire Advogados

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou recentemente o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, uma iniciativa no enfrentamento da violência de gênero que, com frequência, é compreendida como violência contra a mulher.

O momento é muito apropriado: 2021 foi marcado por luzes e sombras. O ano em que se celebrou 15 anos da Lei Maria da Penha teve também um sensível aumento dos feminicídios e de violência doméstica.

Segundo o Datafolha, 1 em cada 4 mulheres com mais de 16 anos sofreu violência na pandemia, e 48% a vivenciaram dentro de casa. Também no ano passado, o Brasil foi responsabilizado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por discriminação no acesso à Justiça ao se omitir de investigar e julgar a partir da perspectiva de gênero no caso de Márcia Barbosa de Souza.

Entre muitos acertos, o novo protocolo ressalta a pluralidade de mulheres: pretas, com deficiência, quilombolas, indígenas, idosas e LGBTQIA+. Em que pese a gravidade do tema (17 milhões de casos em 2020, segundo estudo publicado em 2021 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública), os perigos e discriminações são diferentes para cada mulher. Pretas e pardas, por exemplo, são a maioria das vítimas de violência (54%).

Mas o protocolo joga luz em outra transversalidade pouco discutida e com a mais grave vulnerabilidade: as pessoas transgênero. Reconhece a identidade e a expressão de gênero como intrínsecas à pauta de gênero e legitima o acesso à Justiça de pessoas trans, esclarecendo que "é possível nascer do sexo masculino, mas se identificar com características tradicionalmente associadas ao que culturalmente se atribuiu ao sexo feminino e vice-versa, ou então, não se identificar com gênero algum".

Relembra que o Supremo Tribunal Federal reconheceu que as pessoas trans podem mudar nomes e gênero no registro civil sem necessidade de decisão judicial ou de cirurgia de redesignação. Aponta que, em fevereiro de 2021, a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) recomendou que o Brasil investigue, processe e sancione, com uma perspectiva de gênero e com prioridade, as violações aos direitos humanos de mulheres e meninas, especialmente de mulheres trans.

O documento ainda aborda as peculiaridades das discriminações sofridas por diferentes mulheres em ambiente de trabalho, tema que já está na pauta das cortes. A 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) condenou, em 2021, uma empresa ao pagamento de danos morais por entender que houve dispensa discriminatória em razão de identidade de gênero, ressaltando que é papel das empresas contribuir com uma sociedade mais justa e inclusiva.

Apesar dos avanços, o Brasil segue como um dos piores países para pessoas trans, com altos índices de violência, baixa expectativa de vida (35 anos), falta de acesso a direitos e oportunidades. No mês da visibilidade trans, deve-se destacar iniciativas como a do CNJ: o protocolo facilita a compreensão de agentes da Justiça sobre o tema, dando passo importante para a conscientização do Judiciário e buscando pouco a pouco afastar as mazelas sociais que tanto invisibilizam as pessoas trans.

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