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Douglas Belchior, Mariana Belmont e Sheila de Carvalho

COP27 precisa ter conexão com a vida real

Negar o racismo ambiental é negar que o Estado brasileiro é racista

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Douglas Belchior

Historiador, cofundador da Uneafro Brasil e da Coalizão Negra Por Direitos

Mariana Belmont

Jornalista, militante da Uneafro Brasil e diretora de Clima e Cidade no Instituto de Referência Negra Peregum

Sheila de Carvalho

Advogada, diretora de Incidência Política no Instituto de Referência Negra Peregum e integrante da Coalizão Negra Por Direitos

Na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), ocorrida em 2021 em Glasglow, na Escócia, a participação histórica do movimento negro centralizou o racismo no debate sobre o clima e as desigualdades sociais como parte fundamental da agenda sobre os impactos das mudanças climáticas.

A partir de domingo (6), participaremos de mais um momento importante: a COP27, no Egito, onde serão negociadas as ambições para uma transição energética de eliminação das matrizes de combustíveis fósseis, prevendo limitar em 1,5ºC a temperatura do planeta até 2050. A conferência na África acontece logo após um relatório das Nações Unidas, publicado no último dia 27, mostrar que todas as promessas climáticas feitas na COP26 não tiveram nada de ambiciosas: elas precisariam ser, no mínimo, 40 vezes maiores para dar à humanidade uma chance de cumprir a meta do Acordo de Paris.

Por outro lado, no último dia 25, a relatora especial da ONU Tendayi Achiume acrescentou no Relatório sobre Mudanças Climáticas e Justiça Racial a contribuição feita pela Coalizão Negra Por Direitos sobre a situação de racismo ambiental enfrentada no Brasil e nos países do sul global. O documento confirma que a crise ecológica mundial é simultaneamente uma crise de justiça racial. O mundo tem demonstrado a importância de trazer o debate racial para o centro da negociação climática, o que ainda não encontra ampla adesão —ou é negado— pelos movimentos ambientalistas no Brasil, assim como falta racializar as políticas públicas ambientais.

Como resultado, temos a falta de segurança ambiental nos territórios urbanos e rurais de maioria populacional negra. A crise climática é também humanitária e tem impacto direto na vida das populações negras, quilombolas e indígenas. No Brasil, a maioria é negra e representa hoje 56% da população (IBGE, 2020). Negar o racismo ambiental é negar que o Estado brasileiro é racista. É negar a história de urbanização do país e suas profundas desigualdades territoriais.

Estaremos presentes e usaremos o espaço para exigir financiamento climático para mitigação, adaptação e um fundo separado para perdas e danos. Será simbólico sair do Brasil, onde os direitos humanos estão constantemente em risco, e chegar em um país que não esconde sua antipatia a manifestações sociais e tem histórico difícil com os direitos humanos.

No último domingo (30), o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deu o tom para a agenda ambiental que pretende seguir. Falou em seu discurso sobre mudanças climáticas, aquecimento global, floresta em pé, proteção de todos os biomas e proteção e qualidade de vida para as populações mais afetadas pelo racismo ambiental. Não poderia ter sido mais enfático o compromisso. Ainda há esperança. E começaremos essa reconstrução agora: nos encontraremos na COP27 e seguiremos em luta.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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