O Banco Central precisou divulgar carta aberta para expor os motivos de o IPCA de 2022, com variação de 5,79%, ter ficado acima da meta oficial de 3,5% com margem de desvio de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.
Foi a sétima vez em que a autoridade monetária teve de cumprir esse ritual em 24 anos do regime de metas de inflação —o que, à primeira vista, poderia colocar em dúvida a eficácia de tal estratégia de política monetária. O saldo do mecanismo adotado desde 1999, porém, é amplamente favorável.
Conforme as explicações do BC, a variação dos preços estourou os limites no ano passado devido à herança do ano anterior, ao encarecimento global das commodities, agravado pela guerra na Ucrânia, e ao impacto da retomada dos serviços e do emprego após o pior da pandemia de Covid-19.
Ao listar as providências em curso para conter as pressões inflacionárias, o órgão não deixa de mencionar as incertezas relativas ao desequilíbrio orçamentário do governo —para o qual contribuíram, acrescente-se, Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Por uma questão de bom senso, o BC não buscou cumprir a ferro e fogo as metas para o IPCA de 2021, quando o índice marcou 10,06%, e 2022. Isso exigiria taxas de juros exorbitantes e produziria recessão brutal, na tentativa de lidar com fatores além do alcance doméstico.
Essa flexibilidade, já vista em outros momentos, não se confunde com leniência. Está claro para a sociedade o empenho em trazer a inflação de volta aos níveis desejados, ainda que em prazos maiores.
Ao longo de mais de duas décadas do regime de metas, a disciplina monetária só foi desrespeitada no primeiro governo da petista Dilma Rousseff (2011-2014) —e os resultados foram desastrosos.
Ainda há muito a fazer para que a moeda brasileira tenha estabilidade comparável à observada em países desenvolvidos, a começar pelas contas do governo. Entretanto é indiscutível que os aperfeiçoamentos institucionais promovidos desde o Plano Real fizeram enorme diferença.
Desde 1999, a inflação brasileira só chegou aos dois dígitos em três ocasiões (2002, 2015 e 2021), enquanto na vizinha Argentina, por exemplo, o descontrole está instalado há mais de uma década e a taxa beirou os 100% no ano passado.
O complemento necessário ao regime de metas é a autonomia do BC, hoje formalizada em lei no Brasil. Para uma efetiva política de combate à pobreza, o governo petista deverá superar equívocos do passado e perseverar no arranjo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.