Descrição de chapéu
Andrea del Fuego

Centenário de José Saramago

Autor busca a palavra onde as pessoas estão presentes, simultâneas aos seus dizeres

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Andrea del Fuego

Escritora, mestre em Filosofia (USP). Traduzida em nove países, autora de nove livros, entre eles "Os Malaquias", vencedor do Prêmio José Saramago.

Ao longo deste ano, comemoramos o centenário do escritor José Saramago. Celebração que se espalhou em diversos países, onde vida e obra foram revisitadas.

Conhecido por obras como "Ensaio sobre a Cegueira", "Memorial do Convento", "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", entre outros, é também lembrado por sua posição ética.

O escritor português José Saramago, em imagens do livro 'Os Seus Nomes', da Companhia das Letras - Fernando Peres Rodrigues/Divulgação

Espécie de Sócrates português, arrastou suas sandálias e a beira das vestes pelo caminho da ironia pedagógica. Usa a ironia e sua prima metáfora operando simultaneamente o desvio e o empréstimo de uma palavra para chegar à outra. Apontando algum sentido para logo depois confrontá-lo, sempre rodeando a grande questão: o que é a justiça?

No Brasil, o autor é lido, relido e continuamente citado. Para alguns leitores, Saramago é uma leitura difícil, encarar a linguagem do autor seria atravessar o que se entenderia por erudição.

Interessante é que é da terra, da fala dos avós analfabetos, que Saramago também retira o diapasão de sua narrativa, uma escrita basculante que nos inclina tanto para a astúcia da língua, quanto para a oralidade.

Há erudição na oralidade. O autor busca a palavra onde as pessoas estão presentes, simultâneas aos seus dizeres. A fala onde ela nasce, na garganta, na lavoura, em Galileia vendo um menino receber a culpa como herança paterna, no consultório de um oftalmologista que será o primeiro a ficar cego, no amor de um casal que guarda o segredo dos condenados.

Outra marca do autor é o ceticismo, talvez a melhor forma de preservar a esperança, os pés no combate real, o peso do tempo, a queimadura das transformações históricas, a finitude concreta e de prontidão.

A autonomia é uma conquista coletiva, nunca individual, é temeroso colocar o futuro em ilusões e altares. Um autor que merece ser lido sem pressa, sem guia turístico, mapa ou as abstrações deste texto.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.